Este verão, João Félix tornou-se na quarta transferência mais cara de todos os tempos quando se mudou do SL Benfica para o Atlético de Madrid por 126 milhões de euros. O avançado foi o mais recente jogador de uma longa lista de estrelas que inclui nomes como Bernardo Silva, Renato Sanches, João Cancelo ou Nelson Semedo a deixar a academia do clube português para alguns dos melhores clubes da Europa.
"Estamos perto de ser uma das melhores academias do mundo", afirma Pedro Marques, diretor técnico do futebol de formação do Benfica. A pergunta impõe-se: como é que se chega até aqui?
Para o dirigente encarnado, tudo se baseia num "processo a longo prazo" que começa com a escolha de olheiros e de jovens talentos de tenra idade.
Para Pedro Marques o desafio é agora conciliar a formação de jogadores que possam gerar grandes receitas, "um pilar fundamental para o clube assegurar a sua sustentabilidade no futuro", e a competitividade. "Ambas as coisas podem andar de mãos dadas e, num clube como este, o nosso desafio é realmente tomar ambas as coisas de mãos dadas".
É justo dizer que o Benfica atualmente tem uma das melhores academias do mundo?
Penso que estamos perto de ser uma das melhores academias do mundo, não só em termos de instalações, qualidade das pessoas e investimento que tem sido feito nos últimos 10/12 anos, mas também no que diz respeito à produção de talentos. Se olharmos para as grandes ligas e para a primeira equipa do Benfica, vemos que se trata de uma academia que pode produzir jogadores de topo para a elite mundial.
O que tem levado esta academia a ter tanto sucesso desde que foi inaugurada há 13 anos?
Este é um projeto a longo prazo que tem de viver de uma forte paixão e ambição do clube para cumprir a sua missão: produzir jogadores de qualidade, capazes de integrar não só a primeira equipa, mas também de jogar ao mais alto nível na Liga dos Campeões.
Qual é o ingrediente mais importante para o sucesso de uma academia?
É um processo a longo prazo e tudo começa com o recrutamento de olheiros de jogadores em tenra idade. É importante ter os melhores talentos desde cedo para que possas desenvolvê-los através do caminho para o sucesso. A metodologia é fundamental e essa é baseada no que acontece no campo onde desenvolvemos atletas do ponto de vista técnico e mental. Concentramo-nos no desenvolvimento de bons jogadores, mas também de boas pessoas. Sabemos que para ter jogadores de topo eles também têm de ser pessoas de topo.
Como encontram o equilíbrio entre ter de ganhar como equipa e pensar no futuro dos jogadores individualmente nos escalões de formação?
Nós seguimos a nossa missão, que é desenvolver e promover os melhores jogadores para o nível mais alto. Esse é o nosso foco no dia-a-dia. Sabemos que não há equipas a estrear-se na formação principal, só há jogadores que o fazem, acho que é uma citação de Johan Cruyff. Então, para conseguir que um, dois, três jogadores façam a estreia na primeira equipa, o foco tem de ser muito claro sobre o indivíduo, e através desse caminho usamos a competição e usamos os jogos como um meio para um fim, e o fim é colocá-los nas melhores condições possíveis para serem jogadores profissionais.
"A produção de jogadores que possam gerar receitas é um pilar fundamental para o clube assegurar a sua sustentabilidade no futuro. No entanto, não podemos e não queremos comprometer a competitividade com a sustentabilidade"
Muito se escreveu e disse sobre João Félix e a avultada transferência para o Atlético de Madrid. Qual é que acha que foi o segredo para trabalhar o João no caminho certo para chegar à primeira equipa?
Penso que tem a ver com a ética de trabalho, o talento e o trabalho que o João tem feito nos últimos anos aqui na academia. Sei que ele jogou em níveis diferentes, e não foi por ter jogado numa idade mais jovem ou num nível mais baixo que deixou de trabalhar ou não se empenhou no seu desenvolvimento. Além disso, acho que ele também teve o apoio social e pessoal certo, o que complementou a sua personalidade estável. Todos esses fatores contribuíram para o seu sucesso.
O João é um dos muitos jogadores que foram desenvolvidos aqui e que agora brilham em alguns dos maiores clubes das maiores ligas da Europa. Há Bernardo Silva e João Cancelo na Premier League, Nelson Semedo em Espanha... Há muita pressão para continuar esse trabalho de sucesso?
A pressão está lá e num clube como o Benfica, onde a equipa principal procura ganhar o título a cada ano, isso sente-se. O clube tem uma grande base de fãs, com grandes exigências para jogar em frente de 60 mil pessoas no nosso estádio, por isso, para preparar os jogadores para esse nível, sabemos que há pressão para entregar o que é esperado e sabemos que temos uma enorme responsabilidade sobre o que tem sido feito aqui e na história do clube.
Qual a importância de o Benfica confiar na sua academia em comparação com outros clubes maiores e mais ricos da Europa?
Para o Benfica, a academia e a produção de jogadores que possam gerar receitas é um pilar fundamental para o clube assegurar a sua sustentabilidade no futuro. No entanto, não podemos e não queremos comprometer a competitividade com a sustentabilidade. Penso que ambas as coisas podem andar de mãos dadas e, num clube como este, o nosso desafio é realmente tomar ambas as coisas de mãos dadas.
O que é mais importante para o sucesso de um jogador: talento ou trabalho duro?
Ambos se for possível, mas já vimos as duas situações... Jogadores muito talentosos que falharam porque não trabalharam o suficiente e jogadores muito trabalhadores a chegarem a um nível muito decente, talvez sem tanto talento. O que tentamos encorajar nos nossos jogadores é a paixão pelo trabalho e a tentativa de maximizar o seu talento, seja qual for o nível.
Sente que tem o apoio do clube, do presidente, do CEO? Quão importante é esse apoio?
Acho que temos todo o apoio da estrutura do clube. Falamos sobre a responsabilidade de produzir jogadores e trabalhar para cumprir essa missão, e o clube está a investir para estar à altura das expectativas. Da visão do presidente ao apoio e gestão da direção neste projeto, há quase um contexto "sem desculpas" para continuar a trabalhar e continuar a ajudar esses jogadores a realizar os seus sonhos.
Pedro Marques, diretor do futebol de formação do SL Benfica, vai ser um dos oradores na Soccerex Europe, um dos maiores congressos da indústria de futebol do mundo e que vai decorrer em Oeiras nos dias 5 e 6 de setembro.
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