Primeiro, foram mortos dois menores migrantes hondurenhos e um terceiro sofreu graves lesões. Depois, foi uma granada de gás lacrimogéneo atirada para o acampamento dos centro-americanos.
No passado dia 15 à noite, dois hondurenhos, de 16 e 17 anos de idade, foram mortos quando saíam do albergue YMCA para migrantes para se dirigirem até ao Centro da cidade, quando foram intercetados por dois homens com a intenção de assaltá-los.
Os corpos foram encontrados num terreno baldio com marcas de estrangulamentos e de facadas pelas costas. Mesmo gravemente ferido, outro menor conseguiu escapar do ataque. Dois homens e uma mulher, suspeitos do crime, foram presos.
A polícia mexicana está a investigar os crimes como latrocínio por acreditar que o motivo inicial tenha sido um roubo, mas não descarta que, para o desenlace fatal, tenha incidido algum preconceito contra os migrantes.
Foram os primeiros crimes contra integrantes da caravana de migrantes que chegou à cidade há um mês. Os assassínios foram divulgados no dia 19, junto com outro episódio contra migrantes.
Na véspera, dia 18, dois desconhecidos lançaram, do lado de fora, uma granada de gás lacrimogéneo para o interior do acampamento El Barretal, onde está a maioria dos migrantes. O engenho explodiu numa zona onde estavam sobretudo mulheres e crianças.
Os efeitos da densa nuvem química afetaram várias pessoas, mas não causou feridos graves. Os agressores conseguiram fugir.
“Fiquem nos albergues. Aos cidadãos hondurenhos, digo-lhes que aproveitem as oportunidades que o México está a dar para se regularizarem, mas, nas Honduras, está a vossa melhor oportunidade. O crime organizado do México é impiedoso. Podem cometer atos realmente brutais. Fiquem alerta porque essa é uma rota extremamente perigosa”, advertiu o embaixador hondurenho no México, Alden Rivera.
“Se a nossa melhor oportunidade fosse ficar nas Honduras, porque milhares de nós arriscamos a vida para vir até aqui? Eu quero entrar nos Estados Unidos, mas, se não conseguir, então ficarei no México. Nas Honduras, há muita ‘mara’ [gangues de crime organizado]. Para lá eu não volto, por mais que aqui haja quem não nos queira”, disse à Lusa a hondurenha Anabel Pineda, de 26 anos.
Anabel deixou a filha de 12 anos nas Honduras e trouxe o filho de seis para fugir das ‘maras’ porque, diz, apoderaram-se do território hondurenho e há falta de trabalho.
Tijuana é a quinta cidade mais violenta do México. A guerra entre cartéis por ampliar ou manter o seu território causou 2.200 mortes somente em 2018 numa população de 1,6 milhões de habitantes.
Anabel Pineda partiu de São Pedro Sula a 13 de outubro, na primeira caravana. Viu como a chegada a Tijuana provocou o repúdio e o protesto dos locais.
“Há mexicanos que dizem para irmos embora. Dizem que estamos a trazer problemas para cidade. Gritaram, atiraram pedras. Disseram que éramos lixo, que éramos ladrões. Imagino que estejamos a causar lhes problemas”, lamenta Anabel Pineda, ressaltando, no entanto, que se trata de uma minoria.
“Há gente mexicana boa que nos está a apoiar com roupa, comida e sapatos. Fomos bem tratados pelo caminho por todo o México”, valoriza.
O contraste entre Tijuana e o resto do país é marcante. Enquanto muitas localidades mexicanas receberam a caravana com música, comida e doações, boa parte de Tijuana manteve-se indiferente ou contrária.
Em Tijuana, os migrantes centro-americanos são chamados de “hondurenhos”. Segundo a consultoria Mitofsky, um de cada três mexicanos rejeita os “hondurenhos” porque poderiam tomar o emprego dos locais e aumentar a insegurança do país. No acampamento, uma faixa exibe essa rejeição: “Fora, caravana de migrantes hondurenhos”.
Ajudou a essa reação os primeiros movimentos dos migrantes quando chegaram há um mês.
Com o impulso que quererem cruzar a fronteira, muitos subiram no muro de ferro enferrujado que separa o México dos Estados Unidos, despertando o movimento de alerta das forças de segurança.
Cerca de 400 pessoas protestaram contra os migrantes. Cantaram o hino mexicano e empunharam cartazes em letras garrafais: “Basta de Imigração” e “Nossos pobres primeiro”.
Em 25 de novembro, um protesto de migrantes na fronteira, em princípio pacífico, terminou numa tentativa fracassada de entrar nos Estados Unidos à força. Durante horas, a fronteira foi fechada, afetando a vida na cidade mexicana.
Dias depois, a hondurenha Miriam Celaya causou indignação popular ao criticar a comida que recebia no acampamento, justamente o feijão, base da comida mexicana.
“Olha o que nos estão a dar: puro feijão moído como se estivesse a alimentar os porcos. A comida não presta”, queixou-se.
“Não somos racistas. Simplesmente, queremos que os hondurenhos respeitem o nosso país e o que lhes estamos a dar. Não parecem agradecidos nem respeitam regras”, disse à Lusa Mauricio, cozinheiro na rede “Tortas Javier” (Sanduíches Javier).
Dias depois, as autoridades levaram Miriam Celaya para um local secreto tamanha a quantidade de ameaças que recebeu, sendo que foram arremessadas pedras contra o acampamento aos gritos de “Fora Hondurenhos” e “Invasores”.
Em contrapartida, para conter os episódios de repúdio, uma marcha também pediu pelo fim da discriminação contra os migrantes.
“Em Tijuana, uma minoria está contra. Eles acham-se mais norte-americanos do que mexicanos. Sentem-se mais gringos. São racistas. Mas nós, os mexicanos do sul, apoiamos. Somos mais generosos. Damos o pouco que temos”, compara Leonarda Alcántar, voluntária no acampamento El Barretal, nascida e criada em Nayarit.
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