É sempre assim. Quando um país não cumpre as suas obrigações, aquelas a que se comprometeu livremente, começa a arranjar bodes expiatórios, culpados, a apontar o dedo a terceiros. Na história da Europa comunitária, são tantos os casos que já se perderam na memória do tempo. Mais recentemente, na zona euro, sempre que um país entrou em risco de falência e em incumprimento, pediu ajuda externa, financiamento e, claro, com isso, chegou um plano de ajustamento difícil para as populações desses países. É neste contexto que surge a ideia de ‘invasão estrangeira’, desrespeito pelos cidadãos que elegem os governos, tecnocracia, ataques à ausência de soberania.
O equilíbrio entre os governos em funções, os eleitores e os financiadores é sempre difícil, muitas vezes no fio da navalha. E no caso de uma Europa política que tem tantas fragilidades, e muito a fazer se quiser sobreviver ao seu próprio sucesso, ainda mais. É por isso que é fácil misturar, deliberadamente, e de forma populista, os problemas graves de construção de um projeto europeu com ataques às soberanias dos Estados. Há erros da tecnocracia europeia na gestão das crises, sim, sobretudo lentidão nas respostas, sobretudo quando se percebe que é necessário corrigir decisões. Mas há responsabilidades enormes dos Estados, de cada um, considerado individualmente. Veja-se o caso da Grécia: falhou do ponto de vista económico, após sucessivos pacotes de ajuda internacional de centenas de milhar de milhões de euros. À crise económica, juntou-se a crise dos refugiados, que atinge a Grécia mais do que qualquer outro país do euro. E, aqui, os nacionalismos, os excessos de soberania estão a sobrepor-se aos interesses comunitários, aos interesses comuns para manter o passo de um projeto comum, o do euro. A tempestade perfeita.
Portugal – como os outros países – beneficiou durante anos de pertencer a um projeto comum, a viver debaixo do guarda-chuva europeu e das suas instituições. Claro, como os alunos ‘espertos’, aproveitou todas as boleias, mas pouco fez para saber andar sozinho. E de crise em crise, Portugal foi vivendo, e corrigindo os seus desequilíbrios à força, sobretudo o da balança externa.
Sim, sabemos o que se passou no passado, especialmente desde o ano de 1995, com a chegada dos governos de Guterres, da austeridade necessária para voltar a cumprir as regras, dos erros cometidos no programa da troika. E o que teríamos de passar se não estivéssemos no euro? A albanização do país. Sabemos disso tudo, António Costa também. E o primeiro-ministro sabe qual é o enquadramento e as metas financeiras a atingir. Mesmo assim, apresenta um orçamento que não cumpre esses objetivos e, depois, claro, o que está em causa é a soberania. Não é. Há muito a fazer na União Europeia, sim, mas haverá sempre mais se os governos responsabilizarem a Europa por aquilo de que ela não é responsável.
Ninguém na Europa impede António Costa de fazer escolhas, de puxar mais pelo consumo ou pelas exportações, pelo corte de despesa ou aumento de receita. Costa tem de cumprir uma redução do défice global e do défice estrutural, corrigido dos efeitos de medidas temporárias e do ciclo económico. O que faz? Apresenta um orçamento com pressupostos que tornam difícil cumprir a redução do défice global para 2,6% e ‘inventa’ uma contabilização de medidas estruturais como se fossem extraordinárias que permitiria reduzir o défice estrutural em 0,2%. A Comissão Europeia torce o nariz – o menos mau do que pode fazer já esta semana - e o que se discute não é o orçamento, mas a ingerência externa nas decisões do Governo, a soberania. E, ao mesmo tempo, ouvem-se as vozes de Catarina Martins e de Jerónimo de Sousa a brandir a bandeira nacional contra os invasores. Está certo!
António Costa, como Tsipras, sabe que a partilha de soberania no quadro europeu é melhor, mais vantajosa, do que a independência. Ainda, pelo menos. Podemos sempre abrir essa discussão, talvez fosse a melhor forma de acabar de vez com a estratégia fácil de resolvermos os nossos problemas com a falta de soberania.
As escolhas
O setor financeiro tem sido notícia, e não pelas melhores razões. Hoje ao fim da tarde, o presidente do Millennium bcp vai apresentar os resultados de 2015 e, segundo todas as indicações, apresentará lucros pela primeira vez em cinco anos.
E a partir de hoje, o NIB morreu, viva o IBAN, na verdade, é o NIB precedido de um código do país. É o international bank account number (IBAN).
Finalmente, Zika, o maldito. Afinal, onde nasceu este vírus, transmitido por mosquitos? No SAPO24, conheça a história do Zika, um nome de floresta. Uma viagem às origens do vírus, no Uganda.
Boa semana.
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