A demografia, como toda a gente sabe, é o estudo estatístico da evolução da população. Quantas pessoas existem num dado espaço, que idades têm (“pirâmide etária”), com que idade média falecem (“esperança de vida”), quantas nascem e morrem anualmente (taxas de natalidade e mortalidade) e qual a evolução do seu número – se estão a aumentar ou a diminuir.
Tudo isto tem sido estudado desde o século XIX e há estatísticas com décadas, o que permite aos especialistas antecipar com bastante precisão a evolução demográfica dum pais. No caso de Portugal, sabemos que somos 10,46 milhões (em 2013), com uma esperança de vida de 80,37 anos (2012) e uma taxa de fertilidade de 1,23 nascimentos por mulher, pelo que a população tem se reduzido a uma média de 0,5% ao ano. A nossa “pirâmide etária”, que numa sociedade “saudável” deve ter precisamente uma forma piramidal – muitas crianças na base e poucos velhinhos no cume –, tem actualmente a forma dum barril e caminha para uma pirâmide invertida. Ou seja, há mais pessoas com idades entre os 30-50 anos do que jovens ou velhos. Daqui a 15 anos, haverá mais pessoas acima dos 50 anos do que de meia idade ou crianças. Isto porque a taxa de fertilidade é baixa; a mulher portuguesa tem em média 1,23 filhos, quando, para repor a população, seria necessário que tivesse 2,1 filhos.
Ou seja, os portugueses estão a diminuir e a ficar mais velhos.
O problema não é exclusivamente português, embora seja particularmente grave em Portugal. Toda a Europa, incluindo a Federação Russa, está a passar pela mesma situação. A taxa de fertilidade média da União Europeia já não chega para as encomendas: 1,58 filhos por mulher. Apenas França se aproxima do mínimo para assegurar a substituição da geração seguinte com com 2,01 filhos por mulher. Não há um único país europeu com valores acima do número mágico, o que quer dizer que a população está lenta e inexoravelmente a diminuir. Na Federação Russa, onde a esperança de vida é mais baixa (70,46 anos) a taxa anda pelos 1,59 nascimentos por mulher. E nos Estados Unidos, vai nos 1,88, pouco mais do que o Brasil, com 1,81.
As consequências da diminuição simultânea da taxa de natalidade e aumento da esperança de vida são múltiplas, mas vamos considerar apenas duas.
Considere-se a taxa de natalidade. Num país como a Alemanha, por exemplo, a população tem vindo a diminuir desde a década de 1970 e em 2050 passará dos 82 milhões actuais para 75 milhões. Usando uma frase muito citada pelos especialistas, “as crianças que não nasceram na década de 90 não terão filhos em 2010”. Ou seja, o fenómeno cresce exponencialmente. Na antiga Alemanha de Leste, de onde os jovens se deslocaram em massa para a República Federal da Alemanha quando caiu o Muro de Berlim, a redução é ainda mais drástica. Numa cidade como Bitterfeld-Wolfen, os residentes passaram de 75 mil em 1989 para 45 mil em 2016. Um em cada cinco edifícios residenciais está vazio. Dois terços dos jardins infantis e metade das escolas primárias fecharam. Não há funcionários para grande parte dos serviços públicos, especialmente nos cuidados à terceira idade, cuja procura aumentou. A cidade chegou ao ponto de "importar" vietnamitas e formá-los em cuidados geriátricos.
A única maneira rápida de suprir a falta de nativos é através da imigração. No Reino Unido, a falta de população activa autóctone levou à entrada de nove milhões de imigrantes no mercado de trabalho. Ainda na Alemanha, há sete milhões de postos de trabalho por preencher.
Décadas atrás, a imigração provinha de outros países europeus, como a Polónia, mas como actualmente todos têm taxas de natalidade muito baixas e populações envelhecidas, os imigrantes passaram a vir da Turquia e de outros países muçulmanos mediterrâneos. Acontece que essas pessoas têm dificuldade (ou podem não querer, em alguns casos) em se integrar. E o problema verifica-se tanto nos recém-chegados, como também nos filhos e até nos netos. Não é só a questão religiosa e as diferenças culturais inerentes, mas também as dificuldades com a língua e os hábitos de trabalho. Além disso, esses imigrantes têm taxas de natalidade muito mais altas. Nos seus países de origem, a alta mortalidade infantil reduzia esse factor, mas com a assistência médica que encontram nos sistemas de saúde europeus, a taxa baixou substancialmente.
Esta situação tem servido de alimento e argumento para os movimentos racistas, nacionalistas e xenófobos europeus, que vêem como um “perigo” a islamização dos seus países e a perda de lugares de trabalho que, na verdade, os europeus não poderiam preencher. O Brexit ou a popularidade de Le Pen não são mais do que reflexos destas alterações demográficas inevitáveis. O facto de a composição cultural e religiosa do continente estar a mudar inexoravelmente assusta muita gente.
Outro problema demográfico grave é o envelhecimento da população, derivado dos melhores cuidados de saúde e avanços da medicina. Com o aumento da esperança de vida há cada vez mais reformados a ser subsidiados por activos. Em Portugal, em 1974, havia 8,9 cidadãos activos por cada pensionista; em 2014, apenas 2,6. Ou seja, as contribuições sociais de menos de três pessoas têm de cobrir a reforma de uma. A média europeia em 2012 era de quatro activos por reformado, a decrescer. A partir destes dados, as projecções indicam que em 2050 haverá mais reformados do que trabalhadores, o que tornará os encargos sociais incomportáveis. As soluções, que já têm vindo a ser postas em prática gradativamente, são o aumento da idade da reforma e a diminuição do valor das aposentadorias. Por outras palavras, uma nítida perda de qualidade de vida.
Mais uma vez, a única solução a curto e médio prazo é a imigração de pessoas jovens, em idade para trabalhar e pagar impostos. E, novamente, essa imigração só pode vir de países com excedentes populacionais, falta de mercado de trabalho e condições de vida precárias.
Mas, mesmo retirando da equação as dificuldades culturais – tanto dos autóctones aceitarem os imigrantes, como dos imigrantes aceitarem valores morais diferentes - há um custo para treinar estas pessoas nas profissões necessárias e na aprendizagem da língua.
Nestes dias em que tanto falamos em bombas, as mais silenciosas podem ter efeitos mais devastadores.
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