“Passa-Montanhas”, a ser editado na sexta-feira, é o primeiro gravado pelos Linda Martini desde a saída de Pedro Geraldes e a consequente entrada de Rui Carvalho (Filho da Mãe).

A mudança de um dos elementos poderia significar um corte com o passado, mas não foi o caso.

“Não é um disco de rutura total, mas também não foi por vontade nossa, de não querer fazer coisas diferentes. Nós queremos sempre. A questão é que já há uma identidade tão vincada, que o natural para o Rui foi ele tentar encontrar um espaço e perceber como todos funcionamos juntos”, contou o vocalista do grupo, André Henriques, em entrevista à agência Lusa.

Embora não seja um álbum conceptual, há um assunto que atravessa “Passa-Montanhas”: “A ideia de conversar melhor”.

Entre composição e gravação, os quatro passaram “tanto tempo à volta das canções, como de pratos e comida”, com muita conversa pelo meio.

“Foi um disco em que nos fechámos muito sobre nós. Tinha de ser assim, também para tentarmos encontrar esse espaço de diálogo. E acho que isso se nota”, disse André Henriques.

Ao mesmo tempo, como tiveram bastante tempo em conjunto para refletir, “muitos temas que vinham para cima da mesa — sobre a atualidade, seja ela social ou política — acabam depois também por transpirar para o disco”.

“Ao mesmo tempo que é um disco virado para dentro e para nós, que foi assim que ele precisou de ser para crescer, reflete também muito aquilo que foi este nosso momento e o que se passa à nossa volta”, reforçou.

Pedro Geraldes deixou a banda em fevereiro de 2022, pouco antes da edição de “Êrror”. Nessa altura foi substituído por Rui Carvalho, inicialmente tendo em conta apenas a digressão de apresentação do álbum.

“Assim que tivemos um tempo para compor, conseguimos logo perceber que existia uma química, que já tinha sido começada quando ele entrou na banda. Tivemos muito tempo de estrada, muitas conversas para estreitarmos essa ligação e aprendermos, ou reaprendermos, a fazer música entre os quatro”, partilhou André Henriques.

O processo de composição de “Passa-Montanhas” começou, à semelhança de álbuns anteriores, com uma residência, forma que os músicos arranjaram de fugir ao dia-a-dia, aos compromissos fora do contexto da banda.

Durante quase uma semana, ficaram “quase num ‘tanque criativo'”, no Espaço Serra, em Leiria.

“Foi a primeira residência que fizemos em que não levávamos praticamente nada de casa. Normalmente nas outras tínhamos sempre uma mão cheia de ideias que íamos desenvolver. Aqui foi uma tábua rasa e tentar perceber o que é que ia surgir dali”, recordou.

O processo de gravação acabou por acontecer também em ‘isolamento’, na Catalunha, Espanha, com o produtor Santi Garcia, com quem já tinham trabalhado.

O estúdio de gravação situa-se entre duas montanhas, num cenário idílico, e ali passaram vários dias.

Entre as dez canções que compõem “Passa-Montanhas” há algumas “muito pessoais”, que abordam “assuntos particulares que não são decifráveis para quem está de fora”, “mas outras sobre assuntos extra pessoais, mais sociais”.

“Olhamos à volta e percebemos que as pessoas perderam a habilidade de conversar, de perceber pontos de vista diferentes, e acho que isso está presente nas canções também. De facto, as pessoas precisam de aprender a conversar melhor”, defendeu o músico.

No disco há menções a Chico Buarque, José Afonso e José Mário Branco, referências musicais “de sempre” dos elementos da banda, que podem não ser óbvias quando se pensa no som que fazem, que “cai no caldeirão do rock”.

“Nascemos todos nos anos 80 e faz parte da nossa geração. Crescemos com essa discografia herdada dos nossos pais: Chico Buarque, Caetano Veloso, Milton Nascimento, outros nomes da música brasileira, e os chamados cantores da revolução, Zeca Afonso, Zé Mário Branco, Sérgio Godinho”, afirmou.

Estes e outros nomes estão presentes desde sempre na ideia e imagem de canção que os quatro têm. “As pessoas com quem aprendemos a musicar a língua, a perceber que música é que o português tinha são esses nomes. Isso deixa algumas marcas”, disse.

“Passa-Montanhas”, a ser editado em CD e vinil, é apresentado ao vivo em 31 de janeiro em Lisboa, no LAV-Lisboa ao Vivo, e em 1 de fevereiro, no Porto, no Hard Club.

* Joana Ramos Simões, da agência Lusa *