À entrada do Stop, no “viveiro da música”, como muitos o apelidam, reina por estes dias o silêncio. São poucos os que se juntam, por esta hora, no Telhadinho, bar do qual Rui Santos é proprietário há 16 anos.
Ponto de encontro dos que coabitam no Stop, pelo Telhadinho já passaram mais de 15.000 artistas e bandas nacionais e internacionais, mas por estes dias poucos passam.
A dois dias de ter de sair daquele centro comercial do Porto, Rui Santos não retirou nada do bar, nem das outras três lojas de que é arrendatário no Stop, e não tenciona fazê-lo.
“Se isto fechar na sexta-feira vou ter de vir tirar as minhas coisas depois, porque as coisas são minhas. O meu senhorio não me disse nada, não sei se tenho de fechar ou não”, disse à Lusa o lojista que frequenta o espaço há mais de 40 anos.
"Isto é uma luta contra quem pode menos. É uma luta desigual", defendeu, acrescentando que dezenas de bandas e artistas já começaram a retirar os equipamentos e materiais dos estúdios e salas de ensaio "por medo de ficar sem o material".
A poucos metros do Telhadinho, Raquel Teixeira vai arrastando sacos pretos, carregados de roupa, para o interior da loja que arrenda há três anos.
"Ainda tenho de trabalhar", disse a lojista, arrendatária de outro espaço no Stop.
Na pequena loja, os cabides continuam com as peças de vestuário penduradas e nos sacos pretos chegam novas roupas para vender. Desde que a indecisão do encerramento pairou sobre o Stop, Raquel Teixeira deixou de comprar como antes.
"É muito complicado. Não consigo dormir", confessou, dizendo ainda nada saber ou ter sido contactada pelo proprietário.
Pelos corredores do Stop ouvem-se, à passagem pelos estúdios de música, alguns acordes e batidas, mas ainda assim reina maioritariamente o silêncio.
"Foi desolador ver os corredores dos três pisos completamente cheios de equipamento e o pessoal a retirar os instrumentos", confessou à Lusa o artista, que assina as suas obras com os nomes Avelino e Guilherme Barros.
Na Oficina de Repressão de Letras, que Guilherme Barros ocupa há 10 anos, estão guardadas 52 telas a óleo de diferentes tamanhos e formas, nas quais imortaliza em palavras pessoas e lugares. A que imortaliza a sua mãe têm três por dois metros.
"Tudo o que está aqui é demasiado delicado para sair. O que tenho aqui são peças únicas", disse, admitindo não saber o que fazer perante a imposição de sair do espaço.
"Não quero sair daqui, mas se tiver de sair, saio. Não consigo fazer frente, mas até dia 22 [sexta-feira] é impossível tirar o material", acrescentou.
Na quarta-feira, Guilherme precisou de quatro horas para conseguir proteger com arames uma das maiores telas do espaço. Ainda falta embrulhá-la em papel para, se necessário, a remover do ateliê. Às telas juntam-se ainda os inúmeros cadernos que retratam e contam a história e o processo criativo de cada peça.
E é precisamente uma das telas de Guilherme que retrata o sentimento daqueles que, a dois dias do encerramento, não desarmam: "Só Deus me vai tomar. Até lá vou trabalhar".
O Stop, que funciona há mais de 20 anos como espaço cultural, com salas de ensaio e estúdios, viu a maioria das suas frações serem seladas em 18 de julho, deixando quase 500 artistas e lojistas sem terem para onde ir, mas reabriu em 04 de agosto, com um carro de bombeiros à porta.
Depois de receber o relatório da inspeção extraordinária realizada pela Autoridade Nacional da Proteção Civil (ANEPC), os serviços da Câmara do Porto defenderam o encerramento do centro comercial e o intento de uma providência cautelar contra a ANEPC e o Ministério da Administração Interna.
Os proprietários e arrendatários do Stop foram notificados em 08 de setembro pelos serviços da autarquia de que tinham 10 dias úteis para desocupar o edifício, mais concretamente até sexta-feira, dia para o qual foi já convocada uma nova manifestação na Avenida dos Aliados em protesto contra a decisão da Câmara Municipal.
Reportagem de Sofia Cortez, da agência Lusa.
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