Intitulada "Phantom Blot Back to Attack" [Mancha Negra Volta a Atacar], a exposição parte de um grafito da frase datado dos anos 1970-80 e que ainda visível numa parede de um edifício em Venda Nova, perto da Amadora, um subúrbio de Lisboa.
Mancha Negra, ou, na tradução para inglês, Phantom Blot, é também o nome do personagem de banda desenhada de Walt Disney, rival de Mickey Mouse e o maior criminoso de Patopólis, tendo como característica deixar uma mancha negra nos locais por onde passa.
O sinal de passagem é como um "tag ou grafito", que o programador, o português, João Laia, entende que pode ser interpretado tanto em termos figurativos, como "o que a mancha negra significa em termos narrativos", como materiais, já que "todos os desenhos de banda desenhada são, no limite, manchas negras de tinta sobre fundos brancos de papel".
É nesta tradução do inglês para o português, de Phantom Blot para Mancha Negra e vice-versa, que Laia considera existir "uma mutação de significados decisiva" e que lhe interessou desenvolver para este projeto.
"Passa-se de mancha negra para mancha fantasma e de mancha fantasma para mancha negra, criando estranhas relações entre solidez e vaporosidade que serão trabalhadas na exposição, através do uso justaposto de materiais como ar e plástico ou conceitos como cheio e vazio, entre outros recursos ambivalentes", refere o programador.
A exposição vai consistir de uma instalação sonora, que será gravada durante uma performance da dupla no dia da inauguração, de um conjunto de imagens com colagens e jogos de palavras, e de uma peça intitulada Mancha Negra e que é construída unindo sacos de plástico do lixo de cor preta.
Usando uma máquina, o adereço, que foi feito à medida da sala, é lentamente enchido com ar e depois esvaziado, num ciclo contínuo que dura vinte minutos, descreve João Laia.
"Aquilo vai enchendo, enchendo, enchendo, enchendo até que ocupa o espaço todo e as pessoas, das duas uma: ou fogem ou ficam presas dentro do espaço da galeria porque já não podem sair sem destruírem o objeto", diz.
Ativos desde 2006, os Von Calhau! possuem um trabalho fértil e variado de colaboração nas áreas da música e das artes visuais, com se reflete em concertos e performances, na edição de discos, na realização de filmes e vídeos, na produção de desenhos e obra gráfica e em publicações.
"Com recurso a esses diferentes meios, e explorando constantemente a miscigenação de referências e elementos das mais diferentes extrações, os Von Calhau! têm vindo a construir um imaginário e uma cosmogonia muito próprios, esotéricos e sincréticos, a partir dos quais interrogam a nossa condição no mundo, ao mesmo tempo que averiguam o sentido da colaboração inerente a tudo aquilo que fazem", resume João Laia.
A exposição, inédita e a primeira individual da dupla no estrangeiro, teve o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, do Instituto Camões e da Embaixada de Portugal no Reino Unido e fica até 10 de fevereiro na galeria independente Kunstraum.
Atualmente a frequentar um programa de doutoramento na universidade Bikbeck, em Londres, João Laia é um programador independente que tem estado envolvido na organização de exposições não só em Portugal, mas também Espanha, Suíça, Brasil e Reino Unido.
É curador da Opening, a seção da feira de arte ARCO Lisboa, e membro das equipes curatoriais da exposição inaugural do MAAT em Lisboa (2015-17), além de colaborar com publicações como frieze, Spike Art Quarterly, Flash Art, Terremoto ou Público.
"A minha última exposição individual com artistas portugueses foi em 2013, então da Mariana Silva, que dois anos mais tarde venceu o prémio EDP. Tenho bastante cuidado para não ficar como o programador que só mostra artistas portugueses", adiantou à Lusa.
No caso dos Von Calhau!, defende que "precisam de ser mostrados fora de Portugal porque têm trabalho excêntrico. Já estiveram em Itália e Brasil, mas mesmo em Portugal só tiveram uma exposição institucional. São únicos".
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