Em declarações à Lusa, dias depois do anúncio das nomeações para a edição deste ano dos prémios da academia norte-americana de cinema, para os quais o também lusodescendente canadiano Luís Sequeira está nomeado (na categoria de melhor guarda-roupa, pelo mesmo filme), Nelson Ferreira disse ter a esperança de que a nomeação abra portas a nível internacional para que possa trabalhar na Europa.
“Gostaria que este filme mostrasse o que nós conseguimos fazer em termos criativos, e gostaria que me permitisse a oportunidade de trabalhar em projetos mais criativos e mais entusiasmantes. Devo também dizer que adoraria que me abrisse portas a nível internacional. Adorava fazer um filme em Portugal. Ou Nova Iorque. Mas, para mim, ter a oportunidade de trabalhar na Europa, onde o meu coração está, seria enorme”, disse Nelson Ferreira, em entrevista telefónica a partir de Toronto.
Nascido em 1965, no Canadá, filho de pais portugueses da zona da Mealhada, Nelson Ferreira estudou Belas Artes antes de entrar para a Escola de Cinema de Londres, de onde regressou ao Canadá em 1987.
“Comecei na edição de imagem e fui caminhando em direção à edição sonora quase por acaso. Havia mais oportunidades, mais trabalho e encarei-a como trabalho mais entusiasmante e criativo”, explicou o profissional, que trabalhou como editor de som em “A vida não é um sonho” (“Requiem for a dream”, no título original), de Darren Aronofsky, filme que representou um momento de viragem na carreira.
Nesse momento, Nelson Ferreira e os colegas perceberam “mesmo enquanto estava a acontecer”, que era uma oportunidade para se elevarem a outro nível, em termos criativos e ganhar mais credibilidade, passando de filmes de ação com baixos orçamentos para produções com maiores exigências criativas.
Vários projetos se seguiram desde então, incluindo a primeira temporada da série televisiva “The Strain”, de Guillermo Del Toro, com quem voltou a trabalhar em “A forma da água”, pelo qual está nomeado com Nathan Robitaille.
Sobre a nomeação em si, Nelson Ferreira diz que cada dia que passa apresenta um novo despertar de algo de que não se tinha apercebido.
“Aos meus olhos já ganhámos. Sei que é um cliché, mas sentes-te mesmo assim. Admiro os outros nomeados e nem consigo acreditar que o meu nome está lá com eles. Ser mencionado na mesma frase que eles é uma enorme vitória para mim. A ideia de vencer é um conceito abstrato sobre o qual não vou pensar, até ao dia 04 de março”, afirmou.
“A forma da água” lidera as nomeações da 90.ª edição dos Óscares, que serão entregues a 04 de março, em Los Angeles.
Enquanto adversários na categoria de melhor montagem de som, Nelson Ferreira e Nathan Robitaille têm vários profissionais nomeados para Óscar no passado, como é o caso de Ren Klyce (nomeado agora por “Guerra das Estrelas: Os Últimos Jedi”, mas já com sete nomeações no currículo) ou até de vencedores anteriores, como é Mark Mangini, cinco vezes nomeado, distinguido em 2016 por “Mad Max: Estrada da Fúria”.
Perseguir o sonho
Em entrevista por telefone a partir de Toronto, onde fundou a empresa Sound Dogs na década de 1990, Nelson Ferreira, disse que, como parte do processo de nomeação, a Academia norte-americana de cinema enviou um questionário com várias perguntas aos selecionados.
Entre questões como “qual o seu filme favorito?” ou “onde estava quando soube que tinha sido nomeado?” estava “o que diria a alguém que não acredita que os seus sonhos se podem tornar realidade?”.
“Cala-te e toca a trabalhar. Tens de acreditar e começar a trabalhar. Não tens nada a perder ao tentar ser o que pensas que não podes ser. Esta manhã acordei a sentir-me como se estivesse a viver a vida de outra pessoa. E depois percebi que era eu. É um sentimento especial. Então, eu encorajaria todos, e falo especificamente para os jovens portugueses, para que façam o mesmo. O medo é uma prisão”, afirmou Nelson Ferreira.
“Gostava que todos os filmes em que venha a trabalhar fossem nomeados para um prémio. Mesmo estando assim tão entusiasmado, sempre senti – e talvez seja o ‘feitio português’ – que independentemente de quão bem-sucedida esteja a ser a minha carreira, este vai ser o meu último trabalho e ninguém me vai querer contratar novamente”, disse Nelson Ferreira, passando do inglês, com que cresceu no Canadá, para o português que se falava em casa para dizer “feitio português”.
Enquanto editor de som, a função de Nelson Ferreira é “criar uma experiência sonora imersiva, para que o público se coloque na narrativa e melhor desenvolver o drama da história”, nas palavras do próprio.
No caso de “A forma da água”, Ferreira e o parceiro Nathan Robitaille contribuíram para criar uma personagem do nada, dando-lhe uma voz, onde antes só existia “um homem num fato de borracha”.
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