Eles dizem (digo “eles”, porque efectivamente são todos eles…) que “os portugueses foram claros em manifestar” isto ou aquilo, uma clara maioria, ou uma maioria escura (talvez apenas menos clara…), um voto de confiança ou um voto de desconfiança, e parece que o resultado final saiu de uma magna reunião de eleitores.
Não consigo vislumbrar onde raio foram buscar esta ideia. Uma coisa é a democracia ter, entre outras formas de manifestação, o voto que elege ou destitui aqueles que nos governam - outra, bem diferente, é procurar tirar ilações de votos que, somados, dão ou retiram maiorias, mas que evidentemente resultam de escolhas absolutamente divergentes. E individuais.
Domingo passado, houve muitos eleitores no PS que votaram apenas contra o PSD/CDS; como houve votos convictos de militantes e simpatizantes; como houve votos úteis de uma esquerda que nunca se une. Da mesma forma, houve votos na coligação que defenderam simplesmente a continuidade; outros terão resultado da convicção e da militância. Houve votos em branco porque sim, ou porque não. Houve votos no Bloco contra a CDU, ou contra o PS.
O que não houve, de certeza, foi essa ideia peregrina dos “portugueses” como um todo. Os “portugueses” não reúnem nem conspiram - vivem como podem, fogem ao fisco como podem, defendem-se como podem, e votam (ou não…) em função de argumentos tão diferentes quanto a militância, a paixão, o desdém, a vingança, a esperança, e sei lá mais quantos valores e princípios e conceitos (até mesmo preconceitos…) que lhes passam pela cabeça.
Nos últimos meses, o meu sentido de voto mudou três vezes. Foi influenciado por sondagens, discursos, tiros nos pés e até mesmo pelo voto que o meu filho me anunciou previamente. De uma coisa estou certo: não me sinto parte dos “portugueses” que deram um voto de confiança, mas não absoluta; ou contra a austeridade, mas repartido pelas diferentes oposições.
O voto foi individual, particular, único. Cada um por si. Esta mania de interpretar colectivamente o que é individual constitui um dos mais irritantes defeitos da análise política. É fácil e simplista, aceito. Mas não deixa de ser absurda. Não apenas por ser uma ideia falsa - mas por presumir, uma vez mais, que vivemos em rebanho e assim andamos, ao Deus dará, atrás deste ou daquele. Lembra-me um homem de bigode que andou por aí nos anos 40 do século passado a dar cabo da vida de milhões de pessoas - e nem que fosse apenas por isso, não gosto nem quero.
Domingo passado foi assim: um voto, uma pessoa, uma intenção. E deu no que deu. Agora é ver no que vai dar. E aguentar.
Coisas que me deixaram a pensar esta semana…
Há dez anos, a Moda Lisboa - este fim de semana, ali pela baixa lisboeta - parava a cidade. Era o acontecimento. Era o momento. Hoje, é apenas uma entre mil iniciativas e eventos que animam a capital. Por um lado, tenho pena que já não seja tão mobilizadora quanto foi - por outro, é um dos muitos sinais da dinâmica da capital. E isso é uma excelente noticia.
Há anos que sigo os irmãos Manuel e Francisco Aires Mateus. Tenho até a sorte de mergulhar na mesma praia onde eles descansam no Verão… Esta semana, a dupla venceu o concurso internacional para criar dois museus - o Museu da Fotografia de Elysée e o Museu de Design e Arte Contemporânea (Mudac) - em Lausanne, na Suíça. Venceram face a nomes inconformáveis da arquitectura. Que orgulho….
Mariza volta aos discos com “Mundo”, um disco surpreendente: produzido por Javier Limón, que já produzira "Terra", inclui temas de Jorge Fernando e Rui Veloso, entre muitos outros. É a minha escolha da semana. Mas mais do que isso, poder vê-la e ouvi-la ao vivo, em espectáculo aberto a todos, no próximo sábado, dia 10, em pleno Chiado, na escadaria dos armazéns, é uma ideia notável para lançar o disco. Não falto!
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