Vamos falar de violência sexual contra crianças? É um tabu. São vários os mitos e as ideias feitas e, por isso mesmo, o livro de Ângelo Fernandes, intitulado De que falamos quando falamos de violência sexual contra crianças – guia de prevenção com orientações para mães, pais e pessoas cuidadoras (edição Pergaminho) deveria ser uma leitura obrigatória.
Em Portugal, advogamos esta ideia de que longe da vista, longe do coração e ninguém quer debater seriamente sobre a complexidade da violência sexual contra crianças, os efeitos, os traumas, o silêncio. É um assunto que incomoda, ficamos indignados com a notícia que surge, mas depressa escolhemos não ver. Pior ainda, muitas famílias estão convencidas de que possuem um nível de comunicação com os seus filhos de tal forma excepcional, que é evidente que saberiam, as crianças diriam alguma coisa. Não é assim que acontece, as crianças calam-se. Por razões várias. Este livro que, repito, deveria ser de leitura obrigatória, faz um retrato da realidade, desconstrói estereótipos e orienta as famílias e cuidadores para uma atenção maior a certos aspectos da vida e do comportamento dos mais novos. Os mais novos, as crianças, são uma fórmula curta para a vastidão de comportamentos, e de desenvolvimento emocional, que definem cada etapa do seu crescimento. Uma criança de quatro anos, vítima de abuso, não sente nem integra o acontecimento como um adolescente. Não se trata de ser pior ou melhor, trata-se de ser diferente.
O Conselho Europeu indica que uma em cada cinco crianças é, foi ou será vítima de violência sexual durante a infância. Ângelo Fernandes, que é também o fundador da Quebrar o Silêncio, a primeira associação portuguesa de apoio a homens e rapazes vítimas e sobreviventes de violência sexual, escreve neste livro: “A violência sexual afecta um em cada seis homens e uma em cada três mulheres, e é importante que se saiba que a responsabilidade do abuso não é sua, independentemente das circunstâncias e de outros aspectos relativos à sua história de abuso”. Calar este tema é viver fechado numa redoma. É ignorar que as crianças têm direito a ser protegidas e que muitas vivem com uma falsa sensação de segurança. Leiam o livro de Ângelo Fernandes, partilhem-no.
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