A perceção despertou por um acaso. A causa nasce após tomar conhecimento dos resultados de um teste sanguíneo. Esta são as raízes da história de Emilly Penn e da sua luta contra o oceano de plástico que navega no planeta terra.
Em 2008, Emilly Penn, jovem arquiteta inglesa formada em Cambridge, a residir em Inglaterra, recebeu uma proposta de emprego na Austrália. O avião não entrou nas cogitações do plano de viagem das ilhas Britânicas para o gigante país do Hemisfério Sul e acabaria por se deslocar da forma mais consentânea com as suas crenças.
Integrada numa expedição marítima, a bordo do earthrace, velejou até embater com algo que mudaria o rumo da sua vida. “A meio do Pacífico parámos o barco para tomar um banho, mergulhámos e quando chegàmos à superfície, vimos isqueiros, garrafas, objetos de plástico ... a 800 milhas de terra”, recordou, em tom surpreso.
“Na verdade, as pessoas mais próximas estavam na Estação Espacial Internacional em cima de nossas cabeças, era tão distante e não podia acreditar, não fazia sentido ver todo aquele plástico”, assinalou Emilly Penn, em conversa telefónica com o SAPO24, numa introdução que tem repetido nas diversas intervenções que acumula.
Seguiu caminho, mas o plástico não sairia mais da sua mente. “Parámos em pequenas ilhas, encontrei a mesma coisa em todos os lugares que fomos e isso foi o suficiente para pensar que tinha de fazer algo”, realçou a velejadora.
De pausa na carreira a uma carreira em si mesmo
“Em 2008, ninguém falava sobre isso, não existia, o problema não estava no mapa. Comecei a trabalhar nisto a pensar que seria apenas uma pausa na carreira, mas acabaria por se transformar na minha carreira”, assumiu.
Começou por organizar hercúleas ações de voluntariado de limpeza da costa na ilha de Tonga e, ato contínuo, haveria de saltar para dentro de expedições que navegavam a bandeira da causa ambiental.
Os microplásticos e a presença destas microscópicas partículas na cadeia de alimentos toldavam-lhe os pensamentos e as ações nos primeiros anos do resto da sua vida.
“Fiz um teste sanguíneos e vi os químicos que tinha no meu corpo. Da lista dos 35 químicos considerados tóxicos para humanos, tinha 29 deles no meu sangue. Ora, como mulher, sei que posso ser responsável pela transmissão desses químicos, através do leite materno, aos nossos bebés”, constatou, sendo que estava grávida na altura.
Em 2014, Emily Penn decidiu criar a eXXpedition, Organização Não-Governamental (ONG) cuja missão assenta em expedições marítimas e recolha de informação científica para alertar e ajudar a sociedade a combater as marés de plástico e a poluição tóxica.
As mulheres como parte da solução no combate às marés de plástico
Nas viagens da eXXpedition só entraram e só entram mulheres. É pura tração feminina. “Pensei que é um problema centrado nas mulheres e que está a impactar a próxima geração, então, vamos resolver com um “molho” mulheres. Foi há 10 anos e nunca olhámos para trás”, assegurou a co-fundadora da ONG.
“Em cada uma das nossas viagens temos 10 convidadas (mais três velejadoras e Emilly). São cientistas, jornalistas, realizadoras, professoras, desenhadoras, engenheiras, não são velejadoras”, destacou a skipper que recebeu em 2021 a Medalha do Império Britânico, da mão da Rainha de Inglaterra.
Explica o porquê da tripulação de um só género. “É quem pode ser parte da solução para resolver o problema da poluição de plástico. É por isso que levamos a bordo todos os tipos de pessoas e vários tipos de mulheres, para que se envolvam e impactem toda a sociedade”, reforçou.
A partir de uma das expedições, com a duração de 3 mil milhas percorridas e um mês a navegar no tempestuoso e difícil Pacífico Norte, entre barreiras acumuladas de plástico, a grande ilha de lixo do Pacífico nasceu um documentário, X Trillion, a exibir este sábado no Discovery Channel.
Identificado o problema, avançou. “Uma das coisas que as nossas pesquisas nos mostram é que não há uma só solução para resolver o problema. Precisamos de muitas soluções vindas de diferentes setores da sociedade”, reiterou.
“É tudo sobre prevenção”
Emily Penn fez voltas ao mundo, mais de 80 mil milhas, andou dos Trópicos ao Ártico e capitaneou rotas que ajudam a ciência a encontrar soluções para tentar combater o flagelo e mudar vidas. “Agora, à medida que os anos passaram, passo menos tempo no mar” e o contributo passa por “conferências e eventos”, contou.
Admite que “as soluções começam no mar”, mas parar o problema poderá obrigar a virar a agulha para “a fonte”, avisa.
“É quase impossível recolher todos os microplásticos”, reiterou. “Ao invés de nos focarmos em ações de limpeza no mar, o que é obviamente difícil, se não quase impossível, o oceano é vastíssimo, e, num dia, as correntes levam tudo de um lado para outro”, aponta outra receita. “É tudo sobre prevenção. É para cada um de nós pensar no uso do plástico que usamos nas nossas vidas”, realçou.
Continua a linha de pensamento. “Há um grande papel das organizações, para mudarem do que produzem e também dos governos para legislar e incentivar outros negócios e a inovação”, salientou. “Precisamos de trabalhar com governos, precisamos de organizações, empresas, precisamos de indivíduos”, registou.
“É tão crucial para um planeta saudável, mas também para a nossa saúde. Simplesmente não podemos sobreviver sem um oceano saudável”, argumentou Emily Penn. “Tudo o que faço é realmente sobre proteger o oceano, que é tão crucial para o planeta que nós vivemos, sendo 70% água”, finalizou a defensora dos oceanos.
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