Fernanda Margarida de Sá, que começou a sofrer de fibromialgia há 25 anos, garantiu, contudo, que não irá parar o seu trabalho, só porque ficou “curada”, como contou à Lusa, e irá continuar a acompanhar e a informar os doentes para o que criou uma outra página na rede social Facebook: ‘Fibromiálgicos unidos pela saúde’.
A responsável quer agora falar em nome individual, e “com liberdade”, de um fármaco que tem como princípio ativo a citicolina, que lhe foi receitado há um ano para um problema que, aparentemente, não estava relacionado com a fibromialgia.
Conta que no dia seguinte a iniciar o tratamento, acordou “sem inchaço nas mãos e na cara e sem ponta de dor”.
“Arrumei a casa e fui passear durante horas, sem me queixar (…). Bem podem dizer que aquilo não faz nada, mas eu e dezenas de doentes que já experimentaram podemos provar o contrário”, afirmou.
Fernanda de Sá disse que, desde que começou a falar no medicamento, tem sido alvo de “graves insultos e acusações falsas” à sua pessoa e à APDF.
“Fomos acusados de receber uma avultada verba do laboratório e que estávamos a pagar aos doentes que mencionavam que estavam a sentir a cura. Isto foi ofensivo demais e, a partir daí, comecei a sentir que a APDF tinha de acabar”, sublinhou.
Considerou que “seria uma falta de honestidade e de seriedade”, porque a APDF “nasceu para melhorar a qualidade de vida dos doentes e a partir do momento em que existem provas de um medicamento que tira todos os sintomas da fibromialgia, não há razão de ser para a existência de uma associação a lutar pelos doentes”.
O laboratório responsável pelo medicamento, que inicialmente mostrou “grande interesse” no que lhe foi descrito, veio mais tarde “proibir a APDF de continuar a fazer questionários aos doentes para saber como reagiam ao mesmo tratamento”.
Fernanda de Sá garante que “a maior parte dos doentes manifesta euforia, por se sentirem curados, outros apontam melhorias significativas e poucos são os que dizem não sentir evolução positiva, provavelmente porque sofrerão de outros problemas associados ou porque não estão a fazer o tratamento da maneira correta”.
“Inicialmente [o laboratório] ficou satisfeito, mas depois informou-nos que ainda seria cedo para entrar em investigação e que era necessário esperar mais tempo até que houvesse mais provas, coisa que não nos agradou”, disse.
Num email enviado à presidente da APDF, e a que a Lusa teve acesso, o laboratório dizia que “este tipo de ‘questionários’ vão contra qualquer regulação ou normativa sobre a utilização de medicamentos”.
“Quero que fique bem claro, a total desvinculação por parte do Laboratório (…) de esta ou qualquer tipo de práticas de este tipo que possam pôr em dúvida as regras de ética e ‘compliance’ que marcam a nossa conduta como empresa relacionada com a saúde”, lê-se no email.
Fernanda de Sá acrescentou que “exigiram que a APDF retirasse o questionário”, o que foi recusado.
“Estão na minha cabeça os milhares de doentes que não estão felizes como eu, e por eles dei preferência a acabar com a instituição que criei, para ter a possibilidade de, através de um novo processo, continuar a ajudá-los, podendo falar daquilo que quero”, afirmou.
Contactada pela Lusa, a médica de família de Fernanda de Sá contou que a conhece “há pelo menos 20 anos, que era professora de educação física naquela altura” e que “era muitas vezes obrigada a ausentar-se do trabalho porque nem sempre estava capaz de cumprir com os compromissos profissionais, por dores incapacitantes”.
Entretanto, “há alguns anos foi feito o diagnóstico a esta senhora por um neurologista de Lisboa, que teve a amabilidade de esclarecer” a médica, possibilitando "um processo de reforma antecipada”, contou Conceição Macedo.
“Desde o ano transato tive conhecimento pela própria que estava a fazer citicolina (…) e, desde aí, deixou de ter dores, dorme bem, não se sente cansada (…) e tem uma energia nunca vista anteriormente, por mim confirmada pessoalmente em consulta”, assinalou, realçando que “se há ou não relação com a citicolina, caberá aos investigadores estudar”.
A Lusa contactou outros especialistas e investigadores que se escusaram a comentar a situação descrita por Fernanda de Sá, incluindo o médico que há um ano lhe receitou o fármaco à base de citicolina, alegando “não existir evidência científica” ou porque “a investigação ainda se encontra numa fase muito precoce”.
A Lusa ouviu algumas doentes a tomar o fármaco, que referiram “alívio nas dores” e “melhoras nas funções cognitivas”.
Susana Ferreira, de 48 anos, antropóloga, foi diagnosticada há oito anos, embora já sofresse desde há muitos anos. Disse à Lusa que quando iniciou o tratamento, há cerca de um ano, descobriu “um admirável mundo novo”.
“Cheguei a tomar dez comprimidos por dia, alguns para conseguir dormir. As dores que sinto agora são provocadas pelas artroses, distintas das dores musculares provocadas pela fibromialgia”. Atualmente, contou, toma apenas um comprimido.
Rute Campos, professora, de 49 anos, relatou ter iniciado o tratamento há cerca de dois meses, não se sente “curada”, mas “as dores aliviaram um bocadinho” e melhorou “muito no que se refere à falta de memória e lucidez”.
Maria Filipe Martins, 68 anos, disse que “as dores diminuíram muito” e que já consegue “dormir e viajar” o que representa “um grande salto” na sua qualidade de vida”.
A Direção-Geral da Saúde (DGS) publicou em 2016 a norma “Abordagem Diagnóstica da Fibromialgia”, reconhecendo oficialmente a doença, que, segundo dados da APDF, atinge mais de 300 mil pessoas em Portugal.
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