São três as razões que trazemos aqui hoje para o atual sucesso do Leeds United na Premier League. Uma equipa composta por jogadores que têm de dar tudo em prol da equipa e deixar o ego à porta do estádio, caso contrário, a fórmula não funciona e com toda a certeza que não jogarão numa equipa liderada por Marcelo Bielsa. Vejamos então quais as qualidades e atrativos que o Leeds nos oferece jornada sim, jornada sim.
A qualidade de Raphinha
Não é obviamente apenas de Raphinha que vem a qualidade do Leeds esta temporada. Jogadores como Illan Meslier, que acaba de bater o recorde de jogos sem sofrer golos (8) na Premier League por um guarda-redes sub-21. O antigo detentor do recorde era Joe Hart, que aos 19 anos conseguiu fechar as portas da sua baliza por sete vezes durante toda a temporada. Mais valias como Patrick Bamford que, com 13 golos, é já o terceiro melhor marcador da prova atrás de Bruno Fernandes (15) e Mohamed Salah (17), ou Kalvin Phillips, de apenas 23 anos e com grande futuro pela frente, entre outros. A equipa poderia até estar bem colocada na liga, mas dificilmente teria o impacto que está a ter, não fosse Raphinha.
Afinal o que dizer do extremo brasileiro? Com apenas 19 anos ingressava no Vitória de Guimarães, impressionava um grande português e em pouco mais de cinco anos, tinha meio mundo atrás de si, incluindo Manchester United e Liverpool. Não será difícil imaginarmos uma tripla de atacantes composta por ele próprio, Jota e Firmino, por exemplo, caso Klopp decida renovar a frente de ataque dos Reds. Por outro lado, Raphinha é precisamente o que o United precisa. Velocidade e destreza em ambas as alas com Rashford e Raphinha servidos por Bruno Fernandes. A mentalidade do ainda muito jovem — 24 anos apenas — jogador brasileiro prometem um investimento grande durante a janela de transferências de verão.
Sobre o futebol de Raphinha, deixemos que o próprio Bielsa o diga. “Sinceramente, acho que não posso acrescentar muito ao seu jogo. A melhor coisa que se pode fazer com jogadores tão espontâneos é deixa-los ser quem são", defendeu.
A capacidade de recepção e controlo de bola, a explosão, as fintas, o carisma no pé esquerdo, a agilidade, velocidade e, acima de tudo, um atributo que não se vê, e se espera, com muita regularidade num fantasista: o enorme coração e vontade com que se disponibiliza a fazer recuperações defensivas. Basta ver um jogo do Leeds para poder apreciar a acção defensiva de Raphinha. Não há um único jogo em que não se veja o esforço do extremo brasileiro a correr para trás.
Raphinha é o epíteto do futebol de Bielsa e sem ele o Leeds seria outro.
Bielsa, desportivismo e humildade
Podemos voltar atrás no tempo e recordar o jogo entre o Leeds e o Aston Villa — curiosamente o embate desta mesma jornada — em abril de 2019, em que Bielsa pediu aos seus jogadores para pararem e deixarem os Villains marcar golo. Isto logo após o Leeds ter marcado numa situação dúbia, em que alguns jogadores do Aston Villa tinham parado, pensando que o Leeds iria colocar a bola fora de campo para intervenção da equipa médica. O gesto valeu a Bielsa e ao Leeds o prémio FIFA’s Fair Play Award pelo seu comportamento exemplar nesse jogo. Para quem não se lembra, esse era um jogo fundamental para o Leeds e vence-lo poderia ter significado subir à Premier League, feito que só viria a acontecer um ano depois. O jogo acabaria 1-1.
Vencer a todo o custo e a qualquer preço não está nos planos de Bielsa. Obviamente que podemos recordar o incidente conhecido como Spygate, onde o Leeds foi multado por espionagem sobre os adversários. Prontamente, Bielsa convocou uma conferência de imprensa onde ilibou qualquer membro de staff e o próprio clube, assumindo todas as culpas. Disse tratar-se da observação do adversário desde um lugar público e é algo que vem fazendo desde há algum tempo. Tornou o trabalho da FA mais fácil assumindo todas as responsabilidades e disponibilizando a informação necessária. Mais uma vez, assim como faz com a sua equipa, Bielsa dá o corpo às balas, assume as suas responsabilidades e não tem medo de arcar com as consequências.
