Dizem que ter sido jogador não realizado foi o que o tornou um treinador brilhante. Duas vezes internacional por Inglaterra, Brian Clough passou a sua carreira de jogador no segundo escalão ao serviço do Middlesbrough e do Sunderland. Com um notável registo de 267 golos em quase 300 jogos “arrumou as botas” prematuramente aos 27 anos devido a lesão. Estávamos nos anos 60 e Clough precisava de rendimentos para conseguir alimentar a sua família, pelo que a única opção foi seguir a carreira de treinador.
“Bons treinadores constroem boas equipas, uma equipa não constrói um treinador.” Brian Clough
Brian Clough iniciou-se como técnico no modesto Hartlepool United na quarta divisão inglesa (Fourth Division). Conseguiu um oitavo lugar num clube que era habitual último classificado e onde a situação financeira era no mínimo débil - Clough chegou a conduzir o autocarro do clube para levar a equipa aos jogos e a percorrer os bares locais de forma a angariar dinheiro. Em 1967 deixa o Hartlepool United para treinar o Derby County.
Sobre a relação com os jogadores, uma das suas frases ficou para a história: “É fácil, nós falamos durante vinte minutos e chegamos à conclusão que eu estou certo.” Assim era Clough. Exigente, disciplinador, verdadeiro, amante de futebol simples e bem jogado. Soberano nas suas opiniões e decisões sobre a equipa, características essas que se começaram a evidenciar desde cedo como treinador. Foge às “regras instituídas” na maneira como se comunicava até então e ao fim de dois anos sagra-se campeão da Second Division (segunda divisão inglesa na época) pelo Derby.
Mas esta era apenas um marco intermédio nas suas ambições, pois dois anos volvidos Clough estava no topo do futebol inglês ao sagrar-se campeão da First Division (atual Premier League) pelo mesmo clube, na época de 1971-72. Um feito histórico nos, até então, 88 anos de vida do Derby County. Se o seu ego já não era pequeno, agora estava ainda maior e Clough teria de passar a conjugá-lo com o mediatismo conquistado. Sendo presença assídua em programas de televisão e sem medo de dizer o que pensa, o treinador inglês coloca-se por diversas vezes em conflitos que não são bem vistos pelos responsáveis do Derby e, ao fim de 6 anos de glória, a parceria entre ambos os lados termina de forma pouco amigável. Nem mesmo um pedido formal da massa associativa para que a direção reconsiderasse a decisão volta a juntar Clough e o Derby County.
“Se um presidente demite um treinador que ele próprio contratou, devia seguir o mesmo caminho.” Brian Clough
Um reinado de 44 dias em Leeds
Imagine Sir. Alex Ferguson, histórico treinador do Manchester United com um vasto historial de desaguisados com Arsène Wenger e o Arsenal decidir aceitar o convite para treinar... os Gunners, precisamente! Agora multiplique por dois o seu espanto e talvez consiga sentir o mesmo que os adeptos ingleses sentiram quando Brian Clough aceitou o convite para treinar o Leeds United. A relação entre o treinador inglês e o clube tinha sido, até então, pautada pelo desprezo – ao ponto de dizer que estes não eram merecedores do título que tinham conquistado nessa mesma época –, pelo que esta nomeação foi recebida com enorme espanto.
E o facto é que as coisas não correram bem. Foram 44 os dias que Clough passou ao comando do Leeds, acabando por ser despedido em virtude dos maus resultados (a que não são imunes os conflitos que teve com as principais estrelas da equipa). Durante muitos anos, o reinado de Brian Clough à frente do Leeds foi o pior de qualquer treinador da história do clube.
“Roma não foi construída num só dia, mas é preciso lembrar que não era eu o responsável pela obra.” Brian Clough
Quatro meses passados, Clough abraça o projeto daquele que seria “o” clube da sua carreira. A sua chegada ao Nottingham Forest criou expectativas na massa associativa e a influência de Clough dentro de um clube nunca tinha sido tão grande. O próprio treinador estava diferente, depois do modo como saiu do Derby County e do Leeds United. Mais experiente, resguardado e consciente das repercussões das suas palavras e ações, Clough levou o Forest ao topo do futebol inglês e europeu, promovendo-o da segunda divisão inglesa (Second Division) a campeão inglês e bi-campeão europeu, rivalizando com o poderoso Liverpool dos anos 70 (história já contada aqui).
Mas o sucesso veio com um preço. A exigência do futebol nos últimos anos no ativo levou-o a debater-se com um problema de alcoolismo que, em última instância, acabou por destruir-lhe a carreira e, eventualmente, a vida. Ninguém tem dúvidas que Clough era um génio, portador de um sentido de humor acutilante e que lamentará nunca ter sido selecionador inglês (apesar do seu nome ter sido equacionado para o cargo).
Ainda assim, a postura e maneira de estar no futebol que talvez o tenham impedido de ser nomeado selecionador da sua pátria de origem, foram os mesmos motivos que o tornaram no grande treinador que foi. Muitos se inspiraram (e inspiram) em Brian Clough (as semelhanças com José Mourinho na forma de comunicar são evidentes) e, com o seu desaparecimento em 2004, desapareceu também um pedaço do futebol que hoje conhecemos. Carisma à parte, Clough era um visionário que, em conjunto com Peter Taylor (seu fiel adjunto), revolucionou a forma de jogar futebol em Inglaterra, tendo atingido aquilo que hoje em dia ainda é visto como impossível de repetir.
Pedro Carreira é um jovem treinador de futebol que escolheu a terra de sua majestade, Sir. Bobby Robson, para desenvolver as suas qualidades como treinador. Tendo passado por clubes como o MK Dons e o Luton Town, encontra-se neste momento a trabalhar para a Federação Inglesa de Futebol (The FA). Pode acompanhar as suas crónicas, todas as sextas, aqui no SAPO24.
Comentários