“Luís Montenegro sempre defendeu que o direito já consagrado e fundamental à autodeterminação da morte deveria ter sido consagrado por referendo. Ora, quem defende isso também defenderá o seu contrário, ou seja, que se estivesse agora o processo ainda em curso, a continuar, tivesse que ser por referendo”, afirmou a constitucionalista à Lusa.

No entanto, acrescentou, “este direito já está consagrado, já existe em lei da República e é inconstitucional referendar uma lei já aprovada”.

“Não quero acreditar que Luis Montenegro volte atrás”, insistiu.

A constitucionalista falava a propósito do pedido da provedora de justiça, Maria Lúcia Amaral, ao Tribunal Constitucional (TC), para que declare inconstitucional a lei da morte medicamente assistida.

A este respeito, Isabel Moreira disse não estar surpreendida com o pedido de provedora.

“Não me surpreende pelo seguinte: em primeiro lugar, a atuação da provedora vem na sequência de um pedido que lhe foi feito pelo CDS-PP e a provedora tem um histórico de atuar no domínio destes direitos e muito pouco no domínio dos direitos sociais”, disse.

Isabel Moreira explicou ainda que o requerimento de Maria Lúcia Amaral se foca na violação do direito à vida, que “já mereceu uma posição contrária” do TC, e numa “renovada confusão entre cuidados paliativos e eutanásia”, que “já foi esclarecido ao longo de muito tempo de debate”.

“É uma atuação que (…) não me surpreende. É, ainda assim, um poder da provedora de justiça. Parece-me que se debruça sobre questões já analisadas e que vai em linha, repito, com aquilo que é uma atuação muito pouco centrada em direitos sociais e decorre de um pedido do CDS-PP”, afirmou.

No requerimento publicado na terça-feira no site da Provedoria de Justiça, Maria Lúcia Amaral refere que a regulação contida na lei “é contrária ao que consagra a Constituição no n.º 1 do seu artigo 24.º [A vida humana é inviolável] e no n.º 1 do seu artigo 26.º [A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra quaisquer formas de discriminação].

A lei da eutanásia foi promulgada em 16 de maio de 2023 pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, mas aguarda regulamentação, depois de o Governo do PS ter decidido incluir a questão no dossiê de transição para o próximo executivo.

Trata-se da primeira lei portuguesa sobre esta matéria, que estabelece que "a morte medicamente assistida só pode ocorrer por eutanásia quando o suicídio medicamente assistido for impossível por incapacidade física do doente".