O livro “Santo António, de Lisboa e Pádua” foi lançado em junho pelo Clube do Autor e, ao longo de 136 páginas, alia o “ensaio literário”, sobre a vida do santo, a fotografias de Marc Gulbenkian, que atravessam os locais referidos.
No prefácio, assinado por Pedro Teotónio Pereira, a obra é descrita como um percurso que permite “percorrer os caminhos do santo na sua época, sentindo a paisagem, o calor e o frio, os cheiros e os sons, transpondo-os para os dias de hoje”, passando pela “eterna disputa entre Lisboa e Pádua”, e ainda Coimbra, Toulouse ou Rimini, cidade onde também “deixou a sua marca”.
Trabalhada entre 2017 e 2018, a ideia do livro insere-se num plano inicial de fazer “perfis sobre alguns santos”, abandonado por falta de disponibilidade, como António Mega Ferreira explicou em entrevista à Lusa.
Preferiu assim partir “à procura dos motivos humanos da enorme devoção que o santo inspira tanto em Portugal como em Itália, onde é chamado ‘Il Santo’”.
A ideia foi desenvolvida com o fotógrafo Marc Gulbenkian, com quem já tinha trabalhado em “Lisboa e Tejo e Tudo”, para ter “mais do que uma biografia seca, só de texto”.
Nesta obra, Mega Ferreira atravessa a vida de Santo António (1195-1231) desde que nasceu até à morte, já depois de passar por Coimbra e seguir para Itália, dentro do culto franciscano em que se inseriu até ao fim da vida, e no qual pregou sempre.
Entre os muitos episódios retratados, a ligação à natureza, própria dos franciscanos, torna-se visível “nos sermões, onde desenvolve uma simbologia muito pessoal, sobretudo sobre os animais, a que dá significados simbólicos, alguns inseridos na tradição da própria Igreja, mas outros completamente inovadores”, o que estabelece “um certo laivo poético” a essa relação.
“É um homem sensível à beleza das formas, e isso é humaníssimo. A sua afetividade, que põe nas relações com as pessoas, estava aliada ao enorme carisma pessoal que tinha, aos dotes oratórios que possuía. É isso que leva a essa espécie de quase adoração”, relatou Mega Ferreira à Lusa.
Em Pádua, esteve pouco tempo, mas a Quaresma de 1231, com 40 dias consecutivos de pregação, “provavelmente custou-lhe a vida". E granjeou-lhe a popularidade que viria a levar à canonização, 11 meses depois da morte.
“Essa ligação direta [ao povo], todos os dias na quaresma, e a única intervenção política que se lhe conhece, quando pediu ao ‘potestad’ de Pádua para que não fossem presos os que têm dívidas, para não se tornarem vítimas do pecado da usura, foram decisivos nessa admiração da população de Pádua” por Santo António, reforçou o autor.
Pelo meio, Mega Ferreira desconstrói os factos dos ‘milagres’ associados à figura do santo, que aliás dizia “que só Cristo” os poderia fazer. Salta à vista que este “é um homem bom”, afirma Mega Ferreira
“Essencialmente é isto. [Fernando de Bulhões] aborreceu-se dos Agostinhos, porque não gostava das ‘tricas’, aderiu aos franciscanos pelo ideal radical de pureza e regresso às origens da religião cristã, pregou a milhares de pessoas, interveio a favor dos pobres com dívidas. E é a imagem que quero dar com o livro”, resumiu.
Nascido em Lisboa, em 1949, António Mega Ferreira trabalhou como jornalista, do Jornal Novo, do Expresso e do antigo semanário O Jornal, à informação da RTP2, e foi chefe de redação do Jornal de Letras, além de ter liderado a candidatura lisboeta à Expo’98 e presidido à Fundação Centro Cultural de Belém. É diretor executivo da Associação Música Educação e Cultura - Metropolitana, que gere a Orquestra Metropolitana de Lisboa.
Na carreira como escritor, supera as três dezenas de obras publicadas, de ensaio a poesia, ficção e crónicas, tendo recebido o Grande Prémios Camilo Castelo Branco em 2001, por “A expressão dos afetos”, um livro de contos.
Marc Gulbenkian nasceu em Paris mas vive há vários anos em Lisboa, trabalhando em cooperação internacional enquanto desenvolveu um trabalho paralelo na fotografia, em que se juntou a Mega Ferreira em “Lisboa e Tejo e Tudo”.
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