Esta hipótese foi apresentada esta segunda-feira, 19 dezembro, por advogados da associação a cerca de 200 clientes que investiram, através de balcões do banco BES, em papel comercial de empresas do Grupo Espírito Santo e que perderam tudo com a implosão do grupo em 2014.
Estes clientes reuniram-se hoje ao fim da tarde num hotel em Lisboa para uma sessão de esclarecimento, após a sessão pública de apresentação oficial da solução que os permitirá compensar das perdas sofridas, hoje ocorrida na residência oficial do primeiro-ministro, com a presença de António Costa.
Como o advogado Miguel Henrique explicou no fim aos jornalistas, foram contactados vários bancos, portugueses e estrangeiros, e a administração da Caixa Económica Montepio Geral mostrou-se interessada em apresentar uma proposta comercial atrativa aos clientes, caso o valor que estes investirem no banco seja considerável.
O advogado garantiu que cada cliente é "livre, completamente autónomo" de decidir se quer investir o dinheiro que poderá receber no Montepio, ou não, e que o objetivo é que a proposta incida sobre "os produtos mais conservadores que existem no mercado".
"A ideia é que, em bloco, estas pessoas consigam mais valor", afirmou Miguel Henriques.
Em causa está o montante de cerca de 286 milhões de euros que seria recebido pelos lesados do papel comercial, caso a totalidade dos cerca de 4.500 aderissem à solução hoje apresentada oficialmente.
Este valor significa para os clientes uma perda total de 199 milhões de euros, mas significa também que recebem este dinheiro num prazo de dois anos (30% até junho de 2016 e o restante até aos primeiros meses de 2019) e que não têm de esperar por decisões de tribunais que podem demorar anos.
Questionado sobre a viabilidade do Montepio, o advogado Miguel Henrique disse que não há qualquer motivo para ter essa dúvida e que é um banco tão viável como os outros que operam em Portugal.
A apresentação pública do mecanismo para compensar os lesados do papel comercial decorreu hoje, sem que fossem avançados pormenores técnicos da solução que será colocada à avaliação de cada cliente, nem como será feita a criação de um fundo de indemnizações a partir do qual sairá o dinheiro para compensar.
Também não houve direito a perguntas dos jornalistas.
Das informações recolhidas pela Lusa junto de fontes envolvidas nas negociações, os clientes lesados que aceitarem a solução têm garantido que receberão 75% do valor investido, num máximo de 250 mil euros, nas aplicações até 500 mil euros, e 50% para as aplicações acima dos 500 mil, valor que será pago até 2019.
O valor será reembolsado por aplicação e não por cliente. Neste processo, estão contabilizadas 2.000 aplicações detidas por 4.000 clientes (ou seja, em média, cada aplicação tem dois titulares).
Por exemplo, para uma aplicação de 400 mil euros serão pagos 250 mil euros, porque é o valor máximo possível para esse montante, ainda que seja abaixo dos 75%. Já para uma aplicação de 600 mil, serão pagos 300 mil euros.
Ou seja, de forma garantida, os clientes assumem sempre perdas, mas recebem desde já dinheiro por que teriam de esperar anos, provavelmente, para recuperar em processos em tribunal e de forma incerta.
A primeira ‘tranche’ deverá ser paga logo no momento do contrato de adesão, que cada cliente terá de assinar, e que será equivalente a cerca 30% do valor a que cada lesado tem direito, tendo sido esta percentagem calculada com base no que a consultora Deloitte considerou que era o valor que os credores comuns receberiam se o BES tivesse sido liquidado em 03 de agosto de 2014, em vez de ter seguido o caminho da resolução, como aconteceu.
O valor será pago por um veículo que ainda será criado - um fundo de indemnizações -, mas uma vez que este nascerá sem dinheiro, a intenção é que seja conseguido o valor necessário através de um financiamento junto da banca, com garantia do Estado e contragarantia do Fundo de Resolução bancário, pelo que se colocam dúvidas sobre o impacto que esta solução terá no défice orçamental do próximo ano.
O empréstimo que será pedido aos bancos depende da adesão dos clientes lesados a esta solução, estando já estimado que se todos aderirem serão necessários 286 milhões de euros.
O banco Montepio também poderá estar interessado em conceder este empréstimo, que terá garantia estatal.
Quanto aos clientes que quiserem aderir a este mecanismo, têm de cumprir uma série de obrigações.
Em primeiro lugar, têm de ceder os direitos judiciais dos processos já colocados em tribunal, contra entidades e administradores ligados ao GES, ao veículo que será criado. Esse veículo assumirá, depois, a litigância desses processos na Justiça e receberá eventuais compensações decididas pelos tribunais.
O objetivo é que esse fundo consiga recuperar em tribunal nos próximos anos pelo menos o valor pago aos clientes lesados.
Os clientes terão ainda de comprometer-se a renunciar a reclamações e processos judiciais contra uma série de entidades, que, para já, são Banco de Portugal, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), o Fundo de Resolução bancário, o Estado, o Novo Banco e o seu futuro comprador. Mas a lista ainda está em processo de revisão.
Este mecanismo de compensação foi discutido desde março entre o grupo de trabalho constituído pela Associação de Indignados e Enganados do Papel Comercial, Banco de Portugal, CMVM e 'banco mau' BES, com mediação do Governo, através do advogado Diogo Lacerda Machado.
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