A abrir as alegações finais dos assistentes do processo BES/GES no segundo dia de debate instrutório, no tribunal de Monsanto (Lisboa), o advogado Nuno Silva Vieira vincou que foi na instrução “que as vozes das vítimas da criminalidade económico-financeira se fizeram ouvir pela primeira vez em Portugal”, considerando “inequívoca e exigível” uma decisão de pronunciar os 25 arguidos para julgamento.
“Se estamos perante o maior, e mais complexo, processo da justiça portuguesa, então também teremos de o transformar no maior exemplo indemnizatório da nossa história democrática”, disse o mandatário, continuando: “Nada do que aqui foi recolhido, contraditado ou apresentado belisca os indícios suficientes, que determinam não uma probabilidade razoável de aos arguidos vir a ser aplicada uma pena, mas uma altíssima probabilidade de condenação”.
Para a defesa, “as vítimas querem acreditar que ainda se poderá ir a tempo”, tendo, por isso, apelado à adoção de medidas preventivas para a indemnização dos lesados, como a garantia de uma venda imediata dos bens arrestados “que estão a perecer”, com os proveitos dessa operação a serem reservados a favor dos lesados com direito a serem indemnizados.
Apesar de notar que a acusação do Ministério Público (MP) está “tecnicamente irrepreensível”, Nuno Silva Vieira deixou duras críticas à oposição dos procuradores à concessão do estatuto de vítima aos lesados, algo que o juiz de instrução já acabou por conceder a mais de 1.200 pessoas, sublinhando que o MP “tentou impedir que houvesse vítimas” no processo BES/GES.
“Os lesados ficaram terrivelmente inconformados com a posição do MP que se opôs ao deferimento dos seus estatutos de vítima. (…) O interesse público em direito penal também visa a proteção dos ofendidos. O MP nunca esteve preocupado com certos temas. Preocupou-se em defender a sua acusação, de forma acérrima, mas nunca esteve preocupado com a compensação célere dos lesados”, referiu.
Recorrendo ao prémio Nobel da Economia Daniel Kahneman, que alegou que a dor de perder dinheiro poderia ser “uma dor equivalente à dor física”, Nuno Silva Vieira afirmou que muitos lesados expressaram que “preferiam ter sido violentados pelos arguidos do que terem perdido as poupanças das suas vidas e a sua dignidade familiar”, pois dessa forma o seu reconhecimento como vítimas seria imediato.
“As vítimas não são um conjunto de ignorantes que se deixaram enganar e por isso merecem ser espezinhadas e colocadas em segundo plano. As vítimas são pessoas a quem foram infringidos danos patrimoniais e não patrimoniais. A justiça tem de dar uma resposta eficaz e, mais uma vez, tem de ser exemplar”, observou, concluindo: “Este capítulo deverá ser encerrado com a pronúncia exemplar, que, estamos certos, será proferida”.
Considerado um dos maiores processos da história da justiça portuguesa, este caso agrega no processo principal 242 inquéritos, que foram sendo apensados, e queixas de mais de 300 pessoas, singulares e coletivas, residentes em Portugal e no estrangeiro.
Segundo o MP, cuja acusação contabilizou cerca de quatro mil páginas, a derrocada do Grupo Espírito Santo (GES), em 2014, terá causado prejuízos superiores a 11,8 mil milhões de euros.
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