Foi quase uma cimeira de autarcas, como o próprio anfitrião da cerimónia de aniversário da Altice Labs, o presidente da Câmara Municipal de Aveiro, Ribau Esteves, assinalou logo que subiu ao palco. Aveiro, Viseu, Nazaré, Oeiras, para mencionar algumas. Mas, as primeiras palavras do autarca de Aveiro foram para um convidado em especial, Isaltino Morais, presidente da Câmara Municipal de Oeiras, também presente na cerimónia em que foi assinalado num novo polo regional da Altice Labs, no Tagus Park.
"Quero cumprimentar em especial um jovem-velho que hoje está aqui connosco, Isaltino Morais. Só tive dois professores no início da minha vida autárquica, e um foi ele", afirmou Ribau Esteves, recordando que ambos tiveram já "duas vidas autárquicas", ainda que Isaltino se tenha mantido sempre no mesmo concelho. "Hoje é um dia muito importante para ti, mas também é muito importante para mim ter-te aqui em Aveiro", acrescentou.
"Aveiro foi uma surpresa para mim e realmente tenho muito a aprender contigo", retorquiu o presidente da Câmara Municipal de Oeiras quando subiu ao palco. "O bom autarca é aquele que faz o discurso que o Ribau Esteves aqui fez, que entende que se deve deixar fazer, quem faz bem e não incomodar", apontou. De Aveiro, disse Isaltino, reteve "os espaços verdes, uma cidade limpa", porque "o difícil muitas vezes é resolver as questões pequenas e, quando não se resolvem, as grandes também não se resolvem".
Trocados os cumprimentos, foi altura de falar do protocolo hoje assinado e que levará à instalação de um novo polo regional da Altice Labs, no Tagus Park, em Oeiras. E Isaltino Morais fê-lo propondo uma viagem no tempo até à génese do Tagus Park, uma ideia que atribuiu ao conselho de Valente de Oliveira, ministro do Planeamento nos governos liderados por Cavaco Silva na segunda metade dos anos 80. "O professor Valente de Oliveira veio falar comigo sobre a Fábrica da Pólvora de Barcarena que a câmara queria recuperar. Falou-me de exemplos que existiam na Europa, como Manchester, Cambridge e Grenoble", recordou. A ideia de um parque tecnológico era então "algo de novo", numa "Lisboa que era uma cidade deprimida".
"Falava-se então de de setor terciário, não de empresas tecnológicas. Inventámos a expressão terciário superior e uns anos depois vulgarizou-se como tecnologia e hoje fala-se de empresas de base tecnológica".
"Fizemos um voo de helicóptero, sobrevoando Oeiras, e foi assim que dissemos é aqui"
O que viria a ser o Tagus Park acabou por não nascer na Fábrica da Pólvora. "Achei pequeno, há que pensar grande", contou Isaltino. E a localização acabou por ser decidida de outra forma. "Fizemos um voo de helicóptero, sobrevoando Oeiras, e foi assim que dissemos é aqui". Um sítio, recorda, onde havia perdizes. "Hoje os ambientalistas estariam contra e até acho que há mais perdizes hoje do que havia, e também coelhos e patos bravos - não são os que estão a pensar, são mesmo patos bravos".
Ribau Esteves usou o verbo "ousar" com que Alcino Lavrador tinha identificado o projeto da Altice Labs, Isaltino Morais retomou com um quase sinónimo, "arriscar" - "o mérito de Oeiras há 35 anos foi arriscar". Mas ambos usaram também o seu discurso para delinear espaços de intervenção face ao poder central - "que está tão longe de Oeiras como de Bragança", segundo Isaltino Morais.
Referindo-se ao aniversário da Altice Labs, o autarca anfitrião definiu a cidade de Aveiro e as várias entidades da autarquia como sendo "parceiro felizes" do projeto. "Comemoramos 4 anos com herança, com os velhos que já cá estavam, e aos que vieram nascendo nestes 4 anos, é bom ver-vos a gerir bem a herança", afirmou.
"Acho ótimo que haja duas, quatro, oito, mas já há uma cidade que é piloto do 5G que é Aveiro"
Não quis, porém, deixar de sublinhar que Aveiro é "cidade piloto do 5G" e que já teve oportunidade de o dizer ao "ministro e secretário de Estado" a propósito da implementação da nova rede de comunicações móveis. "Disseram-me que vão existir duas cidades piloto, uma no litoral e outra no interior, acho ótimo que haja duas, quatro, oito, mas já há uma que é piloto do 5G que é Aveiro". "Que não sejam os políticos a atrapalhar o trabalho de quem trabalha, de quem cá está", rematou.
