O SC Braga é, nesta fase da época 2019-2020, um clube de duas faces. Os “Guerreiros do Minho”, à imagem do banco “bom” e do banco “mau”, parecem ter duas caras conforme a competição que estão a disputar. A nível interno, seguem em 7.º lugar, com 18 pontos, a uma distância de outros tantos do líder da Liga NOS, o SL Benfica. É o lado “mau”.
Fora de portas, na Liga Europa, vem ao de cima, o lado “bom”. Ou antes, o lado “muito bom”. Os minhotos, que antes da última jornada do Grupo K, disputada na Eslováquia, diante o Slovan Bratislava, já estavam apurados, terminaram a fase de grupos no 1.º lugar, ao vencer, por 2-4, o adversário desta noite. E ficaram à frente do Wolverhampton, 6.º na Premier League.
Com muitas caras novas em relação ao onze titular que tem brilhado pela Europa, com Tiago Sá, a estrear-se na baliza, Trincão (tem sido suplente), Caju, Uche Agbo, Pablo Santos (que regressa depois de um par de jogos sem “calçar”), Rui Fonte, que não tem sido titular, e ainda Diogo Viana, que participou no seu primeiro jogo europeu, o Braga esteve por duas vezes em desvantagem, mas apenas durante quatro minutos. Sofreram o primeiro golo, empataram. Um empate que durou um pouco mais de 25 minutos. Voltaram a sofrer e chegaram de novo ao empate, em 120 segundos. Para depois marcar, passarem para a frente e dilatar a vantagem, já nos descontos.
Mas não foi uma vitória qualquer. Nem um pódio igual a tantos outros. Ricardo Sá Pinto, treinador dos bracarenses, após o encontro, na entrevista à SPORTTV, deixou claro que os três pontos são uma soma importante aos dados históricos que o Braga tem alcançado este ano. Na Europa, bem entendido. “Em 12 grupos, fomos a segunda equipa com mais pontos [14, menos um que o Sevilha] e somos a equipa com mais golos [15, tantos como o Arsenal]”, da fase de grupos da Liga Europa, sublinhou o técnico dos minhotos, que alcançaram hoje o 13.º jogo europeu sem perder, um recorde nacional.
E é com esta mentalidade “que gosta”, de uma equipa “que não pára” e que é “ambiciosa”, que procura fazer o “transfer para o próximo jogo com Paços [de Ferreira]”, a contar para a jornada 14 da divisão maior do campeonato português e “continuar a subir na tabela”, frisou ainda Sá Pinto. Para contrariar a história do banco “bom” e banco “mau”.
Ora marcas tu, ora marco eu
Em Bratislava, no estádio Tehelné pole, debaixo de uma temperatura de 1º, as duas equipas demoraram a aquecer. Numa primeira parte algo insonsa, os dois golos de rajada a terminar o primeiro tempo serviram de entrada para a “chuva de golos” dos segundos 45 minutos, acompanhados pelos flocos de neve que iam caindo, lentamente, no relvado.
Marcou primeiro (42’) o Slovan por intermédio de Andraz Sporar, avançado esloveno de 25 anos, aproveitando um deslize de um dos centrais bracarenses.
A igualdade (44’) surgiu pela cabeça de Rui Fonte, na sequência de um canto. O quinto golo da temporada do Braga que sai da bandeirola de canto.
As equipas regressaram das cabines tal como tinham entrado. Sporar rematou com perigo e Trincão, em rotação, envia a bola para uma defesa de Dominik Greif, que viria a estar em destaque no segundo tempo. Tal como o jovem internacional português.
Um empate não servia, na plenitude, os interesses da equipa minhota. As contas da liderança, importantes para ocupar o lugar de topo e ir para o sorteio dos 16-avos de final na qualidade de cabeça-de-série, passavam igualmente por Inglaterra, pelo estádio Molineux.
Os ouvidos em Inglaterra e os olhos na baliza. Uma reviravolta que nasceu num pontapé para trás
Os Wolves que defrontavam os turcos do Besiktas, marcaram ao minuto 58 e 63 e obrigavam, assim, a que o Braga saísse vencedor para ocupar o 1.º lugar. Instantes depois, em Bratislava, Trincão, canhoto que jogava descaído sob a direita, e Ricardo Horta tabelam, entre si, duas vezes, até Horta, com a baliza aberta e a poucos metros da linha de golo, atirar às redes laterais, dando a sensação de golo. Não passou disso.
Não marcaram os Guerreiros do Minho, marcaram os ingleses (3-0). E a equipa eslovaca, 2-1, por Moha Rharsalla.
