Ao longo dos doze anos já passados na liderança do governo alemão, Angela Merkel conheceu três presidentes americanos, quatro franceses e três primeiros-ministros britânicos, e parece não sofrer o desgaste do poder. Nascida e formada na ex-Alemanha Oriental, a líder conservadora é, às vezes, chamada "a chanceler de ferro", por sua defesa ferrenha das políticas de austeridade. Mas os alemães também a chamam de "Mutti" (mãe), por inspirar uma grande segurança no meio da turbulência europeia.
Merkel não tem rivais no seu país, porque, como afirmava o filósofo Peter Sloterdijk em 2015, encarna como ninguém "o desejo ardente de normalidade" dos alemães, consequência de uma história cheia de convulsões e de um olhar circunspecto do mundo. A placidez da líder, que manteve o sobrenome de seu primeiro marido, é apenas uma aparência.
Com as sucessivas crises europeias, adquiriu no exterior uma imagem de carrasca dos países endividados, antes de ser apresentada como a "líder do mundo livre" após a eleição de Donald Trump. Até agora, Merkel não conseguiu mudar as decisões do líder americano em questões fundamentais como o clima.
Lugar na história?
Nestas eleições, as quartas que vence, a chanceler conquistou o direito a liderar a Alemanha por mais quatro anos. Provavelmente os mais incertos de todos os seus mandatos, dentro e fora de casa. Lá fora, uma geopolítica instável e incerta com o fantasma da guerra nuclear de regresso ao xadrez político e com o tema dos refugiados a permanecer em cima da mesa, sem solução, num mundo que se divide entre a sua defesa e a sua associação ao extremismo islâmico. Dentro de casa, Merkel terá pela primeira vez que conviver com a extrema direita sentada no parlamento alemão como a terceira força política do país, um cenário que Jörg Forbrig, do German Marshall Fund, considerou "a maior prova de resistência que a democracia alemã já enfrentou".
Eleita durante seis anos consecutivos pela revista "Forbes" como "a mulher mais poderosa do mundo", o seu lugar na história ainda é incerto. Merkel herdou em grande medida a prosperidade económica impulsionada pelas reformas impopulares do chanceler social-democrata Gerhard Schröder, mas os seus próprios esforços para preparar o futuro são questionáveis.
Além de decidir fechar as centrais nucleares de seu país após a catástrofe de Fukushima em 2011, uma medida vista como resposta para satisfazer a opinião pública, a crise migratória foi o principal acontecimento de seus três mandatos e, talvez, o único grande risco que assumiu.Em setembro de 2015, deixando de lado sua prudência habitual, Merkel decidiu abrir seu país a 900.000 refugiados à procura de asilo.
A decisão fez com que perdesse popularidade e ajudou o avanço dos populistas.A chanceler soube reagir, porém, adotando uma série de medidas e negociando um acordo com a Turquia para reduzir de forma considerável a chegada de refugiados à Europa.
Com exceção da crise migratória, Merkel sempre soube impor o seu estilo atípico, que mistura um profundo conhecimento das relações de poder com um enorme pragmatismo - o que suscita críticas pela sua suposta falta de convicções - e uma retórica muito sóbria.
Queria ser patinadora artística e diz que a dona de casa alemã é o seu modelo
Merkel teve uma infância austera na República Democrática Alemã (RDA), onde o pai se instalou com a família para contribuir para a evangelização do Estado comunista. Aluna aplicada, aprendeu a língua russa na escola e, anos depois, obteve doutoramento em física. Quando menina, Angela Dorotea Kasner - a primeira mulher a governar a Alemanha e a primeira desde Margaret Thatcher a comandar um grande país europeu - sonhava em se tornar patinadora artística.
Amante da ópera, do vinho tinto francês e das caminhadas nas montanhas italianas, Merkel, que faz as compras por conta própria num supermercado barato, proclama que o seu modelo é a dona de casa alemã, símbolo da austeridade e do autocontrole. O seu marido, o professor de química Joachim Sauer, com quem Merkel se casou em 1998, é tão tímido que não compareceu à cerimónia de posse da chanceler, em 2005.
Gerd Langguth, o seu biógrafo, ressalta que Merkel, apesar de estar sempre sob os holofotes, permanece um enigma."É uma esfinge" por se manter discreta, "como aprendeu nos seus anos sob a ditadura da Alemanha Oriental", escreveu.
Angela Merkel esperou a queda do Muro de Berlim, no final de 1989, para entrar na política - primeiro como porta-voz do último governo da RDA e, depois, como membro da conservadora União Democrática Cristã (CDU) de Helmut Kohl.
Na foto em destaque, Angela Merkel e o marido, Joachim Sauer, a caminho da votação nas eleições de hoje.
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