“Com as últimas notícias de ter de ficar num hotel em quarentena, com a complicação e evolução que o vírus está a ter, disse à minha família: Não sei quando é que vou ver-vos novamente”, contou Nuno Vicente à agência Lusa.

A partir de segunda-feira, todas as pessoas que cheguem de Portugal e de outros 32 países de alto risco de infeção com o novo coronavírus serão obrigadas a cumprir a quarentena de 10 dias num quarto de hotel vigiado a um custo de 1.750 libras (2.000 euros).

Além disso, é necessário pagar um teste com resultado negativo feito até 72 horas antes do embarque num voo que, por as ligações diretas entre o Reino Unido e Portugal estarem suspensas, tem de fazer escala num país terceiro, como Espanha, França, Holanda ou Irlanda.

O Governo britânico proibiu as viagens de países africanos e sul-americanos, e de Portugal devido às relações com o Brasil, para evitar a importação de mais casos de variantes com mutações do coronavírus que causa a covid-19.

Só é permitida a entrada de nacionais britânicos e estrangeiros residentes no Reino Unido.

Nuno Vicente, de 37 anos, viajou para Portugal em 12 de dezembro para assistir ao funeral do pai, vítima de uma infeção pulmonar agravada pelo coronavírus, passou o Natal com a mulher e filhos de 5 e 8 anos na Chamusca, distrito de Santarém, mas ficou retido um mês pelas restrições.

“Entretanto rebentou a variante ‘inglesa’, foram cancelando os voos constantemente e tive de gastar as poucas economias para me sustentar e à família. Nas últimas semanas, como vários colegas da equipa foram infetados, tive de marcar outro voo”, explicou.

Atualmente está a cumprir quarentena na própria residência em Bournemouth, onde vive há cerca de oito anos, mas na próxima semana já espera voltar ao trabalho de auxiliar de assistência médica ao domicílio a pessoas incapacitadas, a única fonte de rendimento da família.

O anúncio do Governo britânico, que já se vinha a comentar há várias semanas, apanhou desprevenidos muitos portugueses que aguardavam por um levantamento da interdição de viagem entre os dois países imposta durante a mais recente vaga da pandemia.

Enquanto alguns apressaram o regresso via outras cidades europeias, Catarina Soares não pretende voltar enquanto exigirem que faça quarentena num hotel, cujo custo, enquanto estudante, não consegue pagar.

“Fui apanhada de surpresa. Mas não faz sentido ir para um hotel quando tenho um estúdio em que não estou em contacto com ninguém”, queixou-se a mestranda em psicologia forense na universidade de Coventry, no centro de Inglaterra.

A solução é permanecer em Portugal, para onde viajou para passar o Natal com a família, e continuar a ter aulas pela Internet.

Para o advogado britânico Harry Hewitt, que vive em Tavira com a namorada, mas trabalha exclusivamente em Inglaterra, trabalhar apenas remotamente não é uma opção.

Até agora beneficiava de uma exceção das regras para interromper o isolamento e participar em procedimentos jurídicos, o que lhe permitia viajar entre os dois países com maior facilidade, mas a nova regulamentação é mais rigorosa.

Por isso, Hewitt já se conformou que terá de “fazer quarentena num hotel com vista para uma estrada de acesso a um dos aeroportos de Londres e pagar 1.750 libras pelo privilégio”, mais cerca de 300 libras (345 euros) em testes para poder viajar.

Alguns casos com audiências curtas poderá ser forçado a renunciar por a despesa não justificar o custo da deslocação, mas, enquanto especialista em processos penais, terá mesmo de se deslocar para julgamentos mais longos.

“Faço muito trabalho através da Internet, incluindo de audiências de tribunal em Inglaterra. Fiz centenas nos últimos 10 meses a partir de Portugal. Mas quando são audiências a testemunhas ou de apresentação de provas, os juízes não gostam de ter os advogados à distância. Os julgamentos criminais têm de ser presenciais, não é possível falar com o júri remotamente”, justificou.

Enquanto Hewitt está determinado em continuar com o “ato de equilíbrio” de viver em Portugal e trabalhar em Inglaterra, sujeitando-se às novas regras e despesas, as novas restrições de viagem entre o Reino Unido e Portugal estão a fazer Bruna Vale questionar-se sobre a vida pessoal e profissional.

A posição de gerente adjunta num hotel de cinco estrelas no centro de Londres foi um compromisso entre uma carreira internacional em turismo e uma maior proximidade da família em Portugal.

Nos últimos oito meses visitou a família em Cascais três vezes, cumprindo sempre quarentena no regresso, mas desta vez sente-se encurralada.

“Tenho muito medo que aconteça alguma coisa e eu não tenha o direito de viajar e ver a minha família. Se um familiar falecer ou acontecer alguma emergência que me faça ir a Portugal, não posso porque não tenho dinheiro para pagar a quarentena nos hotéis”, disse a jovem de 24 anos à Lusa.

Perante as perspetivas de passar um confinamento longo sozinha, com rendimento reduzido porque está em ‘lay-off’ e preocupada com o futuro devido ao risco de despedimentos no setor do turismo, pondera regressar definitivamente ao seu país.

“Queria ter uma vida estável aqui e subir na carreira. Mas o impacto de eu ficar até ao final do ano sozinha sem trabalhar na minha saúde mental vai ser grande”, admitiu Bruna Vale, tendo já começado a procurar emprego em Portugal.

O Reino Unido registou até agora 116.287 óbitos entre 4.013.799 de casos de infeção confirmados desde o início da pandemia.

Em Portugal, morreram 15.034 pessoas dos 781.223 casos de infeção confirmados, de acordo com o boletim mais recente da Direção-Geral da Saúde.

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