“Há muita preocupação na nossa comunidade. Uns estão tristes, outros estão desanimados, mas a comunidade ainda está a lutar, com esperança, embora pouca, de que o sol ainda vai voltar a brilhar”, descreveu hoje à Lusa, por telefone, a conselheira da comunidade portuguesa em Caracas Maria de Lurdes Almeida.
Mas, por agora, “o panorama é muito escuro”.
No mesmo sentido, Maria de Fátima Loreto, conselheira da comunidade em Valência, disse que “há uma grande deceção e tristeza, porque isto não tem fim”.
“Não há garantias de nada, de propriedade, de economia, de vida. O que se está a passar é uma guerra”, afirmou a lusodescendente, cujos pais, madeirenses, emigraram para a Venezuela na década de 50 do século passado.
Também o conselheiro em Caracas Fernando Campos comentou que “as pessoas que não estavam preparadas, estão desanimadas”, mas, lamentou, “já se sabia que isto se ia passar”.
Os conselheiros portugueses contestam a adesão à votação anunciada pelo Conselho Nacional Eleitoral, que estimou uma participação de mais de oito milhões de eleitores. A oposição afirmou, a escassas horas do fecho previsto das urnas, que a participação era de 12%.
“É totalmente falso. Houve muito pouca participação”, defendeu ‘Milu’ (como é conhecida) Almeida, que vive há 52 anos na capital venezuelana.
“Foi a mesma fraude de sempre deste Governo tão dececionante”, sustentou Fátima Loreto, que sempre trabalhou na área do associativismo junto dos portugueses e luso-venezuelanos, relatando que os centros eleitorais de Valência e Mérida estiveram vazios, no domingo.
Sobre o ambiente que se vive hoje nas ruas venezuelanas, os conselheiros descreveram um cenário de confusão, poucas horas antes de novas manifestações convocadas pela oposição.
Em Valência, há ruas barricadas, árvores cortadas a impedir a passagem e o comércio está fechado, disse Fátima Loreto, que contou que há quatro dias que não sai de casa, por recear a violência.
Na capital, algumas lojas estão abertas, outras fechadas, e a escassez de produtos de primeira necessidade é generalizada.
Fernando Campos, que trabalha numa empresa de distribuição, descreveu que “praticamente não há frutas e legumes hoje”.
Fátima Loreto relatou que, nos últimos dias, têm surgido críticas de portugueses na Venezuela que consideram que o Governo português deveria ter “uma atitude mais firme e pronunciar-se contra a Constituinte de Maduro”.
“Eu tenho dito para terem calma, porque o nosso Governo está connosco”, sublinhou.
Num comunicado divulgado hoje de manhã pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, o executivo português “lamenta profundamente a evolução dos acontecimentos na Venezuela”.
O Governo reitera que “a gravidade da crise económica e social que atinge o povo venezuelano só poderá ser debelada mediante um compromisso político inclusivo que envolva o regresso à normalidade constitucional e no quadro de um calendário eleitoral mutuamente acordado entre as partes, bem como no pleno respeito pelos direitos humanos, pela separação de poderes, pelo livre exercício dos direitos civis e políticos e, em geral, pelos princípios do estado de direito”.
Pelo menos dez pessoas morreram, na sequência de confrontos, durante a jornada eleitoral, indicou o Ministério Público venezuelano.
A convocatória para a eleição foi feita a 1 de maio pelo Presidente, Nicolás Maduro, com o principal objetivo de alterar a Constituição em vigor, nomeadamente os aspetos relacionados com as garantias de defesa e segurança da nação, entre outros pontos.
A oposição venezuelana acusa Nicolás Maduro de pretender usar a reforma para instaurar no país um regime cubano e perseguir, deter e calar as vozes dissidentes.
Mais de cem pessoas foram mortas nos protestos antigovernamentais que têm agitado a Venezuela desde o passado dia 1 de abril.
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