O setor dos eventos, representado por mais de 26 milhões de profissionais em todo o mundo, está a enfrentar fortes dificuldades. Com as restrições impostas pelos governos em prol da saúde pública e a incerteza perante um futuro, tanto no curto como no longo prazo, muitos organizadores de eventos não tiveram outra opção senão cancelar, adiar ou transformar os eventos presenciais em experiências digitais.
Muitos responsáveis por empresas de eventos terão a difícil tarefa de explorar novas vias de receita para complementar as tradicionais. Em primeiro lugar, têm de lidar com a fase em que nos encontramos, na qual ainda existem sérias preocupações com a propagação do vírus. Depois, devem antecipar uma mudança nas necessidades dos indivíduos quando as restrições forem gradualmente levantadas. Não esquecendo que a realização de eventos num mundo pós-COVID-19 exigirá grandes ajustes relacionados com o saneamento, desinfeção, análise térmica e distanciamento social.
Com milhões de pessoas em quarentena um pouco por todo o mundo e crescentes preocupações com o distanciamento social, a solução mais viável para evitar o cancelamento de eventos e minimizar as perdas advindas desta decisão é realizá-los através de plataformas digitais. Esta tendência já está a ser amplamente adotada por empresas de todos os setores e os seguintes dados comprovam-no. De acordo com a Eventbrite, os eventos online focados em negócios aumentaram 1,100% em abril deste ano. Também a ferramenta de transmissão de vídeo Socialive viu as suas receitas crescer 146% em março.
Com tantos eventos a cair no esquecimento tão rápido quanto a propagação do vírus, muitos organizadores uniram esforços para proporcionar experiências online que dupliquem a realidade. A Rockwell Automation, uma empresa de soluções de automação industrial, lançou uma série de eventos gratuitos online chamados VirtualConnect. Estes eventos espelham ao máximo as características de uma feira física. O visitante clica no local onde quer ir e é imediatamente transportado para lá, quer seja o salão principal, a sala com stands para exposição de produtos e serviços ou a sala dedicada a palestras online e conversas informais com os outros participantes.
Também a Collision, uma grande conferência tecnológica no Canadá criada pela mesma equipa do Web Summit, optou por um formato online para substituir o evento presencial. Agora com o nome de Collision from Home, o evento dará a oportunidade aos participantes de assistir a conversas ao vivo de CEOs de empresas tecnológicas, formuladores de políticas internacionais e figuras culturais globais. Podem também conversar e conectar-se com algumas das empresas e startups mais influentes do mundo através da aplicação com o mesmo nome, Collision from Home. Nesta conferência, 59 startups portuguesas, no âmbito do programa Road to Web Summit da Startup Portugal, irão tirar o máximo partido do evento no conforto das suas casas.
Reforçando a ideia de que os eventos online poderão ser uma tendência no futuro, nos últimos meses, os gigantes tecnológicos têm andado ocupados com investimentos em startups na indústria dos eventos online. A Apple comprou a NextVR, uma startup especializada em experiências de realidade virtual, como transmissão de concertos e eventos desportivos. Identicamente, Paddy Cosgrave, co-fundador da Web Summit, investiu numa startup especializada em conferências remotas, a Hopin, através de um fundo pertencente à empresa. Segundo Paddy, as conferências online são uma tendência que vai chegar a todo o lado durante 2020.
Estará a resposta numa solução híbrida?
Embora os eventos virtuais não consigam ter o mesmo impacto que um evento presencial, um modelo híbrido poderá oferecer uma ótima solução num mundo pós-COVID-19. Os eventos híbridos poderão realizar o evento principal num local, mas terão também os chamados “eventos de satélite” noutros locais, evitando que milhares de pessoas se aglomerem no mesmo espaço.
Assim, à medida que as pessoas se reúnem para eventos presenciais, as empresas devem concentrar-se em fornecer um hub (dispositivo eletrónico que conecta vários computadores numa rede) de eventos virtuais para os participantes digitais. Da mesma forma que os organizadores têm uma equipa de produção para os eventos presenciais, é provável que venham a ter uma equipa de produção focada apenas na experiência virtual dos participantes. Antes da COVID-19, não eram muitos os eventos que incluíam gamificação (uso de mecânicas de jogos para enriquecer contextos que normalmente não estão relacionados com eles), chat bots (programas de computador simulam conversas com utilizadores), chat rooms (serviços online que fornecem um local para os utilizadores comunicarem em tempo real), transmissão de vídeo online, realidade virtual e inteligência artificial. Contudo, tudo indica para que esta seja a norma no futuro.
A tecnologia, para além de oferecer uma experiência totalmente diferente, poderá oferecer vantagens relacionadas com a promoção de interações digitais, poupança nos custos de organização, resolução de questões de logística dos eventos e preservação do meio ambiente. Também pode ajudar os responsáveis dos eventos a alcançar um público-alvo global que, antes da COVID-19, implicava custos de viagem significativos. Para além disso, poderá democratizar o acesso a eventos que, presencialmente, seriam caros mas, ao migrarem para o digital, apresentarão custos mais baixos. É o caso da Apple WWDC que, ao optar por um formato online, está a oferecer entradas grátis para developers.
Espera-se que, ainda a partir de 2021, o foco continue a estar nas tarefas necessárias para tornar o evento físico num sucesso, mas também nas precauções a tomar, caso o mesmo tenha de ser cancelado. Os contratos serão reforçados e os termos de cancelamento serão redefinidos com cuidado. Os fornecedores provavelmente tentarão proteger-se da perda de receita, enquanto os organizadores de eventos tentarão garantir que terão um seguro que cubra os custos de um evento que pode não acontecer.
A COVID-19 demonstrou o quão importante é para as empresas focadas na organização de eventos estarem preparadas para qualquer obstáculo que possa surgir. Uma pandemia desta dimensão parecia um cenário demasiado improvável para acontecer há não muito tempo atrás. Assim, a criação de alternativas para se protegerem caso um evento tenha de ser cancelado e de uma infra-estrutura digital será essencial para qualquer empresa ou país permanecer competitivo no mundo pós-COVID-19.
Estarão as estratégias futuras para este setor totalmente dependentes da digitalização? Tudo indica para que sim, mas só tempo o dirá.
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