Na primeira sessão do julgamento das impugnações interpostas por Amílcar Morais Pires e Ricardo Salgado, ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES), às coimas aplicadas pelo Banco de Portugal (BdP) em maio de 2017, de 150.000 e 350.000 euros, respetivamente, o antigo administrador afirmou que nunca teve qualquer responsabilidade na área da ‘compliance’ [regulação], a qual “tinha todas as competências” em termos de prevenção de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo.
O início do julgamento acontece depois de o Tribunal da Relação de Lisboa ter revogado, em abril último, a sentença proferida pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS) que, em dezembro de 2017, declarou nula a acusação administrativa por entender que o BdP não tinha garantido o “efetivo direito de defesa” dos arguidos, devolvendo-a ao supervisor para, querendo, voltar a proferir decisão “isenta dos vícios que afetam a sua validade".
Numa sessão em que esteve igualmente presente Ricardo Salgado, Morais Pires relatou detalhadamente o seu percurso no BES, onde ingressou em 1986 (no então Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa), assumindo a direção do departamento de mercados financeiros e estudos em 2004, ano em que passou a integrar a administração e o Conselho Executivo do banco, e, em 2012, do departamento de desenvolvimento internacional, que dirigiu até à sua saída, em 2014.
Morais Pires explicou que foi nesta fase final que a área internacional ficou sob a sua alçada, garantindo, contudo, que nunca teve qualquer responsabilidade na gestão de sucursais e filiais do banco.
Sobre a situação do BESA (Angola), um dos bancos a que o BdP aponta deficiências nas medidas de controlo, Morais Pires reafirmou o que havia alegado já no seu pedido de impugnação, de que encontrou resistências às mudanças que decidiu introduzir na governança do banco, sobretudo pelas dificuldades levantadas por Álvaro Sobrinho, substituído na presidência por Rui Guerra, em 2012, num processo que passou pela contratação de um novo responsável pela ‘compliance’.
Morais Pires reafirmou igualmente não perceber a acusação relativa ao ES Bank Miami, por ser supervisionado pelas autoridades norte-americanas, que nunca reportaram qualquer anomalia nesta matéria, e, no caso de Macau, disse que foi certificado o sistema de controlo interno do banco.
Em Cabo Verde, o BES possuía “pequeníssimas unidades”, sendo o controlo e a formação aos colaboradores em matéria de prevenção assegurado pela direção de ‘compliance’ de Lisboa, disse.
Morais Pires declarou que, dado o recurso frequente a investidores estrangeiros, havia “grande preocupação” com a reputação do banco, pelo que foram sendo implementados mecanismos de controlo interno.
O ex-administrador do BES afirmou que os relatórios de controlo interno apresentados aos administradores nunca reportaram qualquer falha nos mecanismos a funcionar nas sucursais e filiais do banco.
Questionado pelo juiz sobre a sua atividade atual, Morais Pires afirmou que, pelo “estigma” provocado pelos processos que o envolvem, não tem nenhuma ocupação.
O julgamento prossegue no próximo dia 23 com a audição de Paula Gramaça, que foi responsável pelo departamento de 'compliance'.
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