O cenário, nada favorável aos interesses nacionais, demorou ... dois minutos. Ou, para ser mais preciso, cinco. Trincão, num movimento da direita para a esquerda, rematou para defesa incompleta do guarda-redes eslovaco. A bola morreu na pequena área mas Ricardo Horta não a conseguiu colocar dentro da baliza (defesa a dois tempos).
A jogada serviu de ensaio para o primeiro golo do n.º 77 ao serviço do Braga. Trincão repetiu o desenho de fora para dentro e deu esperança aos bracarenses.
Que passaram de esperançosos a viverem a mais pura das realidades, três minutos depois. João Novais seguiu pela pesada autoestrada de relva solta, numa jogada “à Son” quase que entrou na baliza, centrou para Ricardo Horta, que chutou (incrivelmente) para trás com a bola a embater nos pés de Vasil Bozhikov. Horta, que tinha feito um golo decisivo, em Inglaterra, com os Wolves, volta a ser decisivo ao atirar a bola contra os pés do adversário. Que fez autogolo.
Estava operada a reviravolta. Que podia sair reforçada de imediatom num livre de Novais e numa jogada entre Paulinho e Ricardo Horta que, mais uma vez isolado frente ao homem das luvas do Slovan, não foi feliz e deixou o brilho para quem ocupava a baliza. O avançado português teve nos pés três oportunidades claras de golo: uma defesa, uma bola fora e a única bola que rematou e que não foi em direção à baliza, viria a terminar dentro dela, com a ajuda dos pés do adversário.
Nos descontos, Paulinho, que entrara no segundo tempo, inicia a jogada, corre de área a área, endossa o esférico no lado contrário a Horta, que talvez ensombrado pelos falhanços meteu em Fransérgio e este, com uma rosca, devolveu para Paulinho mergulhar de cabeça a escassos metros da linha de golo e fazer o 2-4 (e o 4.º golo europeu).
Terminava pouco tempo depois o 13.º jogo do Braga sem perder na Europa. 1º lugar no Grupo K da competição e um percurso de sucesso que não tem tido correspondência a nível interno. Um assunto - Braga de duas caras - que mereceu reflexão por parte da formação comandada por Sá Pinto. Se para Trincão, a equipa tem o “mesmo processo” no campeonato, Rui Fonte assumiu “dificuldades” em lidar com a estratégias das equipas nacionais e que, embora não esteja “em causa a qualidade de jogo”, os minhotos têm que “reagir”. Por isso, Novais despediu-se de Bratislava pouco preocupado “com o sorteio” da Liga Europa, mais com o jogo “no domingo”.
Bitaites e postas de pescada
O que é que é isso, ó meu?
Ricardo Horta teve nos pés quatro oportunidades claras de golo. Duas dentro da área. Uma só com o guarda-redes contrário pela frente, a outra de baliza aberta. E ainda duas, mais gritantes, na pequena área, a escassos centímetros da linha de golo. Ora, foi precisamente numa jogada que parecia mais claro que surgisse o golo que este surgiu. Mas só que não foi pelo pé do avançado português, mas sim devido a um autogolo de Vasil Bozhikov, que estava atrás do n.º 21 bracarense. Confusos? É que Horta, no único remate que fez e que não foi em direção à baliza, fez golo, porque a bola bateu nos pés do adversário. Ninguém disse que o futebol é justo. Nem uma ciência exata.
Trincão, a vantagem de ter dois pés esquerdos
Trincão, jovem internacional português, tem um pé esquerdo que vale por dois. Descaído pela direita do ataque bracarense, em Bratislava, fez dois movimentos em tudo idênticos que resultaram em dois remates em tudo semelhantes. Se um “deu” defesa, o outro terminou em golo.
Fica na retina o cheiro de bom futebol. Um duplo box-to-box
João Novais ou Paulinho. Duas correrias com a bola nos pés, box-to-box, que deram golo. Novais “Son” levou ao autogolo que colocou os “Guerreiros do Minho” a vencer. E Paulinho começou e conclui, em mergulho, nos descontos, o 4.º golo, que confirmou a vitória. Dois hinos ao futebol.
Nem com dois pulmões chegavam a essa bola
Os dois centrais do Braga ficam mal na fotografia do lance do golo inaugural do Slovan. Andraz Sporar, avançado esloveno de 25 anos, correu, ganhou metros e rematou de trivela para a baliza de Tiago Sá. Se um central “deu o berro” a correr, o outro não soube colocar-se à frente para evitar que a bola tocasse as malhas.
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