Devo confessar que ao ver o onze que José Mourinho escolheu para o embate com o Liverpool, no passado dia 28 de janeiro, fiquei muito surpreendido. Não esperava a abordagem ao jogo num 3x4x3 como acabou por acontecer. O treinador português tem tido, com este Tottenham, uma abordagem do jogo muito linear: uma defesa composta habitualmente por quatro defesas, um meio campo com dois médios mais defensivos, dois alas (um mais ofensivo e outro mais trabalhador) e um número 10 que se esforça tanto a atacar como a defender (que é crucial na estrutura devido à sua pressão que faz quando o adversário tem a bola). E, claro, Kane na frente.
Qualquer disrupção a esta formula, tem provado colocar o Tottenham em grandes dificuldades. Daí ter ficado surpreendido pela abordagem com três defesas centrais e dois alas (laterais por natureza) a fazerem todo o corredor. O que, em fase defensiva organizada, se traduz numa defesa a cinco. O impacto deste reforçar (em números) da defesa é o enfraquecimento do meio campo. E como tenho vindo a dizer, no futebol moderno, o meio campo é o equilíbrio de qualquer equipa. Mexer no mesmo, retirando qualidade, nunca é boa prática. A qualidade pode ser retirada em número, como foi o caso do Tottenham ao alterar a tática jogando com menos um médio ou em qualidade, como fiz questão de salientar a semana passada em "Terá um Liverpool arrogante colocado em risco o título?".
Olhando para os resultados obtidos conseguimos perceber que ambas as vitórias dos Spurs jogando com três defesas foram contra duas equipas muito inferiores e que, neste caso, faz todo o sentido colocar mais jogadores ofensivos. Isto porque os alas não serão colocados sob pressão e conseguirão fazer eles a pressão sobre os laterais adversários, dando à equipa mais soluções ofensivas. Os riscos corridos são mínimos dado o menor caudal ofensivo destas equipas.
Já no caso de equipas minimamente competitivas, como é o caso do Brighton, tal já não resulta. Isto porque a capacidade de o Tottenham reter a bola é muito escassa, as soluções ofensivas com imaginação são igualmente limitadas e a liberdade individual que Mourinho parece dar aos jogadores é mínima. Assim se explicam os resultados menos positivos.
Liverpool vs Liverpool
Uma comparação interessante de se fazer é colocar lado a lado os últimos dois encontros entre Tottenham e Liverpool.
- 28 janeiro 2021 - Tottenham 1 Liverpool 3
Como já foi dito acima, o facto de defender com cinco defesas retirou qualquer intensidade ao meio campo do Tottenham. Ndombele foi uma sombra dele mesmo, estando durante o jogo em terra de ninguém, não conseguindo pressionar, tal era a facilidade do Liverpool encontrar espaço e jogadores no miolo do meio campo. Um jogo em que o Tottenham enfrentou o Liverpool de igual para igual, talvez de forma a tentar aproveitar-se do mau momento dos Reds, mas o que é certo é que isso levou a que o Tottenham tivesse mais posse de bola do que o habitual. Os 49% de posse de bola do Tottenham vão contra todas as possibilidades dos Spurs jogarem o seu melhor futebol. Retiram contra-ataques à equipa, dá mais espaço para o Liverpool atacar o sector mais frágil da equipa de Mourinho, a defesa, expõe as fragilidades imaginativas e criativas do Tottenham em ataque continuado. O resultado nunca poderia ser bom. O Tottenham precisa de menos posse e mais intensidade nos seus ataques.
- 16 de dezembro de 2020 - Liverpool 2 Tottenham 1
Um jogo mais equilibrado do ponto de vista competitivo e, claro, menos equilibrado do ponto de vista de posse de bola. Já percebemos que ambos andam em sentido inverso quando se trata do Tottenham de Mourinho. Com apenas 24% de posse de bola, o Tottenham perde o jogo apenas para lá dos 90 minutos, tendo tido várias oportunidades de o vencer antes do golo de Firmino. Ainda assim, não jogou na sua máxima força e se o tivesse feito, talvez pudesse mesmo ter arrecadado os três pontos. A não-inclusão de Ndombele no onze e no jogo, acabariam, em minha opinião, por desequilibrar a balança para o lado de Klopp. A ausência, penso eu, terá sido devido a Ndombele não estar a 100% após uma pequena lesão, apesar de ter estado no banco de suplentes nessa partida.
Contra o City só na máxima força
É este o apelo a José Mourinho: que o Tottenham enfrente o Manchester City na máxima força. Qualquer alteração ao meio campo, com o alterar do esquema tático ou com a introdução de Lucas Moura, Lo Celso ou Lamela, normalmente não trás boas notícias à equipa londrina. Uma defesa a quatro, com um meio campo recheado de força e capacidade de trabalho, com Pierre-Emile Højbjerg, Tanguy Ndombele, Moussa Sissoko e Steven Bergwijn e na frente os insubstituíveis Son e Kane.
Não haverá outra forma de levar de vencida uma equipa que, pela sua capacidade ofensiva, poderá levar o adversário a pensar que defender com mais jogadores atrás poderá ser a única solução, mas que acaba por ser um erro capital já que, jogando perto da área, é apenas uma questão de tempo até a equipa de Guardiola descobrir a combinação do cofre, por mais bem guardada que ela esteja.
Apesar de ter sido num momento da época muito diferente, o resultado do jogo já realizado entre Spurs e Citizens desta temporada acabou com um 2-0 favorável à equipa de Mourinho. Claro que o Tottenham jogou na máxima força, com o onze que referi e em 4x4x2/4x2x3x1. Com isso conseguiu levar de vencido o rival. Desta feita, estando o City numa série de 15 vitórias consecutivas a contar para todas as competições — recorde que nenhuma outra equipa inglesa alcançou — não será tão fácil e mesmo os Spurs jogando no máximo da sua força, o mais provável é não ser suficiente.
Esta semana na Premier League
Com um City v Tottenham à porta, o jogo da semana poderá mesmo ser o jogo de abertura da jornada. No Leicester v Liverpool estará o terceiro lugar em causa. Separados por três pontos, com o Leicester na frente e um Liverpool vindo de duas derrotas seguidas, tudo poderá acontecer. O Liverpool terá que arranjar forças onde quer que seja, mas não poderá deixar o Leicester fugir com a vitória. Isso não só significaria perder mais três pontos como será uma questão de honra para um campeão já muito desgastado.
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