O comportamento de Bielsa é tão exemplar, que desde que chegou ao Leeds, a única vez que foi visto a reclamar com um árbitro, neste caso o quarto árbitro, foi no último jogo frente ao Southampton, quando perdeu a paciência pela repetição de uma falta sobre o seu jogador. Uma exceção que confirma a regra sagrada de Bielsa em não procurar desculpas e assumir as culpas de situações ou resultados menos conseguidos.
O Leeds espelha, obviamente, a filosofia do mestre Bielsa e é uma das cinco equipas sem um único cartão vermelho. Seja ele direto ou por acumulação de amarelos, nenhum jogador do Leeds foi expulso no decorrer desta temporada a contar para a Premier League.
Além de tudo isso, a aura de El Loco Bielsa cresce quando este é um treinador que praticamente contrata um clube no final de cada ano. O carismático treinador argentino recusa-se a assinar contrato com o Leeds por mais de uma temporada. Questionado este fim de semana sobre os rumores de que a sua extensão de contrato com o Leeds está bem encaminhada, é o próprio a dizer ao clube, aos adeptos e para quem queira ouvir que ainda é muito cedo para ser recompensado. A humildade, franqueza e respeito do argentino desde a sua entrada na Premier League tem sido ímpar.
A mentalidade
É precisamente aqui que reside o segredo do Leeds de Bielsa. A pressão, os ataques rápidos, a defesa homem-a-homem a campo inteiro, o risco em sair a jogar pelo guarda-redes, todas essas são características da equipa mas que só funcionam devido a uma, maior que todas elas. A mentalidade. A atitude competitiva da equipa, o querer sempre mais e, principalmente, o nunca desistir. Deve ser exaustivo trabalhar com o treinador argentino porque ninguém pode desistir, nem quando estão por cima, nem muito menos quando estão por baixo. Esse foi o caso dos 4-0 aos 47 minutos frente ao Arsenal, em que Bielsa nunca deixou de motivar, ajudar e pressionar a sua própria equipa que eventualmente conseguiria reduzir a vantagem para 4-2. Inútil, poder-se-á pensar, mas é essa a mentalidade da equipa, e por muito que tenha sido inútil nesse jogo, só disciplina e consistência de mentalidade levam o Leeds a poder manter acesa a chama noutros jogos com resultados menos desnivelados. Desistir num poderia significar não conseguir lutar noutro. Persistência e consistência nas ações e hábitos é primordial para jogar sob a batuta de Bielsa.
Este fim-de-semana, no programa semanal Sky Sports’ Soccer Saturday, o apresentador Jeff Sterling falava do quanto apreciava Marcelo Bielsa e a sua paixão pelo jogo, destacando precisamente a sua atitude positiva depois de sofrer quatro golos frente ao Arsenal. Nisto, um dos comentadores, Paul Merson, antiga lenda do Arsenal disse algo que, na minha opinião, resume o Leeds United de Marcelo Bielsa. “Eles não jogam com o resultado, eles apenas não param de jogar.” E não poderia concordar mais. Por vezes, poderá não ser a maneira mais inteligente de abordar o jogo, contudo a paixão, intensidade e mentalidade continuam e continuarão intactas.
O Leeds é das equipas mais excitantes da Premier League, tem apenas dois empates em 25 jogos, 43 golos marcados e 43 golos sofridos, apenas um jogo em que participou não teve golos e é, permitam-me, a minha equipa preferida na Premier League. Aproveitemos enquanto Raphinha e Bielsa asseguram o espetáculo porque, depois deles, o futuro será sempre uma incógnita.
Esta semana na Premier League
Além do Leeds v Aston Villa, até bem recentemente um embate de Championship, temos jogos grandes para animar o fim-de-semana e a semana que se segue. Os destaques vão principalmente para o Chelsea que depois de uma excelente primeira mão frente ao Atlético de Madrid, recebe o Manchester United e viaja até Liverpool para visitar os Reds de Klopp. Dois importantes jogos para a definição do Chelsea de Tuchel que em oito jogos tem sete vitórias, um empate e apenas dois golos sofridos.
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