"Devíamos estar todos a festejar estarmos a envelhecer e a pensar como aproveitar a conquista de mais anos de vida e não a angustiar-nos". É assim que Maria João Valente Rosa, professora e autora de "Um Tempo sem Idades" começa por se referir às ideias que propõe discutir no seu mais recente livro.
A discussão gira em torno de algumas ideias-chave e de um preconceito chamado idade, algo que a Maria João não deixa de enfatizar em vários momentos da conversa que teve com o SAPO24. "Que idade é que tens? A idade cronológica marca de uma forma terrível, é tempo de mudar", afirma.
Mudar, porquê? Por várias razões, a primeira que vale a pena olhar vai ao encontro do senso comum sendo legitimada pela ciência: a idade é algo democrático, passa por todos, mas não envelhecemos todos da mesma maneira. "Cada indivíduo tem múltiplas idades, a cronológica, a biológica, a psicológica, mas parece que para a sociedade só há uma que conta que é a cronológica".
O aumento da esperança de vida é uma das evidências científicas que permitem questionar, de forma objetiva, a ideia da idade como um parâmetro rígido. "Em 1960, uma pessoa com 65 anos tinha uma esperança de vida de 14 anos. Atualmente, é aos 72 anos que tem 14 anos de esperança de vida - houve um "bónus" de 7 anos", ilustra Maria João Valente Rosa.
Mas não é só a idade "numérica", é também o estilo de vida, o tipo de pessoas que somos hoje versus há 50 anos ou 100 anos. "Hoje aos 65 anos, as pessoas são bem diferentes do passado, mais qualificadas, mais próximas das novas tecnologias, mais conectadas, com um consumo mais diversificado e sabem que à partida vão viver mais tempo".
E é por essa razão também que, para a autora de "Um Tempo sem Idades", hoje devemos "olhar para as pessoas em função do seu potencial, do seu futuro e não do seu passado". O que passa por planear vidas mais longas e não por entreter pessoas numa etapa da sua vida em que são mais velhas. Isso significa, na opinião de Maria João, revisitar todos os patamares da vida e não apenas aquele em que se é mais velho. "Temos de deixar de ter as nossas vidas em gavetas, a primeira etapa que é de formação, a segunda que é de trabalho e a terceira que é de reforma. Vários estudo mostram-nos que 50% das crianças que nascem hoje podem ultrapassar a barreira dos 100 anos - temos de planear vidas longas".
Planear vidas longas é um pensamento - e uma política pública - bastante diferente do que atualmente acontece. "Um dia as pessoas adormecem ativas e acordam reformadas e dizem-lhes agora tens o tempo pela frente e fazes o que quiseres", ilustra. "Vai para a ginástica", é uma das coisas que dizem, mesmo que muitas pessoas pensem "mas eu nunca gostei de ginástica".
A alternativa é repensar a forma como as vidas são organizadas ao longo das várias idades. Maria João João Valente Rosa defende, por exemplos, menos horas de trabalho, mais tempo para aprender em todas as faixas etárias e um novo olhar para a idade em função do que cada pessoa representa e dos contributos que pode dar. "A idade continua a ser um factor de discriminação terrível e que é preciso mudar".
A data de chegada às livrarias deste ensaio coincidiu com a semana da declaração do estado de emergência e com a primeira semana em que muitos portugueses ficaram fechados em casa para conter a propagação da pandemia de covid-19. O livro está, todavia, disponível online, nomeadamente no site da editora, a Tinta da China.
Na sinopse do livro, concretiza-se o conceito inerente ao ensaio: "The Age of no age é um conceito social que não usa a idade como marca para determinar o posicionamento dos indivíduos adultos, de qualquer idade, no mercado de trabalho e na sociedade. O aumento do tempo médio de vida tem de deixar de significar ser-se velho por mais tempo, para passar a ser entendido como ter-se mais tempo para viver. Vidas mais longas têm implicações sobre toda a vida e não unicamente sobre o seu fim. […]".
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