Parece que foi há uma eternidade - mas foi "apenas" há exatamente seis meses. A 10 de abril, Portugal registou um total de 1.516 novas infeções e, até hoje, 10 de outubro, esse tinha sido o dia com maior números de novos casos confirmados de pessoas com covid-19. Os dados divulgados hoje pelo boletim epidemiológico da Direção-Geral da Saúde (DGS) elevaram a fasquia para um novo patamar: 1.646 novos casos confirmados nas últimas 24 horas.
Os dados de hoje confirmam uma tendência registada ao longo da semana. Esta quinta e sexta-feira já tinham sido, respetivamente, o quarto e o terceiro pior dias desde que os primeiros casos em Portugal foram registados, em março.
Os números absolutos são de grandeza semelhante, mas, todavia, a realidade com que convivemos com a doença é hoje diferente. Talvez precisamente por causa da dimensão desses números absolutos. Façamos um exercício de memória que esta rubrica diária do SAPO24 ajuda:
O que nos diziam os números a 10 de abril de 2020 quando comparados com os de hoje, 10 de outubro?
- Havia 15.472 mil casos confirmados de infeção - hoje registam-se 85.574 casos de infeção, dos quais 30.704 ativos
- O número de mortes por covid-19 era de 26 - que compara com as 5 mortes registadas nas últimas 24 horas
- Estavam internadas 1.179 pessoas - número que compara com as 831 de hoje
- Entre as pessoas internadas, 226 estavam nos cuidados intensivos - hoje esse número é de 122
- A 10 de abril a capacidade de testagem era limitada - esta semana, segundo informação prestada pela ministra da Saúde, em março realizavam-se 2500 testes por dia, em outubro esse número passou para 19.600
- No que respeita a surtos, a 10 de abril o concelho com medidas mais severas era Ovar, então com cerca sanitária - segundo os últimos dados da DGS (que remetem para dia 9), Portugal tinha 381 surtos, dos quais 19 ativos
- Ao nível mundial, a 10 de abril, o número de mortes por covid-19 passava a barreira dos 100 mil no mundo inteiro com mais de 1,6 milhões de pessoas diagnosticadas - a 10 de outubro há mais de um milhão e sessenta e três mil mortes registadas e mais de 36,5 milhões de casos de infeção em todo o mundo,
O que nos diz a comparação destas duas realidades à luz dos indicadores existentes? Diz-nos sobretudo que as preocupações são de outra ordem. É difícil qualificar se são melhores ou piores, mais fáceis ou mais difíceis, o que temos a certeza é que são diferentes.
Vale por isso a pena ler o que o que pensam dois nomes que nos habituámos a ouvir desde o início da pandemia.
Sobre a causa das coisas, diz-nos o virologista Pedro Simas: “A causa deste aumento é devida ao aumento do movimento das pessoas, o retorno à vida ativa, agora pode estar potenciado pela não adesão às regras ou não, e é isso que temos de aferir e é aí que temos de fazer o nosso melhor”. E deixa o alerta: mais que nunca, está nas mãos de todos cumprir as normas de segurança sanitária que previnem o contágio e que são a melhor arma para impedir uma situação que, caso contrário, pode tornar-se "muito complicada daqui a duas semanas".
Sobre a consequência das coisas, diz Ricardo Mexia, presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública: "A resposta do SNS não é ilimitada e, portanto, tem um limite” (...) a “este ritmo talvez seja difícil para o SNS conseguir dar os cuidados necessários a todos os que deles necessitam”. Um alerta que faz com que não coloque de parte uma nova situação de confinamento: “Eu julgo que essa é uma medida que nenhum de nós deseja nem desejava, mas (…), se nós não tivermos de facto uma resposta” através do “reforço dos meios humanos, materiais, para conseguir interromper cadeias de transmissão, se as diversas atividades económicas não fizerem o que lhes compete em termos de adaptação e minimização do risco e se o Governo não tiver os meios para alocar aos serviços para que eles possam dar uma resposta adequada” e se os cidadãos não fizerem a sua parte no cumprimento das recomendações, será “difícil” poder “encontrar outra solução”.
Hoje, 10 de outubro, não podemos dizer que não sabemos. O que fazemos com isso ditará, provavelmente, a sorte dos próximos meses.
P.S. - Há precisamente seis meses, no dia 10 de abril, Boris Johnson, de 55 anos, diagnosticado com covid-19 a 27 de março, mantinha-se internado em recuperação. Seis meses depois, uma semana após o mesmo diagnóstico, Donald Trump, de 74 anos, sente-se "melhor do que nunca" e já regressou aos eventos públicos.
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