Até se poderá esperar – será demasiado otimismo? - que o combate se desloque de algumas das guerrilhas internas para uma sintonizada mobilização ampla (designadamente, Presidente e Governo) para enfrentar o choque com os credores externos nas negociações para a suavização necessária das condições para atenuar o défice e pagar o resgate. Seguramente precisamos todos de uma frente interna coesa e robusta para enfrentar o duelo com os que acham que é com austeridade que o problema português se resolve.

E há que tentar em conta que, a partir de Madrid, o PP de Rajoy, por interesses da sua sobrevivência política, está a fazer tudo para desacreditar na Europa a prática do pacto das esquerdas em Portugal. O Presidente Marcelo tenderá a ajudar o governo a explicar à governação europeia das direitas que o modelo receitado a Portugal nos últimos quatro anos não serve.

Marcelo-candidato mostrou-se na campanha a antítese de Cavaco Silva. Mostrou todos os dias que vai ser um presidente de afectos. Ainda está para se ver como vai o sagaz Presidente intervir, ao longo de todo o mandato, no dia a dia político. Está anunciado que o Conselho de Estado vai ser revitalizado. Seria bonito se o Presidente que no discurso de vitória quis frisar que “é o povo quem mais ordena” escolhesse para dois dos cinco conselheiros que lhe cabe indicar personalidades como Sampaio da Nóvoa e Marisa Matias, que representam um terço da preferência dos eleitores. Ficariam bem num Conselho de Estado que também vai ter a sabedoria de Adriano Moreira e a experiência de Domingos Abrantes, para quem as paredes do PCP sempre terão sido mesmo de vidro. Seria tentador furar o sigilo e poder seguir as discussões num Conselho de Estado assim.

O ciclo político com três eleições (europeias, legislativas, presidenciais) em menos de dois anos está fechado. O início deste novo ciclo talvez traga alguma rearrumação na paisagem partidária portuguesa neste ano de congressos. Será que o PS vai querer optar por um claro posicionamento de centro esquerda com entendimentos preferenciais à esquerda (a escolha que Costa fez em outubro foi de convicção ou circunstancial, de conveniência?) ou vai continuar a deixar pairar a ambiguidade que não ajuda a encher um espaço? Será que o CDS, com Assunção Cristas, vai deixar de ser PP e retomar algo da matriz democrata-cristã? Será que o PSD vai recentrar-se, mesmo que continue longe da identidade que tem no nome? Será que o PCP vai continuar a pensar que é pela via do compromisso que melhor influencia as decisões para o seu interesse e para a governação do país? O BE, como vai evoluir com a base consolidada de 10% do eleitorado? O palco político pode trazer debates interessantes.

TAMBÉM A TER EM CONTA:

Na noite de 25 para 26 de janeiro de 2011, a revolução com rótulo de “Primavera Árabe” eclodia também no Egipto. Foram 18 dias em que os egípcios tomaram em mãos o seu país e que levaram à queda de Mubarak, o presidente que estava há 30 anos no poder. Passados cinco anos, a ilusão está perdida, muitos dos revolucionários de 2011 fazem parte da enorme lista de presos políticos e o autoritarismo volta a impor-se.

Ainda só passou mês e meio sobre o fecho, por entre otimismos, da conferência sobre o clima, em Paris. Nesses dias falou-se imenso do planeta, depois voltou a negligência. Agora, aí está um conveniente alerta.

O Irão está de volta à Europa. Bem-vindo! O presidente iraniano iniciou em Roma uma ronda por capitais europeias. Mas alguém decidiu que para não ofender a sensibilidade iraniana havia que tapar as esculturas de corpos nus nos museus do Capitólio. Que vergonhosa censura de obras de arte.

Duas primeiras páginas escolhidas hoje no SAPO JORNAIS: esta, que confronta o ainda Presidente com a realidade e que nos conta o essencial da manhã, e esta, com a proclamação oficiosa angolana da “amizade e cooperação” com Portugal.