Este texto faz parte da rubrica Regresso a um Mundo Novo, em parceria com a plataforma 100 Oportunidades, em que vários jovens nos ajudam a pensar o mundo pós-pandemia.


Muito se tem falado na capacidade de reinvenção de cada organização, foram criados eventos só para estas partilhas de experiência, sobre como cada uma das organizações se adaptou, sobre como cada organização recriou a sua metodologia e o seu modelo de negócio e como estão a viver estes tempos diferentes. Isto é sempre centrado no nós, no umbigo de cada estrutura e na lei do mais rápido. Todos sabemos que o mais rápido deixa sempre alguém para trás, esse alguém por norma pertence a uma minoria que de menor não tem nada!

O problema nunca é quem ganha, mas sim quem perde, quem desiste, quem se deixa ficar porque “não há muito que possa fazer”. Este é o problema de hoje e de sempre, que nesta nossa nova realidade se intensificou a uma velocidade difícil de controlar. Enquanto dirigente de uma associação juvenil fui impactada por este efeito e por esta reflexão, sobre qual a nossa prioridade de reinvenção. O que via e vejo a acontecer à nossa volta é uma luta desenfreada pelo lugar mais inovador, pelos lives com os melhores convidados, por uma nova estrutura de vendas e uma nova forma de entregar valor onde nós decidimos entrar, nós todos e eu inclusive.

Há 50 e poucos dias quando decidi retirar todas as pessoas do Movimento Transformers do terreno a minha primeira preocupação foi: como é que nos vamos aguentar e como é que vamos fazer dinheiro nesta fase? Só depois (passado poucas horas após este primeiro tsunami de acção) é que pensei: quem é que nós queremos servir? Como vamos chegar às pessoas que servimos no nosso dia-a-dia? É esta a questão que todos os que entraram neste ciclo devem de fazer! É a todos aqueles que confiam em nós que devemos de dar a primeira resposta e deslocar a linha da frente de cada um nesse sentido.

Tive um choque térmico de consciência que foi muito rápido e eficaz, sorte, porque se não o tivesse tido muito provavelmente teríamos continuado neste ringue de luta de egos durante mais tempo e o resultado não ia ser bonito. Com isto é importante reforçar que sim, foi um erro, um daqueles que mexeu com os nossos valores internos e com o qual aprendemos rapidamente e que me leva à questão central desta conversa: não é suposto ensinarmos as organizações a pescar? É! E é de uma forma muito séria! Andamos há umas valentes dezenas de anos a lutar por um modelo profissional dentro do associativismo e agora que precisamos desse modelo sólido e robusto o que é que acontece? Uma valente luta de egos. Este momento atirou-nos novamente para o assistencialismo, para a dependência que vai criar vícios difíceis de reverter e este é um grande dilema ético, principalmente quando é urgente agir. Agimos de imediato e oferecemos tudo o que temos e podemos ou primeiro capacitamos, educamos e depois implementamos? Isto é responsabilidade de todos, de todos aqueles que têm capacidade e consciência para assumir a preparação das organizações, sejam projectos de empreendedorismo social, associações juvenis e estudantis, organizações não-governamentais, IPSS e todos os conjuntos de pessoas da sociedade civil que trabalhem para o impacto social e comunitário.

A preparação para uma situação destas, a aquisição de competências como a criatividade e o poder da comunicação são responsabilidade de quem ensina e de quem ensina a quem ensina, para garantir que a visão dos velhotes fica toda no Restelo e que agora que isto está a acontecer temos líderes confiantes para os próximos passos de reinvenção, que é necessária só não precisa de entrar neste jogo do ego.

Esta realidade veio para ficar e nunca na história uma crise nos deu tanto tempo e ferramentas para nos prepararmos da melhor forma para o que vai ser o futuro, cabe-nos a nós unir esforços, partilhar boas práticas, comunicar a uma só voz, sem vícios e entregar o maior valor possível aos nossos.

*Inês Franco Alexandre escreve segundo o antigo acordo ortográfico