“É um drama. As empresas não empregam doentes, principalmente com sinais físicos das doenças, como nas mãos ou o coxear”, afirmou à Lusa Arsisete Saraiva, presidente da Associação Nacional dos Doentes com Artrite Reumatoide (ANDAR).

A esta organização chegam com frequência relatos de trabalhadores que “têm de esconder a doença, pois caso contrário são despedidos”. E a pressão não é só da parte de quem manda, já que em alguns casos são os próprios colegas que acusam os trabalhadores doentes de fingir porque não querem trabalhar.

Mas estes são aqueles que têm “a sorte” de conseguir um emprego. “Se a doença já é visível — como a deformação das mãos e dos pés — os empregadores arranjam desculpas e alegam que o lugar já está ocupado”, disse a presidente da ANDAR, que estima existirem 40 mil portadores desta doença em Portugal.

António Santos, 47 anos e doente do foro respiratório, contraiu uma doença no pulmão ao manusear produtos químicos numa empresa da Marinha. “Em três anos dei cabo da minha saúde”, afirmou, lamentando que, para os seus chefes e até colegas, apenas tenha sido visto como doente quando passou a andar com a bomba de oxigénio.

“Mesmo com relatórios médicos, as pessoas com quem trabalhava não me davam qualquer importância”. A doença prejudicou-o na avaliação: “Tive zero. Diziam que não queria trabalhar, mas eu não podia sequer apanhar pó ou fazer esforços. Fui castigado pela doença”.

Os doentes hemofílicos (portadores de uma deficiência no processo de coagulação do sangue) também são confrontados com faltas de resposta às suas limitações. Um doente, que não quis ser identificado, disse à Lusa que “os locais de trabalho, regra geral, não estão também preparados para esse tipo de deficiência a níveis como o estacionamento perto dos locais de trabalho ou da deslocação entre pisos”.

Por outro lado, “as faltas inerentes à doença normalmente são contabilizadas como absentismo, o que vai penalizar normalmente a evolução e progressão da carreira, partilhas, avaliação de desempenho, atribuição de créditos, entre outros”.

Segundo este doente, um dos mil que se estima existirem em Portugal, “no final da carreira e com as limitações a serem maiores a cada dia que passa, a reforma antecipada é travada a todo o custo, levando mesmo a que seja mais fácil o recurso à baixa médica de longa duração”.

Para José Manuel Boavida, presidente da Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal (APDP), são muitas as pessoas que “escondem a doença”, sendo mais sentidos o estigma e a discriminação em relação à diabetes tipo 2 por esta estar mais ligada “aos maus comportamentos alimentares, a algum moralismo de responsabilidade individual”.

Ana Cristina, 45 anos, operadora de caixa num hipermercado e portadora de diabetes tipo 1 há 33, considera que ainda há estigma. “A vida profissional depende da chefia. Às vezes é difícil, depende da entidade patronal”.

A doença atinge cerca de um milhão de portugueses, mas ainda há quem não entenda a necessidade de cuidados básicos, como por exemplo fazer intervalos regulares e mais frequentes para comer.

“As pessoas também têm pouca informação sobre a doença. Fica muitas vezes aquela sensação de pronto, lá vai ter de ir comer outra vez”.

“Já tive de fazer as minhas pausas para comer no gabinete da chefe”, contou à Lusa, lamentando que, na sua avaliação, tenha sido colocada uma alínea a indicar que não escolhia os melhores momentos para fazer as pausas.

Para o bastonário da Ordem dos Psicólogos, a realidade é ainda pior para quem tem doenças do foro psíquico ou mental.

Francisco Miranda Rodrigues refere que “só 10% das organizações apostam na prevenção, o que mostra que não há uma cultura de compatibilização”.

As organizações “veem [as doenças mentais] como fragilidades que põem em causa a vida das empresas”.

Pelo lado das empresas, o presidente do conselho estratégico de saúde da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) sublinhou a preocupação que estas têm ao nível da ergonomia, postura das pessoas, iluminação, entre outras.

“É uma matéria cada vez mais preocupante”, disse Óscar Gaspar, afirmando: “As empresas têm cada vez mais a noção que a saúde dos colaboradores interessa”.

O representante da CIP acredita que são mais frequentes os empresários que acatam as recomendações da medicina de trabalho. “Nenhuma empresa gosta de investir num trabalhador e ver esse trabalhador a ter de sair”.

A Confederação “condena a perseguição” aos trabalhadores devido a doença crónica e recorda que “ninguém em condição física ou outra de alguma fragilidade pode ser tão produtivo como uma pessoa que se sinta bem”.

De acordo com o Código de Trabalho, “o trabalhador com deficiência ou doença crónica é titular dos mesmos direitos e está adstrito aos mesmos deveres dos demais trabalhadores no acesso ao emprego, à formação, promoção ou carreira profissionais e às condições de trabalho, sem prejuízo das especialidades inerentes à sua situação”.

Por: Sandra Moutinho e Rute Peixinho, da agência Lusa