“Os senhorios abusam imenso nos preços”, afirmou à Lusa Liliana Sá, de 26 anos, estudante da Universidade de Lisboa, advogando que as condições dos imóveis são “terríveis”: “Já vi um quarto em que a cozinha e a casa de banho eram no mesmo local”.
Deslocada da Madeira, Liliana conseguiu alojamento na residência universitária Egas Moniz, na zona do Saldanha, onde vive há cinco anos, dividindo o quarto com outra rapariga e partilhando a casa com outros 140 jovens, e onde acaba por não pagar nada por ser bolseira.
Prestes a concluir os estudos, a jovem madeirense pretende continuar a viver em Lisboa, mas os preços “altíssimos” para arrendar casa deixam-na assustada.
A viver também na residência pública, Tiago Carvalho, de 21 anos, de Santarém, sente-se um privilegiado – apesar de não ser bolseiro, conseguiu ser ali aceite e paga 140 euros por mês com despesas incluídas.
“Há colegas meus que se não estivessem aqui a morar muito provavelmente não poderiam estar a estudar”, declarou, admitindo que “é complicado” viver numa residência, porque não há tanta privacidade, “mas em termos económicos é um sacrifício que tem que ser feito”.
Atualmente, a Universidade de Lisboa tem 19 residências, com capacidade total de 869 camas, informou à agência Lusa Rita Casquilho, responsável pela área de alojamento universitário, indicando que “a taxa de ocupação é 100%” e existe fila de espera, uma vez que a oferta existente não consegue dar resposta à procura.
De acordo com Rita Casquilho, a grande procura pelas residências públicas deve-se “a carência económica dos agregados familiares, que não têm hipótese de pagar um alojamento em Lisboa”.
“Ao aluno que se candidatou a alojamento [nas residências públicas], se é bolseiro e não lhe foi solucionado o problema, desde o momento em que entregue o recibo a provar que está a pagar o alojamento, o Estado dá 125 euros na bolsa para ajuda do pagamento do alojamento em Lisboa”, explicou a responsável, frisando que estas regras se aplicam a nível nacional.
No circuito das residências privadas, a Uniplaces posiciona-se como “a única plataforma dedicada ao alojamento universitário” em Portugal, com “cerca de seis mil” imóveis em Lisboa e no Porto, declarou João Ribeiro, responsável de marketing da plataforma.
“Face ao último trimestre do último ano, houve um crescimento de 70% na procura e mais ou menos 33% na oferta” de arrendamento a estudantes, revelou.
O aumento da procura face à oferta acaba por se refletir na dinâmica de preços.
Atualmente, o preço médio por quarto em Lisboa é 355 euros, após ter registado um aumento de 10%, disse o responsável de marketing da Uniplaces.
Na zona do Intendente, os proprietários de um prédio de cinco andares, que estava há alguns abandonado, decidiram reabilitar o imóvel e destiná-lo totalmente ao arrendamento a estudantes, disponibilizando, desde setembro de 2016, 41 quartos, com capacidade para 84 pessoas.
“Cada vez está a ser mais difícil arranjar um quarto por menos de 300 euros"
Segundo o diretor operacional desta residência privada no Intendente, Lourenço Botton, existem quartos ‘standards’ a 500 euros, suites até 625 euros, apartamentos T1 até 750 euros e T2 até 1.050 euros, dirigindo-se a “um ‘target’ mais alto”.
“A ocupação é garantida pela Uniplaces a 100%”, afirmou Lourenço Botton, reconhecendo que a maioria da procura é de estudantes estrangeiros, porque o preço pedido “está um bocadinho acima da média” que os estudantes portugueses conseguem pagar.
Vindos de Faro, Gonçalo Aniceto, de 27 anos, e Ana Delgado, de 22 anos, são namorados e ambos estudantes em Lisboa. Neste momento, são os únicos portugueses a viver na residência privada do Intendente, onde partilham um dos apartamentos T1 e pagam 685 euros com despesas incluídas, o que corresponde a um encargo individual de cerca de 350 euros.
“O preço é acessível”, afirmou Gonçalo Aniceto, acrescentando que o preço para um apartamento com as mesmas condições e com a mesma qualidade fora de uma residência para estudantes “é mais 100 ou 150 euros” do valor que pagam atualmente.
O casal vai ter de sair em breve da residência privada por não ter renovado o contrato atempadamente e já anda à procura de uma nova casa, tarefa que não tem sido fácil.
