Ando com dificuldades em comer. Não, não é depressão nem fadiga pandémica, até porque com o tédio uma pessoa tem tendência a comer mais. Não é uma questão de apetite, é já não saber o que é alimentação saudável e o que devo ou não meter no meu organismo. Antigamente, seguíamos os conselhos nutricionais das nossas mães e avós, sendo que o conselho das nossas avós passava por: “Come mais um bocado que estás muito magro”, mesmo que tivéssemos acabado de comer um cabrito inteiro e duas tigelas de arroz doce como pequeno-almoço e tivéssemos um IMC acima do legalmente permitido para andar num barco a remos no lago do jardim da Amadora.
As mães tem aquela particularidade que é acharem todas que são nutricionistas. E médicas. E psicólogas. E investigadoras do CERN. Talvez porque tenham de ser isso tudo isso um pouco, o problema é que a ciência e o conhecimento colectivo vai evoluindo e chegamos à conclusão que, afinal, as nossas mães também não percebiam grande coisa. Eu sou do tempo em que as crianças eram empanturradas com papas e cereais com mais açúcar do que o sangue do Fernando Mendes nos tempos em que não mandava para o lixo os ovos moles e folares que lhe ofereciam no Preço Certo. Era normal. A roda dos alimentos que aprendemos estava toda errada. Trinta gramas de açúcar por cem gramas de pequeno almoço? Não há problema, “o pequeno almoço é a refeição mais importante do dia e ele está a crescer”. Lanchar pão branquinho com marmelada e tulicreme e acompanhar com dois UCAL de chocolate e um refrigerante com mais 40g de açúcar? Até fica com visão turva, o pequeno bode, vai a correr para a escola e fica já com o aquecimento feito e é desta que tira boa nota a educação física.
A prova de que não sabemos nada e que vai tudo mudando? Os ovos. No meu tempo, fazia mal comer mais de um ovo por semana. Fazia mal ao fígado, ou lá o que era. Quantas vezes não queria eu outra refeição de ovos mexidos com bacon e salsichas e a minha mãe dizia “Já comeste um ovo esta semana, não pode ser, come só o bacon e as salsichas". A minha mãe é da Guarda, enchidos e fumeiro não fazem mal, têm até propriedades medicinais, pois, às vezes, o sangue está muito líquido e pode causar hemorragias e é preciso engrossar e coagular um pouco e nada melhor que comer uma farinheira como se fosse uma banana. Com o tempo, descobrimos que, afinal, podemos comer claras de ovos à vontade, a gema é que faz mal. Passado mais um tempo descobrimos que, afinal, a gema também não faz assim tão mal porque o colesterol alimentar não influencia não sei o quê e mais os triglicéridos e coiso. Afinal, podemos comer ovos à vontade e a minha mãe estava errada. Estavam todas, mas a intenção era boa.
Como já referi, as mães tinham um fetiche com o pequeno-almoço e faziam questão de mencionar que era a refeição mais importante do dia, sempre que acordávamos mais tarde e sem tempo de comer antes de ir para a escola. Mais: era importante comer a meio da manhã para não ficar tantas horas sem comer até ao almoço porque fazia mal ao estômago. Afinal, parece que fazer jejum até faz bem ao sistema imunitário e ajuda a prevenir algumas doenças e a prolongar a longevidade; mas também saiu um estudo que diz que afinal não faz assim tão bem e que provoca perda de massa muscular. Já não sei de nada, só sei que aquele bollycao e pão com chouriço a meio da manhã não deviam fazer muito bem.
Nem quero imaginar como serão as novas mães. Influenciadas pelas dicas de nutrição de influencers que seguem dietas da moda. Num dia só dão comida com PH alcalino porque viram nas stories da Cláudia Vieira; no outro só dão ovos mexidos com placenta porque viram um post da Jéssica Athayde. Na semana seguinte, dão batidos da Prozis entre as mamadas e depois acabam a dar crepes de tapioca da Rita Pereira com carne maturada do Hugo Sousa. Isto enquanto procuram no supermercado tudo sem glúten, sem lactose, sem açúcares adicionados, com baixo teor de sódio, sem gorduras saturadas, com ômega 3, e a um preço que permita estar bem alimentado e manter a casa.
Fruta é outro mito. Sumos de fruta com fartura para os meninos porque tem vitaminas. Tem, é um facto, mas também tem açúcar que faz mal. É beber água que faz melhor. Parece que a única coisa que continua a fazer bem são as sopas. Ah, mas tem de ser sem batata, agora, é verdade. RIP sopas da avó com batata, couve, feijão e bacon, com base cremosa que parecia concentrado de sopa ao qual se esqueceram de adicionar água. Vá, mas uma sopa de legumes podemos comer, embora alguns vegetais possam causar inflamação. Moral da história: tenham uma alimentação equilibrada e variada e comam sopas. Menos a canja que tem muitos hidratos e gordura. Canja não é sopa, canja é uma desculpa para comer frango e massa com uma colher. Sim, eu disse massa, quem come canja com arroz não merece viver.
Para ir: Stand-up comedy em Setúbal, dia 4 de Julho. Informações neste link.
Para ver: Podcast Prisão Preventiva
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