"Estava deliciado a ouvir o Ribau, não pelos elogios, mas porque me revejo no que ele diz", afirmou Isaltino Morais. "Se nos apresentarem 50 projetos e se 49 falharem e um correr bem, tivemos sucesso", considerou antes de recordar o track record de Oeiras nos últimos 30 anos. "Oeiras ocupa hoje 30% da base tecnológica instalada em Portugal. Em 48 km com 173 mil habitantes. Oeiras tem um volume de negócios de 24 mil milhões de euros, o turismo faz 18 mil milhões de euros", ilustrou. O presidente da câmara de Oeiras acrescentou ainda outros dados comparativos: "Porto é a segunda cidade do país e gera 14 mil milhões, Cascais 6 mil milhões".
O passo seguinte, acrescentou, é uma "nova cidade" de Oeiras que "é educação, inovação e tecnologia". "Além do Tagus Park, outros vão nascer. São 295 hectares onde as pessoas podem também residir" e que representam "400 milhões de euros de investimento público em quatro anos na cidade de inovação, conhecimento e tecnologia que vai nascer em seis anos".
"Não é possível fazer ciência sem arte e filosofia"
A cerimónia do quarto aniversário da Altice Labs trouxe também até Aveiro o médico oftalmologista António Travassos, um dos mais reputados nomes da medicina portuguesa e rosto da parceria assinada com o Centro Cirúrgico de Coimbra.
António Travassos recordou que, no seu tempo de estudante, não era bom a filosofia. Uma menção que não aconteceu por acaso, já que considera que hoje "não é possível fazer ciência sem arte e filosofia".
"Desde 2010 que introduzimos a arte na ciência e foi com a preocupação de fazer bem que temos uma base de mais 7 milhões de imagens de oftalmologia que podem ser trabalhadas para serem transformadas em diagnóstico", afirmou.
O médico recordou a evolução que tem existido nas imagens com utilização clínica, considerando que, neste campo, "o telemóvel e os seus familiares podem ir longe". "Todos assentam na tecnologia mais importante que é o transistor", afirmou, antecipando, nos próximos anos, "uma medicina muito mais próxima da física".
As quatro áreas de colaboração já identificadas no âmbito deste protocolo são a análise e estudo de soluções tecnológicas de armazenamento seguro de dados de saúde tais como imagens, relatórios clínicos, entre outros, tendo em consideração infraestruturas disponíveis; a avaliação de soluções de backup e Disaster Recovery para a informação relacionada com registos médicos de consultas e diagnósticos; a avaliação de soluções de preservação de informação médica com valor científico; e a participação da Altice Labs em projetos liderados pelo Centro Cirúrgico com vista a automatizar processos de diagnóstico recorrendo entre outros a mecanismos de Inteligência Artificial, nomeadamente Aprendizagem Automática (Machine Learning).
"É importante percebermos que todos os dias no mundo em 60 países 250 milhões de pessoas usam tecnologia made in Portugal"
Coube a Alexandre Fonseca, CEO da Altice Portugal, o encerramento da cerimónia em que recordou que a sede da Altice Labs é "um quartel general aberto ao mundo".
"É importante percebermos que todos os dias no mundo em 60 países 250 milhões de pessoas usam tecnologia made in Portugal", afirmou ao apresentar o percurso de quatro anos que tem sido percorrido pela empresa que responde pela inovação no Grupo Altice, com destaque para o investimento de meio milhão de euros realizado todos os anos no meio universitário "e que é fundamental no projeto Altice Labs".
"Muitas vezes perguntam-nos qual é o segredo do nosso sucesso e a resposta é o nosso ecossistema, todas as parcerias das autarquias, universidades, fornecedores, startups com quem trabalhamos".
Um roteiro que a operadora pretende manter mas no qual considera importante que "as políticas políticas acompanhem o investimento privado. "Investimos mais de 2 mil milhões de euros na nossa economia e é um investimento que não se focou nas zonas de grande densidade populacional. É preciso apostar na formação e na qualificação, porque o analfabetismo digital é um perigo latente".
A inovação, rematou, é um pilar da estratégia do Grupo Altice e assim deverá continuar. "Continuamos a desbravar novos caminhos, só que agora são digitais", referiu.
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