Para Pedro Martins e Abel Ferreira, um jogo grande entre os dois não é novidade, ou não tivessem eles sido os treinadores protagonistas de um dos maiores dérbis do norte de Portugal na temporada 2017/18, quando defendiam as cores de Vitória de Guimarães e SC Braga, respetivamente.
Olhando para trás, podemos olhar para o dérbi minhoto como uma espécie de aquecimento para o grande jogo que os volta a colocar frente a frente este domingo, primeiro dia de dezembro de 2019, na Grécia. Agora, é Pedro quem veste de vermelho, as cores do Olympiacos, e a Abel de negro, com o PAOK.
De um dérbi quente em Portugal, os dois treinadores, juntamente com Vieirinha (PAOK), José Sá, Rúben Semedo e Daniel Podence (Olympiacos), vão dar um sotaque português a um dos clássicos mais intensos da Europa, com um ambiente aceso, ao bom estilo grego, e ao qual se soma um fator decisivo: quem vencer fica no topo da tabela do campeonato (atualmente ambas as equipas somam 27 pontos no primeiro lugar da classificação).
Isto é tudo o que precisa de saber para desfrutar do jogo grande:
Giorgos Koudas. Ou como tudo isto começou
A rivalidade entre Olympiacos e PAOK tem dois grandes alicerces. Primeiro, o facto de o Olympiacos ser de Atenas, a capital da Grécia, e o PAOK servde Salónica. A primeira é do sul e a segunda do norte. E um pouco como acontece em rivalidades como aquela entre SL Benfica e FC Porto, está em causa a geografia do país. Neste caso grego, uma zona, Salónica, historicamente mais pobre do que o sul, e que sempre considerou que as gentes de Atenas foram beneficiadas em relação ao restante país.
A história que proporcionava jogos duros, daqueles que nenhum adepto quer perder, estava lá, mas ganhou uma dimensão muito maior no verão de 1966, quando o Olympiacos tentou contratar Giorgos Koudas, uma lenda viva do PAOK, e que na altura começava a despontar ao ponto de merecer a alcunha de "Alexandre, o Grande".
O problema aconteceu nas negociações, uma vez que o clube de Atenas abordou diretamente Koudas sem falar com a direção do PAOK. Quando Giorgos Pantelakis (presidente do emblema de Salónica) ficou a par da situação, impediu a transferência, nunca permitindo que a ida do jovem Giorgos para a capital grega acontecesse, pelo menos oficialmente. O caso descambou e, sem o Olympiacos poder inscrever o médio na equipa, Koudas passou dois anos a apenas participar em jogos amigáveis dos Thrylos (nome pelo qual o clube de Atenas também é conhecido).
No verão de 68 o caso terminou, com Koudas a regressar ao PAOK, onde guiou a equipa nos anos 70 a várias conquistas, do primeiro campeonato a tuas taças da Grécia, mas não sem deixar para trás uma rivalidade insana.
Um árbitro espanhol, para percebermos do que estamos a falar
A rivalidade é tão grande e a atmosfera em volta do jogo é tão quente que ninguém confia em ninguém. Para tentar aliviar esse fardo, a Federação Grega de Futebol escolheu um árbitro espanhol para apitar o jogo.
É José María Sánchez Martínez, que em novembro apitou um Real Madrid-Real Bétis e um Osasuna-Athletic Bilbao, quem vai apitar o encontro.
O dérbi do Minho e a pressão europeia: Abel sai na frente
Um artigo destes tem de recorrer sempre a estatísticas. Vamos a isso? Bem, Pedro Martins, como treinador do Vitória SC, e Abel Ferreira, como técnico do SC Braga, defrontaram-se apenas por duas vezes na carreira, ambas em jogos a contar para o campeonato nacional na temporada 2017/18.
Nas duas, o treinador bracarense levou sempre a melhor, vencendo os Conquistadores primeiro na Pedreira (2-1) e depois no estádio D. Afonso Henriques, onde goleou o principal rival por 0-5.
No entanto isso poderá não querer dizer nada, uma vez que cada um está à frente de plantéis bastante diferentes e em contextos ainda mais distintos. Se, por um lado, Abel Ferreira está pressionado a vencer o jogo para saltar para o topo da tabela e ganhar fôlego na luta pelo bicampeonato - principalmente depois de ter falhado o acesso à fase de grupos da Liga dos Campeões, num embate renhido com o Ajax, e depois à fase de grupos da Liga Europa numa pré-eliminatória menos feliz com o Slovan Brastilava -, Pedro Martins tem em si a pressão de voltar a ser campeão grego, uma vez que o ano passado, no seu ano de estreia na Grécia, não conseguiu recuperar o título, perdido em 2017/18 para o AEK Atenas e que, na altura, roubou ao Olympiacos a possibilidade de se tornar octacampeão.
Sem a pressão europeia, Abel e o PAOK têm vindo a fazer um grande campeonato. Invicto, parte para este clássico com oito vitórias e três empates.
Já Pedro Martins, também invicto na liga grega somando exatamente o mesmo números de vitórias e empates que o clube de Salónica, tem ainda a pressão de se manter na Europa do futebol. Tendo calhado num grupo complicado na Liga dos Campeões, com Tottenham e Bayern Munich como adversários, o Olympiacos perdeu fora no terreno do Estrela Vermelha (no passado dia 1 de outubro), colocando aquele que seria, na teoria o cenário mais óbvio, o da ida para a Liga Europa, em risco.
Neste momento, os gregos são os últimos do grupo, somando apenas um ponto, num empate caseiro a duas bolas frente aos Spurs, e sabendo que precisam de vencer o último encontro em casa, precisamente frente ao Estrela Vermelha, para continuar na Europa.
No plano geral, o Olympiacos está na frente. No particular, ganha o PAOK
Vamos continuar a alimentar esta rivalidade com estatística? Olympiacos e PAOK já se defrontaram em 53 ocasiões. Os atenienses venceram 28 vezes, a turma de Salónica ganhou 16 dos jogos e há ainda nove empates para serem contabilizados.
Este era o plano geral, pouco abonatório a Abel. No entanto, Pedro Martins, depois de uma época já cumprida em Atenas, tornou-se no primeiro primeiro treinador português da década a representar o Olympiacos e a não ser campeão. É que o clube grego já foi treinado por Leonardo Jardim em 2012/13, por Vítor Pereira em 2014/15, por Marco Silva em 2015/16 e por Paulo Bento em 2016/17, e todos eles foram campeões (ainda que nem todos tenham terminado a temporada).
A juntar a isso Pedro Martins, na temporada passada, nunca venceu o PAOK. Foi derrotado por 3-1 em Salónica e por 0-1 em casa.
Mas o bonito dos jogos grandes é fazer com que nada disto interesse, ou não fosse a bola redonda e onze jogadores de cada lado - e milhares de vozes incansáveis nas bancadas, num ambiente infernal e apaixonante.
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