Uma vez começada a exploração da Terra, no século XIV, nunca mais parou até que não houvesse um território localizado, visitado e mapeado. Primeiro foram os portugueses, depois os espanhóis, a seguir os ingleses – países e indivíduos empenharam-se num esforço contínuo, que os levou aos dois polos, ao pico mais alto do planeta e a profundidades abissais. Mas a exploração para fora da Terra não seguiu o mesmo padrão; houve uma fase inicial, promissora, que começa com o primeiro satélite artificial, em 1957 e termina em 1969 com a chegada de astronautas à Lua. Depois desses anos, por razões de que iremos falar, mas que causarão perplexidade no futuro, a exploração espacial ficou reduzida à colocação de satélites à volta do planeta. Enviaram-se algumas sondas com objectivos mais distantes, como o Sol e outros planetas do sistema solar, mas nada que se possa considerar uma exploração contínua e constante.
Numa atitude típica da espécie humana, a exploração espacial começou como uma competição entre adversários e não com a colaboração de amigos. Tal como a guerra clássica, que incentiva invenções e descobertas, a Guerra Fria levou um aceleraramento ousado e arriscado das tecnologias necessárias para levar equipamentos, e finalmente o homem, até à Lua, em 1969. A União Soviética, que obtivera o primeiro sucesso com o lançamento de Sputnik, em 1957, acabou ultrapassada pelos Estados Unidos e, perdido o prémio técnico e propagandístico de ser a primeira na Lua, concentrou-se em si própria, numa autocrítica que levou à mudança tempestuosa do seu regime político regime, em 1991. Por sua vez, os Estados Unidos, ganha a competição, não viram necessidade de prosseguir na exploração do satélite e desviaram as verbas da NASA para outros objectivos mais prementes, em particular a Guerra do Vietname, até 1975, além de outras guerras em que estão permanentemente envolvidos.
Assim, com as despesas bélicas e problemas políticos concentrados na superfície terrestre, o avanço lunar não teve seguimento.
Até no simples lançamento de satélites os Estados Unidos perderam capacidades. Desde o fim da Guerra Fria que os satélites americanos são lançados por foguetões russos, na base de Baikonur, enquanto os europeus, numa escala mais reduzida, usam a base de Kourou, na Guiana Francesa.
Foram essas necessidades funcionais e o desinteresse dos governos que levou a uma nova atitude, a competição entre empresas privadas (ou parcerias publico-privadas) com um interesse comercial, mal disfarçado como proeza científica. São os casos da Virgin Galactic e da SpaceX.
Por outro lado, países que na época da primeira exploração espacial ainda não tinham meios para entrar na corrida, entretanto cresceram e também querem competir no Espaço. A China, evidentemente, mas também a Índia e a Arábia Saudita, estranhamente. A China, porque para se afirmar como uma potência mundial de primeira grandeza, que já é, precisa também de mostrar capacidades inter-planetárias. A Índia é um caso de dislexia patriótica; um país com centenas de milhões de miseráveis, mal alimentados e sem condições sanitárias, investe quantias imensas num projecto cujo objectivo se perde nos objectivos. A Arábia Saudita, um reino medieval com um desenvolvimento social e ético que lembram eras tribais, vai para o espaço porque pode; tem mais dinheiro do que consegue gastar em construções babilónicas erigidas por escravos, e quer saltar para um futuro ainda mais distante do seu presente.
A Spacex acaba de atingir um marco importante, quando a sua cápsula Dragon levou dois astronautas para a Estação Espacial Internacional e trouxe-os de volta para a Terra. Não só é a primeira vez que uma empresa privada comete esta proeza como também - e isto é importante – a nave que a lançou, o Spacex Starship, assim como a cápsula Dragon, são reutilizáveis. O projecto teve como cliente a NASA, que assim volta ao espaço 45 anos depois, inaugurando também um modelo de negócio em que a agência pública contrata privados.
A Virgin Galactic tem como primeiro objectivo fazer turismo espacial – ou seja levar passageiros pagadores a passear à volta da Terra em naves lançadas a partir dum avião especial. Em 2019 levou o seu primeiro cliente. Contudo, as dificuldades comerciais da empresa mãe, a companhia área Virgin, seriamente afectada pela pandemia, deverá atrasar o projecto.
Estes programas privados ainda não têm a Lua como objectivo próximo, mas representam uma possibilidade de tornar as viagens orbitais mais frequentes, o primeiro passo para ir mais além. Elon Musk, o dono da SpaceX, não esconde que o seu objectivo é chegar a Marte.
Quanto à Arábia Saudita, está a começar agora, e começa com o que tem: muito dinheiro. Usará tecnologia de onde puder comprar; Rússia, Estados Unidos e França estão interessados em vender.
A Índia está com problemas por causa da pandemia, mas, mais ano menos ano, também começará a desenvolver um programa para chegar a Marte. Gente para colonizar o planeta é o que não lhe falta, sobretudo se lhes der as mesmas condições de conforto que lhes dá na Terra...
A China é outra história. Agora já tem a tecnologia, os recursos e a vontade de ter um lugar de destaque na exploração espacial. Não tem o apoio de outros países, mas também não precisa. Já colocou uma sonda em solo lunar e em Março lançou outra destinada a chegar ao Planeta Vermelho. (Para um apanhado de informações sobre o programa chinês, ver aqui.)
É bem indicador dos objectivos que interessam à Humanidade, que actualmente consome mais recursos naturais do que a Terra pode fornecer, o facto de a Lua já não parecer tão interessante. É que a Lua não tem recursos que possam ser explorados, para sobreviver ou para lucrar.
Então, parece que Lua já não interessa – a não ser como possível base intermediária – e agora, 50 anos depois, o Homem quer chegar a Marte. Sonhar é fácil, mas se não se sonhar, nunca se realiza o sonho.
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