"Pouco mais se pode dizer. Não são condições humanas”, disse June Marks.

A advogada disse ter sido instruída por João Rendeiro para apresentar uma queixa às Nações Unidas sobre as condições “desumanas” da prisão de Westville, perto da cidade sul-africana de Durban, onde está detido desde 13 de dezembro.

June Marks sublinhou que o ex-presidente do extinto Banco Privado Português (BPP) tem problemas cardíacos e que na última semana consultou um médico da prisão que expressou preocupação com a sua saúde e a prevalência de tuberculose no estabelecimento penitenciário, um dos maiores da África do Sul.

"Ele está com uma infeção respiratória e estamos a tentar conseguir medicação”, disse a advogada, adiantando que Rendeiro teve febre, mas que durante uma conversa telefónica hoje pareceu “um pouco melhor” - algo que o próprio respondeu aos jornalistas, enquanto tossia, quando questionado ao sentar-se no banco dos réus.

Contactados pela Lusa, os serviços prisionais da África do Sul negaram haver problemas de saúde como têm sido relatados, mas sem avançar mais detalhes.

Advogada de Rendeiro escreveu ao PR sul-africano

“Já escrevi uma carta dando conta do processo constitucional. Já a enviei ao ministro da Justiça e ao Presidente [da República]. Lancei as bases para o processo”, disse a advogada sul-africana June Marks, referindo que assim “alertou” ambos.

A contestação baseia-se numa “violação do processo de extradição que não está conforme a lei” sul-africana, alegou.

Marks detalhou que está a preparar uma petição a dirigir ao Tribunal Constitucional com base na secção 172 (1) (a) da Constituição sul-africana, segundo a qual, “ao decidir uma questão constitucional dentro do seu poder, um tribunal deve declarar que qualquer lei ou conduta inconsistente com a Constituição é inválida na medida de sua inconsistência”.

“Disse desde o início que o procedimento que eles [o Estado ou Ministério Público] seguiram não estava correto”, argumentou.

Além de escrever a Cyril Ramaphosa [Presidente da República], a advogada disse que também já contactou o ministro da Justiça e Serviços Correcionais, Ronald Lamola, sobre a questão constitucional.

June Marks adiantou que também que está a preparar outras duas contestações.

Uma já decorria, trata-se de um recurso contra a recusa de liberdade sob caução pelo Tribunal de Verulam, dirigido ao ‘High Court’ (tribunal superior) de Durban.

O ex-banqueiro compareceu hoje em tribunal para uma sessão em que não usou da palavra.

O procurador Naveen Sewparsat apresentou os documentos de extradição numa caixa de papelão recebida de Portugal a 12 de janeiro e entregou-a ao tribunal.

O lacre verde e vermelho do pacote de documentos em português estava partido e só o lacre da tradução em inglês permanecia intacto.

Segundo referiu Sewparsat, vai ser feito um pedido para devolver os documentos a Portugal, por forma a que sejam “verificados e selados novamente e reenviados por via diplomática”.

A advogada de Rendeiro, Kellie Hennessy, disse que a defesa se oporia à medida.

O magistrado Johan Van Rooyen que preside aos trabalhos aceitou os documentos dizendo que seriam mantidos a sete chaves pela National Prosecuting Authority (NPA, ministério público sul-africano) e que na sessão de dia 27 vai ser analisado o pedido.

A porta-voz da NPA, Natasha Ramkisson-Kara, referiu que “se o pedido for deferido, a verificação será solicitada a Portugal e, quando isso for resolvido, a extradição poderá começar”.

Acrescentou ainda que a NPA tem falado de perto com os procuradores portugueses.

No final da sessão, Rendeiro regressou à prisão de Westville, onde continua detido desde 11 de dezembro.

O ex-banqueiro foi condenado em Portugal em três processos distintos relacionados com o colapso do BPP, tendo o tribunal dado como provado que retirou do banco 13,61 milhões de euros. Das três condenações, apenas uma já transitou em julgado e não admite mais recursos, com João Rendeiro a ter de cumprir uma pena de prisão efetiva de cinco anos e oito meses.

João Rendeiro foi ainda condenado a 10 anos de prisão num segundo processo e a mais três anos e seis meses num terceiro processo, sendo que estas duas sentenças ainda não transitaram em julgado.

O colapso do BPP, em 2010, lesou milhares de clientes e causou perdas de centenas de milhões de euros ao Estado.