“Vários países já têm sistemas, vários países estão a construir os seus modelos relativamente a essa matéria e nós vamos construir o nosso”, disse Fernando Medina, durante uma audição na Comissão de Orçamento e Finanças (COF), no parlamento, em resposta à deputada bloquista Mariana Mortágua.
O ministro não se comprometeu com datas, mas garantiu que vai criar um sistema para uma tributação adequada, guiado pelo princípio da justiça e da eficácia.
“Vamos adaptar a nossa legislação e a nossa tributação, de facto, a não termos lacunas que façam com que haja mais-valias relativamente à transação de ativos que não tenham uma taxação”, disse.
Todavia, o governante sublinhou que procurará evitar que o sistema não caia num “caráter de excecionalidade que acabe por reduzir a receita a zero”.
Posteriormente, na mesma audição, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, explicou que o executivo está "a avaliar do ponto de vista da comparabilidade internacional aquilo que é a definição dos criptoativos", dado que não existe uma definição do conceito a nível internacional.
Mendonça Mendes assinalou que, desde março de 2021, o Centro de Estudos Fiscais está a fazer uma avaliação relativamente à tributação das criptomoedas, considerando ser "uma realidade muito mais complexa” do que a tributação em sede de mais-valias, uma vez que está também em causa a questão da utilização como meio de pagamento, o tratamento para efeitos de IVA, para efeitos de selo, para efeitos de impostos sobre património e de assunção na categoria B ou A.
O Bloco de Esquerda propõe que os ganhos com as criptomoedas sejam tributados em IRS como qualquer outra mais-valia, considerando inexplicável se o PS recusar esta alteração ao Orçamento do Estado para acabar com o atual “’offshore’ de criptomoedas”.
Em declarações à agência Lusa, a deputada do BE Mariana Mortágua antecipou uma das propostas de alteração que o partido apresenta no âmbito do debate na especialidade do Orçamento do Estado para 2022 (OE2022), cujo prazo de entrega no parlamento termina hoje.
“É inexplicável como é que o PS se recusa a tributar fortunas criadas em segundos na internet enquanto mantém o IVA da eletricidade, e não aumenta os salários num contexto de inflação. São escolhas inexplicáveis, de mera promoção da especulação e de proteção dos ganhos especulativos”, afirmou.
Governo vai avaliar impacto do englobamento das mais-valias especulativas
Medina, adiantou hoje também que o Governo irá avaliar o impacto do englobamento obrigatório das mais-valias imobiliárias de curto prazo.
“Avaliaremos ao longo deste ano o seu efeito, o seu impacto, mas não a considero nem a solução milagrosa relativamente à equidade da tributação entre capital e trabalho. Também não a considero a solução que afaste o investimento”, disse.
O governante respondia a uma questão colocada pelo deputado social-democrata Joaquim Miranda Sarmento sobre o eventual impacto da medida.
Fernando Medina recordou que a medida constava na proposta do Orçamento do Estado que foi chumbada em outubro e integrava também o conjunto de medidas que tinham sido acordadas com os partidos à esquerda do PS.
“Decidimos naturalmente pela manutenção da sua inclusão. Eu posiciono-me no campo de quem nem diaboliza nem considera miraculosa uma medida desta natureza. Trata-se de uma densificação do nosso regime de IRS para uma área que não exclusivamente os rendimentos de trabalho”, vincou.
Para o ministro, a proposta não acarreta “nenhum risco particular sobre a atratividade do país relativamente ao investimento estrangeiro”.
A nova proposta do OE2022 mantém a norma que obriga ao englobamento das mais-valias mobiliárias obtidas com a venda de títulos detidos há menos de um ano.
“O saldo entre as mais-valias e menos-valias, resultante das operações previstas na alínea b) do n.º 1 do artigo 10.º [alienação onerosa de partes sociais e de outros valores mobiliários], incluindo os rendimentos referidos nas alíneas b) e c) do n.º 18, são obrigatoriamente englobados quando resultem de ativos detidos por um período inferior a 365 dias e o sujeito passivo tenha um rendimento coletável, incluindo este saldo, igual ou superior ao valor do último escalão do n.º 1 do artigo 68.º”, refere a proposta orçamental.
O documento ressalva, contudo que a medida apenas se aplica aos rendimentos auferidos a partir de 01 de janeiro de 2023.
Com o englobamento obrigatório, os contribuintes abrangidos passarão a ter de somar aos restantes rendimentos (de trabalho e pensões) estas mais-valias, que, desta forma, são sujeitas às taxas progressivas do IRS em vez de serem tributadas à taxa liberatória de 28%.
No relatório que acompanha a proposta orçamental é referido que o “englobamento dos rendimentos de mais-valias mobiliárias especulativas” tem o objetivo de “promover uma maior progressividade do IRS e justiça social”.
Esta obrigatoriedade de englobamento abrange apenas as pessoas cujo rendimento coletável (incluindo o saldo das mais-valias) seja igual ou superior a 75.009 euros.
Medina diz que contexto é de incerteza relativamente à inflação
O ministro das Finanças vincou também que os tempos são de incerteza no que toca à inflação, considerando que a questão fundamental é se a subida já atingiu o pico ou se a descida será mais lenta do que o previsto.
“Estamos neste contexto de incerteza, relativamente nomeadamente ao andamento de inflação, 7,2% em abril”, disse Fernando Medina durante a audição, quando novamente por Miranda Sarmento sobre se a previsão de inflação incluída na proposta do OE2022 ainda se mantém atualizada.
Segundo o deputado do PSD se os preços aumentarem 0,5% ao mês até ao final do ano, a inflação será de 7,3%, o que contrasta com a taxa de inflação de 3,7% prevista pelo executivo.
"A questão fundamental quanto ao andamento da inflação é se nos encontraremos no topo relativamente ao valor de aumento e se a partir daqui assistiremos a um processo de estabilização e depois a descida ou se este processo será mais lento relativamente à descida face àquilo que se aguardava", respondeu.
O ministro justificou que um ou outro cenário irá implicar o andamento da política económica, nomeadamente no segundo semestre do ano.
Já anteriormente durante a audição, Fernando Medina vincou que o OE2022 está a ser discutido numa conjuntura exigente e complexa.
"A economia portuguesa apresenta um desempenho assinalável que podemos, e devemos, sublinhar. Mas por outro lado, acumulam-se fatores de pressão externa, à vista de todos, os quais não podemos evitar, e com os quais temos de saber lidar", disse.
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