Esta é uma história com final feliz, mas que começou com um “não”. Alexandre Vaz, atualmente Managing Director da Mercedes Benz.io Portugal, hub de inovação digital da multinacional alemã, começou por "namorar" a marca das estrelas de três pontas com o intuito de “vender uma startup de marketing digital” da qual era CEO.
“Tive uma conversa com o responsável de marketing digital a nível mundial. Esteve comigo há dois anos na Web Summit e disse-me que queria abrir um hub fora da Alemanha para o desenvolvimento digital”, recorda. “Falhei totalmente porque não consegui vender a minha empresa (Liquid Data Intelligence)”, assume.
Não vendeu, mas não falhou. “Sem estar à espera, fui surpreendido e, um tempo depois, convidaram-me para abrir o hub. Não podia abrir mão de um desafio destes”, diz, sorridente, Alexandre Vaz, formado em Engenharia e Gestão Industrial pelo Instituto Superior Técnico e com um MBA da Universidade Nova de Lisboa.
Estávamos em maio de 2017 e estava dado o segundo passo da Mercedes (e da Daimler) em Portugal, escolhendo Lisboa como centro digital da marca. Antes, em julho de 2016 já tinha instalado o centro de serviços Network Assistance Center, que, a partir de Portugal, dá apoio técnico e nos processos de pós-venda à rede de oficinas da marca automóvel na Europa.
A “Autoeuropa do digital” assim apelidada na altura pelo então secretário de Estado da Indústria, João Vasconcelos, foi criada “para internalizar os conhecimentos técnicos digitais da empresa que estavam a ser desenvolvidos por empresas externas”, num primeiro momento, a que se seguiu a construção das “plataformas de estruturas digitais futuras”, vincou o responsável máximo da Mercedes Benz.io Portugal, nova designação do hub.
Construindo “tudo o que é a plataforma de marketing e vendas da Mercedes”, diz que o hub atua em duas áreas a que correspondem dois projetos: “Temos o website – OneWeb – que está presente em mais de 100 países (onde está a Mercedes), mas que na verdade é uma plataforma que tem lá dentro diferentes produtos, como sejam a marcação de test drive, procura de carros novos ou usados” da marca alemã, assinalou. “Todos os países têm bases de dados diferentfes e o desafio é uniformizar tudo e construir a plataforma de futuro”, conta. A segunda aérea está assente na “plataforma de e-commerce, venda de carros online novos e usados e peças”, continuou.
Dos carros das três estrelas, aos smart, passando pelos táxis e carros partilhados
Relembrando que “hoje em dia ninguém pode ser conservador num mercado que está a mudar tão rapidamente”, avisou que “uma Mercedes ou uma Daimler, é muito mais do que as pessoas pensam”. E nesse muito mais entra a “Smart, a My Taxi (plataforma de táxis) e a Car2Go (car sharing), sendo que esta última irá fazer uma fusão com a Drive Now (car sharing da BMW)”, fusão que recebeu, no passado dia 8, luz verde da Comissão Europeia (Direção-Geral da Concorrência) para a consolidação dos serviços de mobilidade, onde se inclui os carros partilhados.
“Mais que um fabricante de automóveis premium, a Mercedes-Benz e a Daimler vão transformar-se num prestador de serviços de mobilidade premium. Ir de A a B de Mercedes, Smart, táxi ou com car sharing, sempre no mesmo segmento”, diz Alexandre Vaz, resumindo assim a ambição da empresa.
“Por agora, a Mercedes-Benz. io está mais focada nos carros da marca Mercedes e a tentar construir esta primeira camada”, disse. Depois, com um futuro cada vez mais digital, dará seguimento à estratégia C.A.S.E.: “Connected”, “Autonomous”, “Shared & Services” e “Electric Drive”, antecipando uma mudança com os carros elétricos e autónomos. Em relação aos serviços que podem prestar, “o céu é o limite”, seja em “trabalho ou entretenimento”, explicou, adiantando que a criação de aplicações ligadas aos automóveis da marca alemã e o desenvolvimento de tecnologias para a condução autónoma servem de exemplos de tarefas realizadas a partir de Lisboa para o mundo.
Um táxi dos anos 60 como centro de emprego
Atualmente a empresa emprega "cerca de 65 pessoas” e deverá fechar o ano com “90” e atingir, em 2019, “as 140”, estima Alexandre Vaz numa conversa que decorreu dentro de um Mercedes dos anos 60 vestido de táxi, automóvel como dono português e que serviu de centro de recrutamento durante a Web Summit 2018. “80 % dos programadores são portugueses, mas queremos os melhores programadores, venham de onde vierem”, assegurou. Durante três minutos, contabilizados por um taxímetro, todo e qualquer interessado à procura de emprego tinha a oportunidade, em plena feira de tecnologia, de explicar ao recrutador as razões pelas quais deveria ser escolhido.
Mas os “recrutas” não têm só saída com os carros. Também os camiões alemães entraram recentemente em Lisboa com a Tech & Data Hub, sendo a terceira lança da multinacional alemã em Portugal. “É uma empresa separada que fará o mesmo que fazemos”, explicou Alexandre Vaz, acrescentando que esta irá apostar na inovação e serviços digitais no setor dos veículos comerciais, de camiões e autocarros, com a qual “teremos uma colaboração estreita”, garantiu.
No Beato entre o centro de Lisboa e o aeroporto com vista para o mundo
Temporariamente localizados no Second Home no Cais do Sodré, em Lisboa, a Mercedes-Benz.io vai funcionar, a partir de meados de 2019, no hub Criativo do Beato, polo criativo da cidade, criado pelo Município de Lisboa e pela Startup Lisboa, e um dos maiores campus para startups e empresas tecnológicas da Europa. Será uma das primeiras ocupantes do espaço da antiga manutenção militar com o Factory Lisbon a ocupar os edifícios da fábrica de massas e da bolacha daquela infraestrutura. “Ficaremos a curta distância do centro de Lisboa e perto do aeroporto, num espaço que não estava explorado”, regozijou.
O tempo da conversa com Alexandre Vaz foi muito além dos três minutos. Tempo suficiente para um último comentário sobre o Mercedes que serviu e continuará a servir de sala de recrutamento. Estávamos a falar de tecnologia e mundo digital, mas olhando para o clássico à nossa frente foi lapidar. “Este carro dos anos 60, têm que ficar como está, os carros têm as suas eras e era crime mexer”, sorri, deixando uma nota final de “lamento” por ter vendido o “Mercedes de 1979” de que foi proprietário.
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