“Cada vez está a ser mais difícil arranjar um quarto por menos de 300 euros, o que é absurdo”, expôs Ana Delgado.
Quanto custa arrendar
As cidades mais procuradas pelos estudantes, além das tradicionais Lisboa e Porto, são Aveiro, Vila Real, Coimbra, Almada, Setúbal, Braga, Faro, Covilhã e Évora.
No Porto, a freguesia mais procurada é Paranhos, onde se localiza o Polo Universitário do Porto, já que os estudantes procuram locais para poderem ir a pé ou com transportes diretos para as aulas, precisou fonte oficial da ERA. Pela Century 21, acrescentam-se as zonas de Hospital São João, Rua do Campo Alegre e Baixa.
O preço médio na cidade é de 225 euros nos quartos, enquanto os apartamentos variam entre os 500 (T1) e 700 euros (T2), de acordo com a mesma fonte.
Em Lisboa, a procura centra-se em casas, principalmente junto da rede do metro, com as imobiliárias a acrescentarem que os quartos na capital rondam os 250 a 350 euros.Em apartamentos, o T2, que é "a tipologia mais procurada", tem um preço médio de 850 euros, segundo a ERA, enquanto a REMAX precisou que os preços dos apartamentos disponíveis para arrendar "são acima dos 700 euros".
Ricardo Sousa, administrador da Century 21 Portugal, afirma que, a "nível nacional, os preços médios de arrendamento de quartos vão até aos 200 euros, enquanto os preços médios de arrendamento de apartamentos se situam nos 600 euros". Os valores crescem em Lisboa e no Porto face ao "enorme desequilíbrio que se verifica entre a procura e a oferta existente no mercado".
Pela Uniplaces, plataforma digital de arrendamento de casas para estudantes, João Ribeiro indicou um "aumento de 65% na procura em Lisboa face ao 1.º trimestre de 2016 e 94% na cidade do Porto". Citando dados dos primeiros três meses do ano, o responsável referiu que um quarto em Lisboa custa em média 355 euros e no Porto 268 euros. Já os valores em termos de apartamentos são 752,94 na capital e 598,93 no Porto.
Referindo que a proximidade dos campus universitários "tem uma forte preponderância na procura", enumerou as cinco zonas que são mais procuradas em Lisboa (Arroios, Alameda, Saldanha, Entrecampos, Picoas) e no Porto (Paranhos, Cedofeita, Bonfim, Santo Ildefonso, Ramalde).
A plataforma imobiliária Idealista apenas disponibilizou a pesquisa geral de quartos, que representam cerca de 20% da sua oferta de arrendamento, e que são sobretudo procurados e oferecidos em Lisboa, Porto e Coimbra, "uma cidade tradicionalmente estudantil".
Citando um estudo de 2016, o preço médio em Portugal era 220 euros mensais, com Lisboa a liderar os valores (257 euros mensais), seguindo-se Porto (209 euros por mês) e Coimbra (173 euros).
Sobre o mercado paralelo, o responsável da Century 21, Ricardo Sousa notou ainda um "peso bastante significativo", por a "maioria dos arrendamentos universitários ser efetuada informalmente".
Mais do que a legislação ou incentivos fiscais, "é necessária a entrada no mercado de operadores privados de grande dimensão, que possam constituir grandes carteiras de imóveis para arrendamento" que permitam valores de rendas "mais baixas", disse a mesma fonte à Lusa.
A consultora JLL publicou recentemente um relatório sobre as residências de estudantes, no qual se lê que "Portugal está também cada vez mais no radar dos investidores" e que há "atualmente entre 4 a 5 mil milhões de euros de capitais disponíveis em busca de 'stock' de residências de estudantes na Europa".
De acordo com Maria Empis, diretora de consultoria e 'research' da JLL, "Portugal não é exceção a esta dinâmica europeia que tem transformado um nicho até há pouco negligenciado num mercado vibrante e profissionalizado".
Nestas residências, os valores variam entre os 350 e os 600 euros mensais por quarto. Em Lisboa há capacidade superior a 300 estudantes distribuídos por seis residências, devendo surgir vários projetos nos próximos dois anos e as zonas preferidas são Saldanha, Almirante Reis e o Bairro Alto.
No Porto, há apenas uma residência com capacidade para 195 alunos, com as zonas da Baixa e de Paranhos a serem as mais pretendidas.
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