Este requerimento, assinado pela dirigente e deputada do Bloco de Esquerda Mariana Mortágua, pede que António Mendonça Mendes seja ouvido na Comissão parlamentar de Orçamento e Finanças e surge em consequência da análise da Comissão Europeia ao funcionamento da Zona Franca da Madeira.
A Zona Franca da Madeira encontrava-se sob um processo de investigação aprofundada desde 2018 e a Comissão Europeia concluiu esta semana que a aplicação do regime de auxílios “não está em conformidade” com as decisões da Bruxelas em matéria de auxílios estatais, “determinando, em conformidade, a recuperação dos montantes dos benefícios indevidamente atribuídos”.
Nesse sentido, na sua iniciativa legislativa, Marina Mortágua considera que “importa estabelecer as formas e os critérios de devolução dos benefícios fiscais indevidos”.
Por outro lado, a dirigente do Bloco de Esquerda, salienta que a decisão da Comissão Europeia “põe em causa a capacidade da Autoridade Tributária e, sobretudo, da Autoridade Tributária da Região Autónoma da Madeira, para exercerem as suas atividades de fiscalização da aplicação do regime existente” nesta zona franca.
“Há muito que o Bloco de Esquerda critica os sucessivos regimes aplicáveis à Zona Franca da Madeira. Nas suas versões iniciais, este regime consagrava o estabelecimento de um verdadeiro ‘offshore’, onde empresas e os seus sócios não residentes beneficiavam tanto de isenções totais de impostos como de facilidades nas suas obrigações declarativas e de transparência”, refere.
Depois, segundo Mariana Mortágua, esse regime foi revisto, “tendo os seus benefícios, nomeadamente fiscais, sido marginalmente limitados e condicionados a critérios de criação de emprego e criação de riqueza da Madeira”.
No entanto, assinala Mariana Mortágua, “as evidências de que estes critérios não estavam a ser cumpridos era óbvia e inegável”.
“Ao longo dos anos, apesar das sucessivas operações de legitimação, a Zona Franca da Madeira continuou a ser utilizada para esquemas de planeamento fiscal agressivo e complexos circuitos financeiros potencialmente destinados ao branqueamento de capitais. As regras criadas foram contornadas, nomeadamente através da criação de postos de trabalho fictícios ou partilhados entre entidades aí estabelecidas, sob o olhar complacente da Autoridade Tributária da Região Autónoma da Madeira”, acusa a deputada do Bloco de Esquerda.
Ora, de acordo com Marina Mortágua, a Comissão Europeia veio agora “concluir precisamente o que já então era denunciado”, nomeadamente no que respeita “ao número de postos de trabalho tidos em conta por Portugal para o cálculo do montante do auxílio”.
“Além disso, os postos de trabalho a tempo parcial foram incluídos nos postos de trabalho a tempo integral e os membros do conselho de administração foram contados como trabalhadores em mais do que uma empresa beneficiária do regime, sem haver recurso a um método de cálculo adequado e objetivo”, aponta, citando as conclusões transmitidas por Bruxelas.
Por outro lado, ainda citando a Comissão Europeia, nesta zona franca, “os lucros que beneficiaram da redução fiscal não se limitavam aos lucros relacionados com atividades efetiva e materialmente realizadas na Madeira”.
O vice-presidente do governo madeirense considerou hoje que a decisão da Comissão Europeia sobre irregularidades nas ajudas à Zona Franca é “uma não notícia” e uma “coincidência brutal” com a visita da candidata presidencial Ana Gomes à região.
“Acho que acabou por ser uma não notícia o que acabou por sair na sexta-feira da União Europeia”, declarou Pedro Calado aos jornalistas à margem da visita que efetuou às obras nas três ribeiras do Funchal afetadas pelo temporal de 20 de fevereiro de 2010.
A Comissão Europeia concluiu na sexta-feira que o regime III da Zona Franca da Madeira (ZFM), que vigorou até 31 de dezembro de 2014, desrespeitou as regras de ajudas estatais, pois abrangeu empresas que não contribuíram para o desenvolvimento da região, pelo que Portugal deve recuperar agora todos as "ajudas indevidas, mais juros".
A investigação foi lançada em 2018 e apurou que "a implementação do Regime III da Zona Franca da Madeira em Portugal não está em linha com as decisões de ajudas de Estado da Comissão", sublinhando que "as reduções fiscais foram aplicadas a empresas que não representaram qualquer valor acrescentado para o desenvolvimento da região".
Por isso, no entender do governante madeirense, esta decisão “foi um reavivar de um processo que já vem desde 2017, 2018 e 2019”, relembrando que “em 2019, foi pedida muita informação a todas as empresas que a estão operar no Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM)”.
Para o governante insular, “a questão que está aqui é interpretativa, sobre saber se os postos de trabalho devem ser considerados apenas na Madeira ou se as empresas sedeadas na região podem ter postos de trabalho em todo o mundo”.
Pedro Calado argumentou que o CINM foi criado “para atrair empresas internacionais, para terem atividade na Madeira e há muitas empresas que estão espalhadas por todo o mundo”.
“Os trabalhadores que estão espalhados por todo o mundo fazem as suas retenções de IRS (Imposto Sobre Rendimento de Pessoas Singulares na Madeira, pagam impostos aqui [na região] e as empresas também”, vincou
Pedro Calado assegurou que “tudo isso foi explicado à Comissão Europeia e está em fase de averiguação”.
“Agora achamos uma coincidência brutal ter saído essa notícia ontem [sexta-feira], precisamente na véspera da chegada de uma senhora que foi aquela que mais mal fez ao CINM, que mente descaradamente sobre o CINM”, afirmou aludindo à visita da candidata presidencial Ana Gomes este fim de semana à Madeira.
O vice-presidente reforçou que a candidata “tem tempo para vir fazer campanha eleitoral à Madeira e não tem tempo sequer para visitar o CINM, nunca manifestou interesse em visitar o centro”.
Pedro Calado defendeu que Ana Gomes devia “ao menos” visitar o CINM e de “viva voz apercebe-se das vantagens” que as 2.300 empresas representam para a Madeira, 6.000 postos de trabalho e 100 milhões de euros de receitas fiscais.
“Portanto, quem tem o desplante de vir à Madeira falar mal sobre o CINM, não devia sequer ser bem recebida e aqueles que a recebem bem deviam ter vergonha pelo mal que essa senhora faz aqui à região, sobretudo no prejudicar as nossas receitas fiscais”, sustentou.
O governante admite que “nesta análise possam sempre haver empresas que não respeitaram os limites dos postos de trabalho e dos benefícios fiscais que atingiram” e “se isso acontecer, as empresas que prevaricaram devem ser multadas”.
Contudo, destacou que esta situação “também é prova de que o CINM é das entidades mais fiscalizadas e mais regulamentadas de todas as praças financeiras conhecidas”.
“Aliás, para quem dizia que a Madeira era um paraíso fiscal esta é uma prova de que não é. É um centro que é auditado, é acompanhado pela União Europeia, pela Unidade de Grandes Contribuintes da Autoridade Tributária no continente, onde há fiscalizações, há acompanhamento e as empresas são auditadas e fiscalizadas convenientemente”, concluiu.
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