Vejamos: no pretérito dia 7 de fevereiro, foram divulgados os primeiros resultados da sondagem da Intercampus para o Jornal da Madeira. Aí, pôde ler-se que a coligação pré-eleitoral PSD-CDS venceria as eleições com mais 10% do que o Partido Socialista, liderado por Sérgio Gonçalves (um reputado economista, quadro do Grupo Sousa).
É certo que o número de inquiridos é reduzido, não menos certo é que o número de indecisos também é considerável (cerca de 25%), mas há, no entanto, uma questão que a todos deve interpelar: Por que motivo o PS-Madeira perde as eleições há quase 50 anos? Ou, até, poder-se-ia colocar a questão ao contrário: Por que razão o PSD-Madeira ganha as eleições consecutivamente há quase 50 anos?
A resposta é relativamente simples: O PSD-Madeira confunde-se com a própria construção da autonomia regional, e com as inúmeras conquistas que dela advieram. A Madeira, antes do 25 de abril, era um território paupérrimo. Nesse tempo, não havia água potável, não havia luz e não havia estradas que ligassem a Ilha entre si. As pessoas moviam-se a pé, durante horas e horas a fio para trabalhar. Morria-se cedo, comia-se pouco e vivia-se, essencialmente, do bordado e da agricultura, sem reformas no final da (curta) vida. Essa mesma vida era, em síntese, difícil, exasperante e crudelíssima.
Depois, com a conquista da autonomia regional, a Madeira deu o grande salto em frente, ampliando os seus poderes constitucionais – que ficaram consignados na versão originária da Constituição de 1976. Mais tarde, as sucessivas revisões constitucionais foram aprofundando esses mesmos poderes, e, hoje, a conversa é outra: uma rede viária de altíssima qualidade, infraestruturas escolares renovadas, saneamento básico, direito ao trabalho e ao trabalho com direitos e, por fim, uma rede de lares modernizada, que garante anos tranquilos aos mais velhos.
Por isso é que, de então para cá, o PSD-M nunca mais largou a “bandeira” da defesa da autonomia, e percebe-se porquê. A defesa da autonomia político-administrativa das Regiões Autónomas é uma luta perene, que durará enquanto houver território, é um pouco como a ideia de Povo – vive para sempre.
Por outro lado, o PSD-M sempre respeitou os trabalhadores em funções públicas, garantindo-lhes um tratamento justo, digno e proporcional à importância da sua função. Prova disso foi a aprovação pela Assembleia Legislativa Regional, em 2018, de um regime que permitiu a contagem integral do tempo de serviço a todos os professores da Região Autónoma da Madeira (os tais 9 anos, 4 meses e 2 dias). Uma medida de elevado alcance social, diga-se, que fez justiça à classe docente madeirense – e que, por sua vez, foi pioneira no país.
Perante isto, há uma outra pergunta na qual esbarramos: “E a oposição, pá? Tem-la visto?”.
E, bastas vezes, a resposta é sempre a mesma: “Não!”. E esse não é categórico, pois, na verdade, é difícil fazer oposição na Madeira. Como é que se porfia com um governo que executa uma política moderada, sensata e “bismarckiana” (a expressão é minha e só a mim me vincula)?
Fica difícil, por certo. Aliás, o PS/Madeira, principal partido da oposição, não tem, hoje, a dinâmica eleitoral que tinha quando disputou as eleições regionais de 2019. Em parte, porque a população madeirense, na altura, estava absolutamente rendida à figura de Paulo Cafôfo (atual SECP, então candidato à Presidência do Governo Regional). Mas, infelizmente, depois de apostadas todas as fichas, o PS-Madeira não logrou a vitória. Estar perto da vitória não é vencer, apesar de o PS-M ter feito pela vida.
Pesarosos, os socialistas madeirenses nunca digeriram bem a sua partida para a República. Ele, por seu lado, achou inevitável retirar-se da vida política regional após a derrota. E agora? Será que os socialistas madeirenses confiam numa vitória do PS-M?
Crê-se que não. O seu líder, apesar de ser portador de uma competência técnica inatacável, teima em não se distanciar de uma proposta política social-liberal que não é ao gosto do eleitor base do PS-M – este, diversamente, muito mais à esquerda no campo económico. Exemplo disso foi a proposta de eliminação da taxa de derrama regional, que incidia sobre as empresas com lucro tributável superior a 1,5 milhões de euros, e que poderia ter sido apresentada pelo PSD-M (ainda que nunca o tenha sido, porque o PSD-M considerou que existem outras prioridades políticas em matéria de fiscalidade que não esta).
Por fim, ainda quanto a este ponto, há que falar sobre a política de alianças. Se o PS-M ganhasse as eleições legislativas regionais, coligar-se-ia com quem, partindo do pressuposto de que não teria maioria absoluta?
É que, como é sabido, o PCP e o Bloco de Esquerda, na Madeira, têm uma expressão eleitoral muito reduzida. É um facto histórico. E, provavelmente, ficarão ambos fora do hemiciclo regional nas eleições que se avizinham. O primeiro teima em não colocar Sílvia Vasconcelos como coordenadora regional do Partido, mulher que, sem sombra de qualquer dúvida, representa o futuro do Partido Comunista Português na Madeira, e que mudaria, estou certo, o score eleitoral do mesmo; o segundo, porém, nunca mais se recompôs desde que Guida Vieira e Paulo Martins (históricos militantes da velhinha UDP-M) deixaram a sua militância ativa.
Em terceiro lugar, o JPP poderá capitalizar, roubando algum voto ao PS-M, com o combate político eficaz protagonizado pelos seus rostos mais conhecidos – Élvio e Filipe Sousa. Mas, ainda assim, não será suficiente para desenhar uma alternativa de governo credível. Faltam quadros, entre muitas outras coisas…
Portanto, não resta ninguém e o PS-M não se basta a ele próprio, o que limita necessariamente a criação de uma política de alianças pós-eleitoral. Na Madeira, não há uma estética de esquerda, razão pela qual o PS-M teria de bater-se pela ampliação do seu resultado eleitoral, ainda que com hesitações. Tem-nas não por teimosia, mas porque muitas vezes fica sem discurso político – o PSD-M antecipa-se habilmente.
Mas, note-se bem, a questão política central é mesmo esta: quase 50 anos depois, e não há um projeto político alternativo e à esquerda, na Madeira?
Sim, não há.
Comentários