Na abertura da conferência ‘A Banca do Futuro’, organizada pelo Jornal de Negócios e pela Claranet, Mário Centeno disse que este encontro acontece num “num momento em que o país é incitado a refletir, a pensar, não é apenas o governdor do Banco de Portugal convidado a refletir”.
O governador citou versos do poema ‘Abandono’ de David Mourão-Ferreira, que disse ter lembrado na quarta-feira à noite quando preparava a sua intervenção de hoje de manhã.
“Por teu livre pensamento/Foram-te longe encerrar/Tão longe que o meu lamento/Não te consegue alcançar”, disse Centeno, não fazendo, contudo, uma ligação destes com a recente polémica política em que esteve envolvido, por o seu nome ter sido sugerido por António Costa para lhe suceder como primeiro-ministro, mas com o setor financeiro.
“Foi com livre pensameno que, na verdade, atingimos a estabilidade financeira de que hoje a banca desfruta”, acrescentou.
Centeno considerou que o recente “processo de transformação da banca portuguesa foi extraordinário” com redução de ativo, redução de malparado, reforço dos capitais e melhoria da rentabilidade.
Segundo o governador, os atuais “resultados são merecidos”, mas também “são cíclicos e têm de ser usados para preparar o futuro”.
“O que mais desejo para banca é que adote políticas prudentes de constituição de imparidades e capital. Neste momento em que muitos olham para os resultados e acham extraordinários e excessivos, estes resultados têm uma dimensão cíclia excessiva e felizmente a banca tem respondido ao desafio de remuneração das poupanças, de atenção aos clientes, há dezenas de milhares créditos renegociados”, afirmou.
Já a semana passada, num almoço no American Club of Lisbon, o ex-ministro das Finanças (de Governos PS de António Costa) disse que a economia vive de ciclos negativos e positivos e que os lucros atuais dos bancos são resultado também do ciclo positivo e que estes devem pôr de lado parte dos lucros para prevenir períodos negativos no futuro.
Centeno elogiou ainda a economia portuguesa, sobretudo a melhoria das finanças públicas e o mercado de trabalho, considerando que na zona euro a força do emprego é o “resultado da excelência da resposta das políticas públicas” durante a crise pandémica.
Sobre o futuro, considerou que os próximos anos serão desafiantes, também devido ao contexto externo.
Quanto à subida significativa das taxas de juro, disse que “desejavelmente não vão voltar a zero”, mas que espera que desçam para um intervalo entre 2% e 2,5%, compatível com uma taxa de inflação de 2% a médio prazo.
“Para lá chegarmos, para fazermos esta normalização [da política monetária] e responder à inflação, foi necessário subir as taxas diretoras do Banco Central Europeu”, disse.
À saída desta conferência, Centeno não falou aos jornalistas, depois da polémica que o envolveu por ter sido proposto pelo atual primeiro-ministro, António Costa, para o substituir no cargo.
Mesmo depois de o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ter decidido que haverá eleições legislativas antecipadas em 10 de março, na sequência da demissão de António Costa (por ser alvo de uma investigação do Ministério Público), a sugestão de Centeno levou a críticas de partidos da oposição e a um diferendo entre Mário Centeno e o Presidente da República.
Em declarações ao jornal Financial Times, no domingo, o governador do Banco de Portugal afirmou que teve “um convite do Presidente e do primeiro-ministro para refletir e considerar a possibilidade de liderar o Governo” e que estava “muito longe de tomar uma decisão”.
Em reação, na madrugada de domingo para segunda-feira, o Presidente da República publicou uma nota a negar que tenha convidado quem quer que seja para chefiar o Governo, incluindo o governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, ou autorizado qualquer contacto para este efeito.
A declaração de Marcelo Rebelo de Sousa levou Centeno a corrigir a sua declaração: “É inequívoco que o senhor Presidente da República não me convidou para chefiar o Governo”, já que optou por dissolver a Assembleia da República, disse Mário Centeno em comunicado.
A conduta de Mário Centeno levou a uma reunião extraordinária da Comissão de Ética do Banco de Portugal, para ser avaliada, tendo esta considerado que o governador cumpriu os deveres gerais de conduta e “agiu com a reserva exigível”. Contudo, acrescenta que, “no plano objetivo, os desenvolvimentos político-mediáticos subsequentes podem trazer danos à imagem do Banco”, considerando que “a defesa da instituição é ainda mais relevante num período como o atual”.
Neste sentido, recomenda a comissão presidida por Rui Vilar que “o governador, a Administração e o Banco no seu todo continuem empenhados na salvaguarda da imagem e reputação do Banco de Portugal”.
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