Steve Bannon era o director do site de direita Breitbart News quando, em Agosto de 2016, entrou para a campanha presidencial de Trump. Rapidamente ganhou grande preponderância no círculo mais fechado do futuro Presidente, que o nomeou logo que foi eleito para um cargo especialmente criado, o de “Chief Strategist”. Pouco depois colocou-o no Conselho de Defesa Nacional (NSC), o órgão máximo de segurança, a que tradicionalmente só pertencem os chefes dos diversos serviços de segurança do país.
A presença de Bannon no NSC causou tal mau estar que só durou de Janeiro a Abril de 2017. Entre 20 de Janeiro e 18 de Agosto do ano passado, Bannon teve acesso directo e privado a Trump e é considerado o responsável, até mesmo autor, de algumas decisões mais polémicas do Presidente, como o impedimento de entrar nos Estados Unidos para nacionais de sete países muçulmanos.
Já em Fevereiro, a revista “Time” chamava-lhe “o grande manipulador” e os órgãos de comunicação social e a televisão encontravam constantemente sinais de que Bannon tinha um enorme poder na Casa Branca. Em retribuição, o estratega chefe disse a uma revista: “A comunicação social devia sentir-se envergonhada e humilhada, calar a boca e limitar-se a ouvir durante algum tempo. Aqui (no país) a comunicação social é o partido da oposição.” Esta tese, aliás, é uma das que o Presidente ainda defende constantemente.
Dizer que Bannon é de direita não o define exactamente. Ele próprio classifica a sua linha de pensamento como “alt-right” (diminuitivo de direita alternativa) e é uma mistura de nacionalismo, racismo e anti-globalismo. O Breitbart News, de onde veio e para onde voltou quando saiu da Casa Branca, difunde uma filosofia muito sui generis, em que o mundo é uma arena, os Estados Unidos devem lutar sozinhos pelos seus interesses, os tratados de livre comércio em geral e com a China e México em particular são ruinosos para o país, o aquecimento global é uma invenção, os ricos devem pagar menos impostos para incentivar a economia, os imigrantes são todos perigosos, e muitas outras ideias que por vezes parecem tiradas da Idade Média (a luta entre o Ocidente cristão e branco e o Oriente pagão e de pele escura). Em boa parte coincidem com as ideias de Trump, ou inspiraram-no em áreas onde ele não tinha opiniões definidas.
Tudo isto sobre Bannon, para dar uma ideia do terramoto que consistiu a afirmação que o ex-estrategista fez de que Trump não só sabia dos contactos da sua equipa com russos, como o próprio se encontrou com eles.
A situação é o seguinte: o jornalista Michael Wolff, um profissional de idoneidade incontestada, escreveu um livro que sairá ainda este mês, “Fire and Fury”, sobre o funcionamento da Casa Branca nos primeiros nove meses de 2017. Partes desse livro, que relatam conversas entre Wolff e Bannon, foram reveladas pelo jornal inglês The Guardian e caíram como uma bomba nuclear. Bannon confirma que ocorreram citações de traição (uma palavra muito forte, que mesmo os inimigos do actual governo têm evitado usar) envolvendo Donald Trump Jr. (filho), Jared Kushner (cunhado) e Paul Manafort (gestor de campanha de Trump já indiciado pelo Procurador Especial Robert Mueller). Atira-se em particular ao casal Kushner/Ivanka Trump, a quem acusa de terem tido um projecto de fazer de Ivanka presidente. E diz que Donal Trump Jr. vai “partir-se como um ovo” quando os resultados das investigações de Mueller forem conhecidos.
Usando uma linguagem por vezes vulgar, Bannon não poupa ninguém, comparando a atitude da Casa Branca de desvalorizar as suspeitas que crescem sobre o “conluio” entre a campanha de Trump e os russos ao mesmo que “estarem todos sentados na praia a ver chegar um ciclone de grau 5”.
Há dezenas de outras afirmações graves ou inconvenientes, como a de que Robert Murdoch considera Trump “um idiota” por causa da proibição dos imigrantes.
A bomba do The Guardian explodiu na quarta-feira, dia 3 de Janeiro, e no mesmo dia Trump reagiu, num dos seus famigerados tweets, afirmando que Bannon nunca foi íntimo nem se reunia com ele – o que é contrariado pela mais crua realidade. Conclui que Bannon ao “perder o lugar também perdeu o juízo”. Nenhuma argumentação lógica ou concreta, como seria de esperar. A Casa Branca, através da porta-voz, Sarah Huckabee Sanders, insistiu na pouca importância do ex-assessor.
Há outras revelações chocantes no livro de Wolff (que sai no dia 9 de Janeiro), mas as mais perigosas para Trump já são públicas. E, aparentemente, a Casa Branca não estava à espera desta explosão, não recolheu aos abrigos, e ainda não sabe o que fazer. Os próximos dias podem ser impressionantes, embora não se espere, pelo menos a curto prazo, que o Partido Republicano abandone completamente o Presidente; continua a precisar dele para avançar a sua agenda no Congresso. Mas parece cada vez mais provável que Donald Trump não chegará ao fim do mandato.
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