Falando como assistente nas alegações finais do julgamento sobre a morte do cidadão ucraniano em 12 de março de 2020 nas instalações do SEF no aeroporto de Lisboa, José Gaspar Schwalbach discordou da eventual conversão do crime de homicídio qualificado de que os inspetores vinham acusados num crime de ofensa à integridade física qualificada, agravada pelo resultado (morte).
Antes, a procuradora Leonor Machado pedira a condenação dos inspetores acusados a penas de prisão entre os oito e os 16 anos, salientando que Ihor Homeniuk morreu por asfixia lenta, na sequência das agressões a pontapé e com bastão por parte dos acusados, e por ter sido deixado algemado com as mãos atrás das costas e de barriga para baixo, mas aceitando deixar o crime de homicídio qualificado, cujo pena máxima atinge 25 anos.
Menos benevolente do que o MP na apreciação do ocorrido e na qualificação jurídica do crime em causa, José Gaspar Schwalbach lembrou os pormenores mais chocantes relatados pelas testemunhas, nomeadamente que o trio de inspetores fechou a porta da sala onde estava o passageiro ucraniano e durante mais de 15 minutos o agrediram, deixando-o com as algemas atrás das costas e de barriga para baixo, "sem liberdade para respirar", o que levou à morte da vítima "por sufocação" lenta.
Realçou ainda o mesmo advogado a "forma humilhante" como Ihor Homeniuk foi "agredido e deixado sozinho" algemado, tendo um dos inspetores declarado à saída da sala onde o ucraniano foi agredido que naquele dia "já não precisava de ir ao ginásio".
A utilização de bastão nas agressões a Ihor Homeniuk, o relato de testemunhas sobre os gritos "agonizantes" proferidos pelo passageiro ucraniano e audíveis fora da sala e a especial "censurabilidade" pela forma como os inspetores atuaram diante de um passageiro algemado e imobilizado, levaram o advogado da família a defender, perante o coletivo de juízes, que os arguidos devem ser condenados pelo crime de que estão acusados: homicídio qualificado.
A assistente apelou nesse sentido ao tribunal, mas enfatizou que é o coletivo de juízes que "melhor do que ninguém" deve apreciar e decidir consoante a prova produzida em julgamento e fazer justiça nesse caso.
Antes, e também em alegações finais, o MP pediu a condenação dos três inspetores do SEF a penas de prisão entre oito e 16 anos pelo crime de ofensas corporais graves, agravada pelo resultado (morte).
Tendo em conta o grau de culpa de cada um dos inspetores do SEF acusados, nas alegações finais do julgamento, a procuradora Leonor Machado pediu para os arguidos Duarte Laja e Luís Silva uma condenação dentro de uma moldura penal entre 12 e 16 anos de prisão, mas de preferência não inferior a 13 anos.
Quanto ao arguido Bruno Sousa, a procuradora entendeu que o seu grau de culpa foi menor, por ter sido influenciado pelos restantes arguidos, pedindo uma condenação a uma pena de prisão não inferior a oito anos.
O trio de inspetores do SEF foi julgado por homicídio qualificado, cuja moldura penal máxima atinge os 25 anos de prisão, mas na última sessão o juiz presidente do coletivo, Rui Coelho, anunciou que o tribunal ponderava alterar a acusação de homicídio qualificado para ofensa à integridade física qualificada, agravada pelo resultado (morte), cuja moldura penal situa-se entre quatro e 16 anos de cadeia.
"É uma mera alteração da qualificação jurídica do crime constante da acusação para crime menos grave", disse então o juiz-presidente.
Neste julgamento, dois dos arguidos (Duarte Laja e Luís Silva) respondem também pelo crime por posse de arma ilegal (bastão).
Nas alegações finais, a procuradora Leonor Machado deu como provada a tese de acusação que Ihor Homeniuk foi algemado e agredido nas instalações do SEF no aeroporto de Lisboa, em março de 2020, vindo a morrer por asfixia lenta devido às agressões a pontapé e com bastão, que lhe causaram a fratura de várias costelas, mais precisamente de "oito arcos costais".
A procuradora considerou que houve também "negligência" dos acusados face ao "grave estado de saúde" de Ihor Homeniuk, tendo este morrido asfixiado devido à insuficiência respiratória provocada pela fratura das costelas, após as agressões, e em virtude de ter ficado algemado e de barriga para baixo, dificultando a respiração e provocando-lhe a morte por asfixia, e não por convulsão e aspiração de vómito como a defesa pretendeu fazer crer.
A procuradora salientou a "falta de misericórdia" e a "omissão de solidariedade" evidenciada pelos acusados, num contexto em que o objetivo era manter Ihor Homeniuk algemado e imobilizado para que, "custe o que custasse", o passageiro embarcasse de avião em 12 de marco, de regresso à Turquia, ponto de paragem da sua viagem desde a Ucrânia.
"Ficou demonstrado pela autópsia que as agressões foram feitas com pontapés e agressão com bastão", enfatizou Leonor Machado, notando que um desses pontapés, com "muita energia", na zona do tronco provocou a fratura das costelas da vítima.
Segundo Leonor Machado, "Ihor estava a morrer e mesmo assim tentaram fazer com ele embarcasse, tal era a pressão que ele fizesse a viagem de regresso". A procuradora lamentou ainda que no SEF tenham "ocultado o estado de saúde gravíssimo da vítima" e que entre as 08:00 e as 15:00, o cidadão ucraniano apenas foi alimentado com "três bolachas e um pacote de leite com palhinha".
As alegações finais prosseguem hoje à tarde com a intervenção de cada um dos advogados de defesa.
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