
Um movimento internacional de boicote a produtos dos Estados Unidos começou a ganhar força no mês de março, alastrando-se do Canadá à Europa, motivado pela crescente inquietação com as políticas da atual administração norte-americana, liderada por Donald Trump.
Um dos exemplos mais simbólicos do protesto partiu do violinista alemão Christian Tetzlaff, que anunciou o cancelamento da digressão de verão do seu quarteto aos EUA. "Sinto uma raiva profunda. Não consigo continuar com este sentimento dentro de mim. Não posso simplesmente ir tocar concertos bonitos", afirmou.
Mas não é um caso isolado: multiplicam-se os apelos ao boicote de marcas e bens "made in USA".
O caso mais flagrante parece ser a quebra nas vendas da Tesla na Europa. A empresa de Elon Musk viu as suas ações desvalorizarem 15% num único dia, na sequência de protestos e da crescente recusa de consumidores em adquirir os seus veículos.
Contudo, os exemplos não ficam por aí. No Canadá, a resposta popular inclui vaias ao hino norte-americano em jogos de hóquei e o surgimento de aplicações que permitem aos utilizadores evitar produtos dos EUA ao fazerem a leitura de códigos QR em embalagens.
Na Suécia, um grupo no Facebook conta também com milhares de membros a partilhar alternativas a bens de origem norte-americana e, num gesto mais radical, uma empresa privada da Noruega, a Haltbakk, a maior fornecedora norueguesa de combustível para navios, anunciou que vai deixar de abastecer embarcações da marinha dos EUA.
Em Paris, a semana passada, um protesto contra a política do presidente dos Estados Unidos da América incentivou ao boicote de produtos americanos e juntou centenas de pessoas.
E por cá?
Em Portugal, o Movimento pela Democracia Participativa (MDP) lançou uma petição chamada "Boicote aos Produtos Americanos: Uma Resposta ao Impacto das Políticas de Trump".
Para o movimento, "produtos americanos, que antes eram consumidos com regularidade e até com uma certa adoração, passaram a ser vistos sob outra óptica".
Nesse sentido, "o boicote não é mais apenas uma opção de grupos políticos ou ativistas, mas uma resposta de cidadãos comuns, que, como protesto, estão a alterar hábitos de consumo e recusar apoiar marcas ou produtos relacionados com os EUA de Trump".
Na prática, o MDP diz que o boicote se faz de gestos simples, como é o caso de "mudanças simples de pasta de dentes, evitar as compras em grandes cadeias de distribuição americanas ou até mesmo desmarcar férias nos Estados Unidos. Tudo como forma de dizer 'não' ao que consideram uma postura económica arrogante e agressiva por parte do governo americano".
Quais as marcas "made in USA" comercializadas em Portugal?
Num artigo publicado no seu site, o Movimento pela Democracia Participativa dá exemplos de marcas americanas comercializadas em Portugal, entre elas:
Vestuário, acessórios e calçado
- Tommy Hilfiger
- Vans
- American Eagle
- Levi’s
- Michael Kors
- Coach
Cosmética e higiene
- Drunk Elephant
- S. C. Johnson & Son
- Rhode
- Colgate
Alimentos, bebidas e fast food
- Reese’s
- McDonald’s
- KFC
- Burger King
- Starbucks
- Coca-Cola
- Jack Daniel’s
Eletrodomésticos
- Whirlpool
Veículos
- Harley-Davidson
- Tesla
Em alternativa aos produtos americanos, o site "escolho.eu" mostra marcas europeias — também portuguesas — que podem ser boas hipóteses.
"Está na hora de escolher a Europa. Está nas nossas mãos fortalecer a economia europeia através das nossas escolhas de consumo", lê-se na descrição.
Boicote de produtos e tarifas podem influenciar economia americana?
O banco de investimento Goldman Sachs subiu a semana passada a probabilidade de uma recessão nos Estados Unidos de 35% para 45%, devido aos receios sobre o impacto das tarifas globais apresentadas por Trump.
Numa nota intitulada “Contagem decrescente para a recessão” foi revista a previsão, após “um forte aperto das condições financeiras, um boicote por parte dos consumidores estrangeiros e um aumento contínuo da incerteza política”.
A entidade já tinha aumentado a sua estimativa de 20% para 35% no início da semana passada, mas as taxas anunciadas por Donald Trump foram superiores ao esperado, o que está a desencadear uma onda de vendas nos mercados globais e a queda das bolsas internacionais que levaram a uma revisão da previsão.
O plano tarifário de Trump, que manteve os mercados em espera nas últimas semanas, envolve uma tarifa global de 10% e taxas mais elevadas noutros países e blocos.
Além disso, o Goldman Sachs reviu em baixa as previsões de crescimento económico dos EUA em 2025 de 1,5% para 1,3%.
Desde que Trump anunciou o seu plano tarifário, os principais bancos de investimento aumentaram as previsões para o risco de recessão nos EUA: o JPMorgan coloca essa probabilidade em 60%, o S&P Global em 30-35% e o HSBC em 40%.
Da mesma forma, o Goldman Sachs espera que a Reserva Federal (Fed) dos EUA reduza as taxas de juro em 25 pontos base cada, em três reuniões consecutivas com início em junho.
O presidente da Fed, Jerome Powell, já assumiu que as novas tarifas deverão acelerar a inflação e abrandar o crescimento económico, mas salientou que o foco do banco central será manter os aumentos de preços temporários.
"A nossa obrigação é [...] garantir que um aumento único no nível de preços não se torne um problema contínuo de inflação", disse Powell.
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