"A questão essencial é cumprirmos a lei, sempre o fizemos, sempre o faremos, agimos sempre na defesa dos interesses legítimos da empresa. Sempre no sítio certo, no local certo, no momento certo", declarou António Mexia, quando questionado pela Lusa sobre a EDP ter imputado ilegalmente aos consumidores de eletricidade custos da tarifa social desde 2015, que deviam ter sido assumidos integralmente pela empresa.
O presidente executivo da EDP reafirmou ainda que "a questão da legislação em Portugal ou em qualquer outro país é a estabilidade das regras de jogo".
"O que se está a discutir tem que ser falado no sítio certo e no momento certo. A EDP fará sempre isso, como sempre fez. No sítio certo e no momento certo", acrescentou o gestor.
O Governo está convicto de que a EDP e a Endesa imputaram ilegalmente aos consumidores de eletricidade custos da tarifa social desde 2015, que deviam ser as próprias a assumir, uma vez que beneficiaram de um diploma que o permitia fazer.
O executivo socialista publicou em 24 de agosto passado um diploma, em Diário da República, que revoga um despacho assinado em 03 de outubro de 2015, véspera de eleições legislativas, pelo então secretário de Estado da Energia Artur Trindade (governo PSD-CDS/PP).
Agora, o atual secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches, explicou a nulidade parcial do despacho por considerar que "contraria frontalmente as normas legais que determinam que os custos com as tarifas sociais [...] sejam suportados pelos produtores, proibindo a sua repercussão, direta ou indireta, nas tarifas de uso das redes de transporte, de distribuição ou de outros ativos regulados de energia elétrica".
O governante disse ainda que foi questionada a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) sobre o despacho de Artur Trindade - que quando saiu do governo de Passos Coelho regressou à ERSE como diretor-geral - e concluiu que "o regulador não contém qualquer justificação que permita afastar a ilegalidade detetada".
"Na verdade, a determinação por ato administrativo da repercussão nas tarifas de eletricidade dos custos suportados pelos produtores [...] constitui a criação de uma nova contribuição pecuniária para os consumidores", considerou Seguro Sanches, no diploma publicado em Diário da República.
Atualmente, a tarifa social da eletricidade - um desconto que as empresas são obrigadas a dar aos consumidores economicamente vulneráveis, suportando esse encargo -, beneficia cerca de 800 mil famílias, sendo a esmagadora maioria clientes da EDP, por ser a empresa líder do mercado elétrico.
No mesmo documento, o governante reafirma a intenção de declarar a nulidade do ponto do despacho de Artur Trindade relativo à tarifa social (ponto 12) e à CESE - Contribuição Especial sobre o Setor Energético (ponto 11) e solicita à ERSE que calcule os montantes indevidamente pagos pelos consumidores para serem devolvidos.
A intenção do Governo é fazer refletir estes montantes nas tarifas da eletricidade do próximo ano, que serão propostas em meados de outubro, sendo que, de acordo com o jornal Público, está em causa um valor global de 100 milhões de euros.
Questionada recentemente pela Lusa sobre quem tem vindo a suportar a tarifa social, a ERSE, que regula o mercado energético, considerou "não ser oportuno pronunciar-se sobre a questão", porque "está a decorrer uma audiência prévia para os interessados se pronunciarem sobre o despacho do senhor secretário de Estado da Energia", isto é, os produtores (a EDP e a espanhola Endesa).
No relatório de contas do grupo liderado por António Mexia, relativo a 2016, lê-se que "este apoio social [tarifa social] permite um desconto superior a 30% na fatura de energia, que é suportado maioritariamente pela EDP".
O presidente da Endesa Portugal, que também é produtora de eletricidade em Portugal, garantiu que a empresa "em todos os aspetos cumpre a lei", sem comentar o diploma revogado, mas criticando o "caráter retroativo" do despacho de revogação.
"Num Estado de Direito, da União Europeia, não há nada que justifique o caráter retroativo", afirmou recentemente à Lusa Nuno Ribeiro da Silva, adiantando que a empresa foi notificada e está a elaborar a resposta ao Governo.
Já o antigo secretário de Estado da Energia Artur Trindade também não quis comentar o conteúdo do diploma nem as suas implicações, por estar a decorrer o prazo para as empresas se pronunciarem.
Artur Trindade é atualmente vice-presidente do OMIP, o polo português do mercado ibérico grossista de eletricidade.
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