O mundo está a mudar, dizem-nos os cientistas, dizem-nos os sociólogos, diz-nos a nossa experiência diária. A nossa relação com a idade parece, porém, uma das barreiras mais difíceis de desafiar, para alguns mais difícil que a do género, raça ou orientação sexual. Até 2030, a esperança média de vida deverá situar-se nos 90 anos em vários países europeus - Portugal é um deles - mas isso pouco mudou na forma como se olha para as diferentes etapas de vida. Mesmo que haja cada vez mais mulheres a serem mães aos 40, mesmo que aos 50 muitas pessoas decidam iniciar uma nova carreira profissional ou que aos 60 haja mais casais a separarem-se e a iniciarem novas relações. Isto para não falar daqueles que aos 70 e 80 recusam a reforma “para descansar”.
É neste cenário que alguns factos trazem o tema para a primeira linha das notícias. O mais recente foi o anúncio da candidatura de Bernie Sanders à corrida presidencial nos Estados Unidos em 2020. Bernie Sanders, 77 anos, o político que em 2016 reuniu um considerável apoio entre os eleitores mais jovens. Nas 24 horas que se seguiram ao anúncio da sua candidatura, Sanders reuniu 5,9 milhões de dólares em donativos online oriundos de 225 mil pessoas individuais, o que é interpretado como um forte sinal da adesão que pode vir a ter.
No mesmo país, a mulher que lidera a Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, foi re-eleita para o lugar há menos de dois meses. Tem 78 anos, cinco filhos e oito netos. Outra mulher, Maxine Waters tornou-se a primeira afro-americana a liderar a Comissão de Finanças na mesma Câmara. Tem 80 anos. Para provar o seu ponto, num artigo publicado a 8 de janeiro deste ano, o New York Times juntava mais dois nomes: Susan Zirinsky, a primeira mulher a liderar a cadeia de televisão CBS News - tem 66 anos - e Glenn Close, bem mais conhecida do grande público que está nomeada para o Óscar de Melhor Atriz. Tem 71 anos.
Vale a pena recuar um pouco mais de seis anos, a novembro de 2012. Mais concretamente à conferência de imprensa em que Nancy Pelosi anunciou a intenção de se manter líder do Partido Democrata na Câmara dos Representantes. Um repórter na NBC, Luke Russert, perguntou-lhe na ocasião se não seria altura de dar lugar aos mais jovens no partido. Nancy indignou-se e retorquiu: “OH, coloca sempre essa questão, exceto a Mitch McConnell” [líder republicano no senado, atualmente com 77 anos]. O que é outro ponto em discussão: a idade enquanto fator de discriminação também não igual para todos, às mulheres pesa mais que aos homens e não é só na política.
As artes são provavelmente o terreno onde a longevidade é sujeita a menor escrutínio. Talvez por respeito com nomes que já conquistaram o Olimpo, talvez porque a sabedoria associada à idade aí parece ser mais evidente. Veja-se o caso de Clint Eastwood, 88 anos, que realiza e protagoniza o filme “Correio de droga” atualmente nos cinemas. Ganhou um óscar aos 74 anos com Million Dollar Baby (realização) e 12 anos antes, aos 62, tinha ganho o primeiro óscar com Unforgiven.
Ou Saramago que se estreou na escrita já depois dos 50 e obteve o reconhecimento mundial do Nobel já depois dos 70.
Para quem estuda a evolução da população, o tema da longevidade é um dos mais decisivos no século XXI. As estimativas são claras: em 2050, um terço das pessoas na Europa terá mais de 65 anos. Não se trata já, ou apenas, de pensar nos cuidados de saúde, nas reformas e organização dos espaços públicos. Trata-se de repensar a linha da vida como nos habituámos a olhar ao longo do século XX. Esquecendo que há 100 anos a esperança média de vida em Portugal não chegava aos 40.
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