O texto foi escrito para integrar a folha de sala - que não chegou a existir - do espetáculo TURISMO, da Companhia A Turma, com texto original e encenação de Tiago Correia que subiu ao palco nos dias 31 de janeiro e 01 de fevereiro no Teatro do Campo Alegre, no Porto.
O texto também integrava o livro homónimo, editado pelas Edições Húmus e cuja venda no Teatro do Campo Alegre foi igualmente proibida, de acordo com Regina Guimarães.
"Eu penso que o próprio Tiago Correia, encenador desta peça, não sabe exatamente de onde é que vem a censura, o que é certo é que houve, de facto, censura", disse Regina Guimarães, em declarações à Lusa.
De acordo com escritora, o texto que alega ter sido censurado aborda a questão da "turistificação" e da noção de cidade líquida, retificando o conceito que "foi apregoado pela cidade durante anos", mas "não é um texto contra a Câmara Municipal do Porto", sublinhou.
"Isto não cabe na cabeça de ninguém. Isto é um precedente muito grave, porque é evidente que a câmara é um elemento importantíssimo na vida cultural portuense. Isto é um pau de dois bicos, porque obviamente que eles fizeram a diferença toda ao tomarem em mãos um estado da cidade que era de grande desertificação cultural, mas ao mesmo tempo eles não podem arrogar-se de ser donos da criação, do pensamento e das opiniões", defendeu Regina Guimarães.
“É surpreendente que seja uma trupe de artistas tão novos - com caminho percorrido e obra feita em sua dura flor da idade - a abraçarem este projeto que lança o seu olhar sobre o aqui e agora e, sobretudo, sobre o equívoco da cidade líquida [1 (nota de rodapé)] de um modo tão indisfarçado", lê-se no texto alegadamente censurado.
Numa nota de rodapé, a escritora refere depois que o antigo vereador da cultura da Câmara do Porto Paulo Cunha e Silva inundou os portuenses "de discursos delirantes acerca da ‘cidade líquida inspirada em Zygmunt Bauman’ no intuito de legitimar teoricamente as escolhas políticas na sua área de atuação, positivando, por ignorância ou descarada mentira, uma noção que, para o sociólogo inventor do conceito, consubstancia o horror contemporâneo da perda de laços".
E acrescenta que, "significativamente, o erro - propositado ou involuntário - de Paulo Cunha e Silva - nunca foi publicamente denunciado pelos sociólogos da cidade e da sua academia".
O alegado ato de censura do texto de Regina Guimarães levou diversas personalidades a mostrarem-se solidárias com a escritora, entre elas as atrizes Sara Barros Leitão e Diana Sá. Esta última escreveu na rede social Facebook: "Somos livres... Até certo (Porto)Ponto".
Já o diretor artístico da companhia Teatro da Didascália, Bruno Oliveira Martins, questiona se "a censura ter-se-á instalado no Teatro Municipal do Porto?"
Também na rede social Facebook, o deputado do Bloco de Esquerda José Soeiro partilha o texto cuja "divulgação foi proibida", deixando toda a sua solidariedade a Regina Guimarães.
"Fui ver a peça no sábado e estranhei não haver folha de sala. Afinal, não havia folha de sala porque ela foi censurada pelo Teatro Municipal da minha cidade", lê-se na publicação.
Contacto pela Lusa, o diretor do Teatro Municipal do Porto, Tiago Guedes, disse não querer prestar declarações, remetendo eventuais esclarecimentos, "se for caso disso", para depois de averiguar o sucedido.
A Lusa tentou ainda obter esclarecimentos por parte da Câmara Municipal do Porto, mas até ao momento sem sucesso.
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