Chama-se “Space Exploration Technologies Corp”, mas no mercado é mais conhecida por SpaceX, assim como por pertencer ao empresário Elon Musk. Ultimamente voltou a estar nas bocas do mundo porque esta quarta-feira, às 16h32 (hora local, Flórida, EUA, menos cinco do que em Portugal continental), vai testar o primeiro voo orbital tripulado privado, o primeiro que não é executado por um organismo governamental norte-americano.
Se for bem-sucedida, a SpaceX vai marcar a história da exploração espacial para sempre. Passemos aos porquês.
Esta empresa aerospacial sediada em Hawthorne, na Califórnia, foi fundada em 2002 com o objetivo de reduzir os custos do transporte espacial e, tal como Elon Musk tem defendido, servir para abrir a porta para uma eventual colonização de Marte.
A SpaceX tem-se notabilizado nos últimos anos pelo desenvolvimento dos foguetões classe Falcon, que ao contrário dos anteriormente utilizados pela NASA são reutilizáveis, e pela “nave espacial” Dragon, um módulo tripulável que tem servido para abastecimento da Estação Espacial Internacional e para entrega de carga útil na órbita terrestre, como lançamentos de cubesats. Embora a “Crew Dragon” ainda não tenha levado, até ao momento, humanos ao Espaço, já fez o trajeto, “sozinha”, comandada remotamente a partir de uma base terrestre.
Para se perceber o que vai acontecer hoje, se as condições atmosféricas o permitirem), é preciso enquadrar sucessos da SpaceX no curto espaço de tempo em que os alcançou, até porque estão presentemente a mudar a história da Humanidade.
1 -Foi a primeira empresa privada a financiar e construir um foguetão lançador de combustível líquido (marco esse que atingiu em 2008), com o lançamento do Falcon 1. Este foguetão foi desenvolvido no período entre 2006-2009, como um teste estrutural para modelos futuros, sendo que ainda são utilizados esses princípios no atual Falcon 9;
2 - Foi também a primeira empresa com financiamento privado a lançar, orbitar e recuperar uma nave espacial (a cápsula Dragon em 2010);
3 - A SpaceX foi também a primeira empresa privada a enviar uma nave espacial para a Estação Espacial Internacional (EEI) (novamente a Dragon em 2012);
4 -A SpaceX fez o primeiro pouso propulsivo de um foguete orbital (Falcon 9 em 2015);
5 - A empresa aerospacial de Musk fez também a primeira reutilização de um foguetão orbital (Falcon 9 em 2017).
Logo em 2017, a SpaceX ganhou dez missões de abastecimento da Estação Espacial Internacional. Agora, quer fazer algo para o qual se está a preparar desde 2011: levar os primeiros humanos para o Espaço. Algo que, conseguido por uma empresa privada, representa um marco na História da Humanidade.
O administrador da NASA, Jim Bridenstine, explicou que a NASA é um cliente da SpaceX, e que em breve os clientes desta empresa privada serão outros, de todos os cantos do planeta. O voo da SpaceX, caso corra bem, será um marco na democratização do Espaço, e levará rapidamente à criação de cadeias económicas para exploração de recursos espaciais, nomeadamente na Lua após o lançamento do Programa Artemis de que já falámos aqui.
Um sucesso de Elon Musk ou da NASA?
Segundo a NASA, existem 60% de hipóteses de o lançamento se realizar neste dia. Realizando-se tal como esperado, será uma vitória de Elon Musk, da NASA ou dos dois?
Antes de tudo, este lançamento é um teste. É importante sublinhá-lo porque na última década será a primeira vez que astronautas serão lançados para o Espaço a partir de solo americano (normalmente costumam apanhar “boleia” das naves russas Soyuz lançadas a partir do Cazaquistão, no cosmódromo russo de Baikonur). E a 80 milhões a “corrida” do táxi espacial, a NASA tinha mais tarde ou mais cedo que se apoiar numa solução americana privada.
É um teste também porque é a primeira vez que uma empresa privada levará humanos ao Espaço, e a SpaceX é a “equipa da casa” da NASA. Acresce ao exposto que a própria segurança dos astronautas americanos da NASA estava em risco. A 11 de Outubro de 2019 três astronautas americanos tiveram que fazer uma aterragem de emergência depois de um foguetão russo ter tido uma avaria em pleno ar.
E continuamos com os testes: a atual administração da NASA lançou o Programa de Tripulação Comercial da NASA que se vem juntar ao Commercial Lunar Payloads (Programa de entrega de carga útil na Lua). Estes dois programas são a espinha-dorsal para que o Programa Artemis (iniciar a construção de uma base lunar em 2024), resulte. E quem tiver a preponderância na Lua, terá a preponderância no Espaço. Não é em vão que estamos a assistir a uma autêntica corrida à Lua nos últimos três anos.
Ora a NASA criou estes dois instrumentos, os programas, para se poder apoiar também nos privados que estão a desenvolver a sua atividade na área aerospacial.
A NASA tem de facto estado completamente no controlo das operações desde o início: por exemplo os astronautas veteranos Bob Behnken e Doug Hurley, foram treinados pela NASA e designados para esta missão também pela agência norte-americana.
Dentro do campo dos testes, este voo não é uma experiência. A SpaceX passou os últimos seis anos a aprimorar a Crew Dragon (a “nave” espacial) que levará a tripulação. Ainda no ano passado foi realizado um “ensaio completo” até à Estação Espacial Internacional, numa viagem, felizmente, não tripulada em que se somaram alguns contratempos. É mérito de Elon Musk e da sua equipa terem conseguido ultrapassar esses obstáculos, tendo (tal como se espera) desenvolvido um veículo seguro que acabe com a dependência dos lançamentos russos. Porque a verdade é essa: desde oito de julho de 2011 (data do último voo do Space Shuttle da NASA), que no Espaço para missões tripuladas, os EUA apanham boleia dos russos.
Por isso, o financiamento privado, não é completamente “privado”: a NASA pagou 3,14 mil milhões à SpaceX para esta desenvolver a “nave” Crew Dragon. Mas aqui volta a ser mérito de Musk, porque a Boeing também foi apoiada em 4,8 mil milhões para desenvolver a nave da concorrência, a CST-100 Starliner, e não será a Boeing a ficar na História, por aquilo que, à data, é possível antever.
Se tudo correr bem, o Falcon 9 lançará o módulo Crew Dragon em órbita baixa da Terra 12 minutos após a descolagem. A “nave” Crew Dragon orbitará então a Terra durante 19 horas e é suposto os astronautas eventualmente dormirem e irem à “casa de banho”. O Crew Dragon foi desenvolvido para ter uma participação mínima da tripulação na sua pilotagem.
O momento alto é contudo quando se der o “docking” ou encaixe automático da Crew Dragon na EEI – Estação Espacial Internacional. Isto porque anteriormente durante as missões de carga da SpaceX, a cápsula Dragon tinha de ser agarrada pelo braço robótica da ISS (sigla inglesa para a Estação Espacial Internacional), uma vez que as anteriores versões não estavam otimizadas para fazerem uma acoplagem autónoma.
Portanto, há uma boa maneira de avaliar o sucesso ou insucesso desta missão: se os astronautas Behnken e Hurley se conseguirem juntar ao astronauta da NASA Chris Cassidy e aos cosmonautas russos Anatoly Ivanishin e Ivan Vagner na ISS, via a escotilha da Crew Dragon, ficamos a saber que se iniciou uma nova e importante etapa na história dos EUA no Espaço. Desde que se recupere o estágio de lançamento e a própria Crew Dragon, claro.
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