Mais do que dois treinadores, Mourinho e Wenger representam duas filosofias. Já aqui abordámos o que representa o treinador francês e o orgulho que tem na sua forma de jogar. Pois bem, Mourinho é o oposto. Se Wenger chega a comprometer resultados para poder formar jogadores que, a longo prazo, tragam retorno à equipa (desportivo ou financeiro), Mourinho não hesita em procurar soluções fora do clube para acelerar processos e resultados, com o propósito de cumprir objetivos no menor espaço de tempo possível.
Se o francês é muitas vezes cavalheiresco na sua abordagem ao jogo, revelando preocupação com as questões relacionadas com o 'fair play', o português é mais pragmático, usando muitas vezes o jogo de palavras e o politicamente incorreto como estratégia para o sucesso. Independentemente de qual abordagem se goste mais, ambos demonstram enorme ambição e coragem, ainda que à sua maneira.
Primeira pedra
Nesta rivalidade, que já vem desde 2004, é difícil perceber quem 'abriu fogo' pela primeira vez, mas o que é certo é que Wenger se adiantou com algumas acusações. Quando 'acusado' pelos media por ter utilizado o primeiro onze na história da Premier League sem ingleses, Wenger virou de imediato a mira para Stamford Bridge, onde Mourinho tinha acabado de chegar, e acusou os rivais de só terem John Terry como jogador formado no clube. A essas acusações seguiram-se outras, como por exemplo o ‘perigo’ de encorajar equipas que se recusam a arriscar - criticando o pragmatismo de Mourinho nalguns encontros. Como seria de prever, a resposta não se fez esperar. Mourinho optou pela tática de provocar Wenger, dizendo que ele não era mais que um ‘voyeur’ que passava o tempo de binóculos a espreitar para dentro da casa dos outros, e que o próprio Mourinho já tinha um dossier de cento e vinte páginas só com declarações de Wenger sobre o Chelsea.
Para a frente e para trás, raras foram as épocas em que ambos se ignoraram. E são várias as picardias entre os dois. Wenger já chamou Mourinho de estúpido; Mourinho já chamou a atenção das pessoas para o fato de Wenger ter apenas 50% de vitórias na Premier League. Recentemente, após o regresso de Mourinho a Inglaterra, mais acusações de Wenger, agora sobre o ‘timing’ da venda de Juan Mata ao Manchester United - o Chelsea já tinha jogado os dois jogos para o campeonato contra o United e dessa forma o espanhol já não iria jogar contra a antiga equipa nessa mesma época. A tal insinuação, Mourinho resolveu 'chutar para canto' dizendo: “Wenger, a queixar-se? É normal…”. A resposta foi então dada no relvado, com o Chelsea a vergar o Arsenal com uma goleada por seis bolas a zero, no milésimo jogo do francês ao serviço dos Gunners.
Mais recentemente, o 'trash talking' de Mourinho levou a que o francês fosse além daquilo que queria. Quando questionado sobre o porquê de alguns clubes (Chelsea incluído) refutarem tão facilmente as suas candidaturas ao título, Wenger respondeu que seria “medo de falhar”. Como sempre, José Mourinho não evitou uma boa guerra de palavras e lançou-se de imediato ao treinador do Arsenal dizendo: “Eu tenho medo de falhar? Ele é um especialista em falhanços, não eu. Se assumirmos que ele está correto e eu tenho medo de falhar, é porque eu não falho muitas vezes. Então, assim talvez ele esteja correto. Eu não estou habituado a falhar. A realidade é que ele é um especialista em falhanços porque oito anos sem um troféu, isso sim, é falhar.”
Além das trocas de palavras há a registar dois episódios interessantes, ambos cara a cara. Um é conhecido como o 'empurrão', onde Wenger perde a cabeça e empurra Mourinho a meio de um jogo; o outro fico conhecido como o 'aperto de mão', onde após uma vitória do Arsenal frente ao Chelsea na Supertaça Inglesa, Mourinho fica para cumprimentar todos os jogadores do Arsenal, até chegar a vez de Wenger. Se há algo a retirar desde episódio, é que o Special One consegue o que quer do francês. Retira-o da sua zona de conforto, fá-lo perder a cabeça e fá-lo perder discernimento. Obrigar outros treinadores a jogar o seu jogo é um dos pontos fortes de José Mourinho e durante muitos anos tem sido consistentemente eficaz, principalmente no que toca a esta ‘guerra’ particular contra os Gunners e Wenger.
Vantagem para o português no confronto direto
Se analisarmos as estatísticas dos jogos que colocaram frente-a-frente o português e o francês, as conclusões são esclarecedoras. Das quinze partidas entre ambos, Mourinho venceu oito, Wenger uma, e as restantes seis partidas acabaram empatadas. Outra curiosidade é que a única vitória do francês sobre o português foi exatamente na Supertaça acima referida. De facto, em jogos a contar para a Premier League, Wenger está ainda para conhecer o sabor da vitória frente ao agora treinador do Manchester United.
Seja com treinadores ou jogadores, o impacto da personalidade no desporto, e neste caso, no futebol, é um fenómeno incontornável. As diferenças de personalidade em rivalidades como as de Pelé e Maradona ou Ronaldo e Messi são inúmeras vezes exploradas e um espetáculo dentro do próprio espetáculo. No caso de Mourinho e Wenger, ambos os treinadores têm um papel fundamental na liga e as suas diferenças trazem um brilho especial ao jogo. Mais uma vez teremos a oportunidade de assistir a um capítulo desta saga que dura há mais de dez anos - interrompida apenas pelos anos passados por Mourinho em Itália e Espanha. No sábado, dia 19, às 12h30 em Old Trafford.
Pedro Carreira é um jovem treinador de futebol que escolheu a terra de sua majestade, Sir. Bobby Robson, para desenvolver as suas qualidades como treinador. Tendo feito toda a sua formação em Inglaterra e tendo passado por clubes como o MK Dons e o Luton Town, o seu sonho é um dia poder vir a treinar na melhor liga do mundo, a Premier League. Até lá, pode sempre acompanhar as suas crónicas, todas as sextas, aqui, no SAPO24.
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