Com o objetivo de “dizer basta”, os manifestantes, na sua grande maioria mulheres, empunhavam desenhos de mãos vermelhas, nos quais se liam mensagens como “Nós não nos calamos”, “Justiça machista” ou “Andar em público não torna o meu corpo público”.
Em declarações à agência Lusa, Andrea Peniche, ativista de A Coletiva, disse que este protesto pretende ser uma “chamada de atenção” e uma demonstração de “indignação da sociedade”.
Posicionada atrás de uma faixa com a inscrição “Vivas. Unidas. Livres”, Andrea Peniche considerou que existe um “problema sistemático” e desafiou o Governo, liderado por António Costa, a lançar um “grande debate nacional” sobre a forma como a justiça se pratica nos tribunais portugueses quando são julgados crimes de violência de género.
Para essa discussão, devem ser convocados magistrados, grupos parlamentares, associações e coletivos femininistas, defendeu.
O caso ocorreu em novembro de 2016 numa discoteca de Vila Nova de Gaia e a vítima, de 26 anos, chegou a estar inconsciente por excesso de consumo de álcool, mas os dois homens alegaram sempre que ela consentiu as relações sexuais.
A 8 de fevereiro de 2018, o Tribunal de Vila Nova de Gaia condenou os dois arguidos a pena de prisão de quatro anos e meio, suspensa na sua execução, pela prática, em autoria material, de um crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência.
O Ministério Público recorreu, pedindo condenação a pena efetiva, mas os juízes do Tribunal da Relação do Porto mantiveram a condenação em primeira instância num acórdão de 27 de junho.
Para Andrea Peniche, este tipo de acórdãos são uma “espécie de convite à violação”, porque dão ideia de que “tudo serve” para desculpar os agressores, acrescentando que os argumentos invocados na decisão judicial revelam que os preconceitos contra as mulheres estão “perfeitamente enraizados” nos tribunais portugueses.
“Revelam tribunais impermeáveis às mudanças sociais das últimas décadas, impermeáveis à transformação dos papéis de género e a todas as conquistas que as mulheres alcançaram no seu direito à igualdade”, declarou.
Apontando a “falta de sensibilidade” dos magistrados, a psicóloga Raissa Atzinger, a trabalhar no centro de acolhimento à vítima de crimes sexuais, referiu, por seu turno, que é “urgente” os juízes valorizarem e darem mais atenção aos danos psicológicos causados.
“Quer pela violação, quer, depois, por acórdãos deste tipo”, frisou.
Por seu lado, José Junqueiro considerou que a justiça portuguesa “está doente” e tem “trabalhado muito mal”.
“Isto tem de mudar, os juízes não podem continuar a ser os superpoderosos a quem tudo lhes é permitido”, reforçou o manifestante.
Além do Porto, outros protestos estão agendados, para quinta e sexta-feira, em Coimbra e Lisboa, respetivamente, revelou Andreia Peniche.
As organizações promotoras são as mesmas que realizaram uma concentração em 27 de outubro de 2017, então para expressar “repúdio e indignação” por uma decisão, também da Relação do Porto, que “legitimava a violência doméstica contra as mulheres, apoiada em considerações machistas e misóginas sobre o comportamento da vítima”.
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